Lucas Berlanza (1992), jovem Jornalista formado pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) é editor dos sites: “Sentinela
Lacerdista” e “Boletim da
Liberdade”, e autor da obra intitulada: Guia Bibliográfico da Nova Direita –
39 livros para compreender o fenômeno brasileiro.[1]
Berlanza é colunista, há quase cinco anos, do Instituto Liberal do Rio de
Janeiro, ocupando, hoje, a direção dessa instituição. Inspirando-se no também
jornalista Carlos Frederico Werneck de Lacerda (1914-1977), uma das mais
proeminentes lideranças políticas da República Nova (1946-1964), Berlanza
publica, com regularidade, comentários políticos sob um viés
liberal-conservador. Já foi palestrante em diversos eventos, entre eles os
seminários: “Ideias da Liberdade” e “Semana da Liberdade”.
Que
o chamado "pensamento da direita" está em ascensão, não há dúvida.
Esclareçamos: por "pensamento da direita" entenda-se,
primordialmente, aquele que se afina com as ideias políticas
liberal-conservadoras, que se centram nos seguintes pontos: 1 - defesa da
liberdade individual nos terrenos cultural, político e econômico; 2 - respeito
às tradições vigentes na sociedade brasileira, levando em consideração que só
podem vingar aquelas mudanças sociais que as preservarem; 3 – defesa das
instituições do Governo Representativo e da tripartição de poderes; 4 – defesa
do conceito de soberania, destacando que ela é limitada (ou seja, referida ao
funcionamento das instituições políticas), não se sobrepondo, portanto, à
dignidade e ao foro íntimo das pessoas.
A
propaganda marxista encarregou-se, no Brasil, de confundir as coisas. Tudo
aquilo que não se afinasse com o cientificismo gramsciano foi jogado, pelos
militantes-propagandistas da esquerda vociferante, no saco sem fundo da
"direita". Ora, o "pensamento da direita" tem muitas
nuances, sendo a principal delas, a correspondente ao Liberalismo Conservador.
É ao estudo dessa tendência que o jovem escritor carioca Lucas Berlanza dedica
a sua obra, recentemente lançada, no Rio de Janeiro, com o sugestivo título de: Guia
bibliográfico da nova direita - 39 livros para compreender o fenômeno
brasileiro.
Essa
jovem direita liberal-conservadora eclodiu, ao longo dos últimos 15 anos. O seu
ponto de partida foi o desencanto das novas gerações com a vulgata marxista,
que, como pernicioso tsunami, tudo invadiu no universo cultural brasileiro, de
mãos dadas com a conivência oficial e a pregação dos velhos chavões
marxistas-leninistas, pela geração de mestres que se dedicou a essa inglória
tarefa. Da radicalização simplificadora não escapou nem a Igreja Católica, a
partir do momento em que os quadros dirigentes da Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil foram tomados de assalto, por militantes treinados na doutrinação
marxista, que tudo centraram ao redor do messianismo político pregado pela
Teologia da Libertação, como denunciou, com coragem, o padre português José
Narino de Campos (1921), na sua obra intitulada: Brasil, uma Igreja
diferente.[2]
As
desgraças da radicalização e da intoxicação ideológicas não ocorrem ao acaso:
elas são preparadas por trabalho continuado de simplificação conceitual e
propaganda. De há muito, o universo cultural brasileiro foi tomado de assalto
pelos radicais marxistas. Já desde início dos anos 80 do século passado, o
embaixador José Osvaldo de Meira Penna (1917-2017) chamava a atenção para a
silenciosa ocupação das Secretarias estaduais e municipais de Educação pela
turma do PT, que se encarregou de radicalizar a formação de professores e
alunos, no ensino básico e fundamental, bem como nas Faculdades de Educação, à
sombra da doutrina socialista de Paulo Freire (1921-1997). Tudo foi
potencializado pelo PT, no poder, abrindo espaço para os vícios da corrupção e
do compadrio. A decisão dos militantes para manter vivo o pensamento marxista,
entre nós, foi projeto acalentado pelas lideranças partidárias.
O
ponto alto dessa estratégia de dar vida ao cadáver insepulto do comunismo foi a
criação (em 1990), por Luís Inácio Lula da Silva (1945) e Fidel Castro
(1926-2016), do Foro de São Paulo. Somaram-se a essa iniciativa os movimentos
guerrilheiros atuantes na América Latina, a começar pelas Forças Armadas Revolucionárias
da Colômbia (FARC), bem como, anos depois, o coronel Hugo Chávez (1954-2013),
militante comunista que se elegeu presidente da Venezuela, com a sua
descabelada proposta de "Revolução Bolivariana".
Fidel
Castro achava que a liderança militar do processo de revolução comunista, na
América Latina, deveria ser de Hugo Chávez. De lá para cá só aumentou essa maré
vermelha. Acontece que os jovens da nova geração se cansaram da dieta
ideológica de fome. Começaram a questionar a simplória estória que lhes era
contada. Nos últimos 15 anos, essa reação foi aumentando. Hoje, conta com
estruturados analistas que colocam as coisas no seu lugar, mostrando as
grosseiras simplificações armadas pelo marxismo.
São
várias as jovens personalidades que se destacam, a meu ver, nessa nova geração.
Correndo o risco de deixar por fora nomes de relevo, lembro alguns deles: Alex
Catharino, Rodrigo Constantino, Alexandro Souza, Marco Antônio Barroso,
Humberto Schubert Coelho, Bernardo Goitacazes de Araújo, Luciano Caldas
Camerino, Jefferson Silveira Teodoro, Bruno Garschagen, Filipe Barros, Hélio
Beltrão, Lucas Berlanza, César Kyn d´Ávila, Caroline de Toni, José Lorêdo Filho
(com o magnífico empreendimento editorial da "Resistência Cultural"),
Marcus Boeira, Caio Vioto, Débora Gois Torres, etc.
Efetivamente,
são inúmeros os jovens que, em Faculdades e nos seus lugares de trabalho, bem
como, a partir de grupos de estudo e thing
tanks, elaboram uma visão crítica da propaganda marxista-leninista,
defendendo, corajosamente, o sagrado valor da liberdade individual e da
tradição da Civilização Ocidental, ancorada no Cristianismo.
Os
cursos de História, quem diria, outrora terreno exclusivo dos marxistas,
começaram a pensar com categorias diferentes, próximas do liberalismo e do
conservadorismo, e abertas à pesquisa das origens da nossa realidade social.
Essas análises críticas deixam de cabelo em pé os velhos propagandistas do
marxismo-leninismo e do gramscismo cultural, que o PT apresentou como a última
moda do bom-mocismo intelectual. Os bravos jovens liberais-conservadores
optaram, também, pela luta político-partidária. Os exemplos desses jovens
liberais-conservadores engajados na luta política multiplicam-se pelo país
afora.
Analiso,
a seguir, de maneira sumária, o conteúdo da nova obra de Lucas Berlanza. Em 6
capítulos, uma conclusão e um apêndice, o autor desenvolve o seu pensamento
acerca da "nova direita" brasileira. Menciono os capítulos que
integram a obra: I - Origens e fundamentos das ideias. II - Como entender o
Brasil. III - Grandes ícones da política internacional. IV - Um olhar sobre
adversários e inimigos. V - Grandes temas e controvérsias. VI - Um olhar sobre
os dias atuais. Conclusão: Essa "direita" poderosa e onipresente, um
mal absoluto a atrasar o Brasil, não passa de uma lenda. Apêndice: Por uma nova
liberdade: o manifesto libertário.
Berlanza
deixa clara a sua identificação com a renovação propiciada pelo
"pensamento da direita", com as seguintes palavras, no prólogo à obra
que comento: "Uma das características mais particulares desse 'novo' tipo
de pensamento político, e do movimento que o orbita, é o fato de se
fundamentarem em uma bibliografia filosófico-política e econômica toda
especial, que não ocupa posição de protagonismo nas indicações didáticas
tradicionais. O livre pensar dessa geração a levou a buscar outros ares e
pesquisar novas fontes e indicações de leitura, a despeito do 'index' de
educadores marxistas de ocasião. Por isso mesmo, entendemos que o vulgo não
conheça suas ideias, não entenda do que se trata, e haja o risco de confusões
serem semeadas por quem não tem interesse na divergência".[3]
Lucas
Berlanza pretende apresentar, na sua obra, uma "guia de leitura" do
ângulo liberal-conservador. No prólogo, frisa a respeito: "Este livro é
nada mais que um esforço para apresentar, através de algumas dicas de leitura
cuidadosamente selecionadas, marcos de ideias que tornam possível ao leitor
apreender, em um quadro geral, a genealogia e a natureza de alguns princípios e
posturas que circulam nesse grupo heterogêneo de liberais e conservadores - e
que os definem. Das fontes bibliográficas mais antigas e clássicas até as mais
modernas, reuni 39 resenhas de livros que ajudam a esclarecer do que se trata
esse fenômeno social que vem inquietando e alimentando esperanças no Brasil.
(...). É um livro sobre livros. Não que, em certo sentido, todos os livros não
o sejam: mas as resenhas não são apenas artigos elogiando ou criticando
determinado título. Todas elas contêm ilações e desdobramentos que delineiam as
ideias que justificam sua inclusão e que, compreendidas em seu conjunto, fazem
da relação um modesto guia bibliográfico, que não esgota, mas traça um retrato
do núcleo de princípios dos grupos de que estamos falando".[4]
Berlanza
identifica, como fontes inspiradoras do conservadorismo liberal da nova
geração, as ideias de Burke (1729-1797), Bastiat (1801-1850), Hayek (1899-1992),
Von Mises (1881-1973), Margaret Thatcher (1925-2013), Winston Churchill
(1874-1965), Roger Scruton (1944-2020), Ronald Reagan (1911-2004), etc. No
terreno da cultura brasileira, as fontes do liberal-conservadorismo são
múltiplas: Roberto Campos (1917-2001), Meira Penna (1917-2017), Eugênio Gudin
(1886-1986), Gilberto Ferreira Paim (1919-2013), Antônio Paim (1927), Carlos
Lacerda (1914-1977), José Guilherme Merquior (1941-1991), Vicente de Paulo
Barretto (1939), Alberto Oliva (1950), Mário Guerreiro (1944), Selvino Malfatti
(1943), Ubiratan Borges de Macedo (1937-2007), Ubiratan Jorge Iorio (1946),
João Pereira Coutinho (1976), com a sua original contribuição do ângulo
luso-brasileiro, Rodrigo Constantino (1976), Maria Lúcia Victor Barbosa, etc. Adicionaria o nome de Roque
Spencer Maciel de Barros (1927-1999), pensador original que abriu as propostas
liberal-conservadoras ao terreno da educação, alertando para o risco
totalitário concretizado na vulgata marxista.[5]
No
terreno do conservadorismo com embasamento hermenêutico, devem ser mencionados os
nomes de Paulo Mercadante[6]
(1923-2013) e Olavo de Carvalho[7]
(1947). Em relação a este pensador, convém destacar que realizou um detalhado
levantamento dos caminhos percorridos pelo marxismo cultural para ocupar
espaços no Brasil, ao ensejo da organização do Foro de São Paulo. Se bem Olavo
de Carvalho desenvolveu atraente projeto de formação humanística para os jovens
de inspiração liberal-conservadora, no entanto, no terreno estratégico, parece-me
que terminou enveredando pelo caminho do confronto, inspirado no pensamento dos
neoconservadores americanos.
Destaca-se,
na obra que comento de Lucas Berlanza, a sua inspiração nos fundadores do
Instituto Liberal e discípulos da Escola Austríaca, Donald Stewart (1931-1999) e
Og Leme (1922-2004). Para Berlanza, contudo, é o pensador irlandês Edmund Burke
(1729-1797), o whig que atraiu
os tories para refundar o partido conservador britânico, no início
do século XIX, o principal inspirador do liberal-conservadorismo brasileiro.
A
partir das propostas burkianas surgiu, no sentir de Berlanza, uma doutrina que
propende pela mudança sem perder o sentido das conquistas do passado, permanecendo
firme no compromisso com a defesa da liberdade individual, nos terrenos social,
cultural e econômico. É o velho liberalismo conservador, originado em John Locke
(1632-1704) e alargado, de forma a abarcar o ideal democrático, pelos Pais
Fundadores dos Estados Unidos e pelos doutrinários, na França, ao longo do
século XIX. Só que, para Berlanza e os jovens que redescobriram Burke, as
fontes prioritárias passaram a ser os clássicos de origem anglo-saxã e
irlandesa.
Considero
que os doutrinários franceses tinham elaborado uma meditação nova acerca do
liberalismo lockeano, a partir das fontes escocesas, naquela aventura
intelectual que Ortega y Gasset (1883-1955) identificou como "o que de
mais interessante ocorreu na Europa Ocidental ao longo do século XIX",[8]
que desaguou na original proposta liberal-conservadora de Madame de Staël (1766-1817)
e de Benjamin Constant de Rebecque (1867-1830), precursores daquela corrente.
Ora,
penso eu, o liberal-conservadorismo brasileiro, como, de resto, na Espanha, em
Portugal, na Colômbia e alhures, na América Latina, formatou-se,
primordialmente, à luz dos doutrinários. Eles falavam uma linguagem mais
acessível ao espírito ibérico, do que aquela falada pelos anglo-saxões. A
experiência continental europeia, na defesa da liberdade, foi mais próxima de
nós do que a defesa das teses dos liberais britânicos. Isso por conta da nossa
tradição jurídica, herdeira do antigo "direito germânico", ao passo
que os anglo-saxões ancoravam na tradição consuetudinária restrita a eles.
Capítulo
importante da magna obra dos doutrinários foi a defesa incondicional da
liberdade, de um lado, junto com a crítica sistemática ao democratismo
rousseauniano, que consistiu na nova forma de servidão e, sob cuja inspiração,
foram cometidos todos os excessos da Revolução Francesa e do Terror Jacobino.
Os doutrinários destacaram, no entanto, que algo podia ser salvo da maré
revolucionária: a defesa da liberdade individual, como elemento fundamental da
libertação humana. Essa foi, aliás, a réstia de luz que Tocqueville (1805-1859)
encontrou no tormentoso momento revolucionário de 1789, e que o próprio Immanuel
Kant (1724-1804) identificou, inicialmente, no movimento revolucionário
francês. François Guizot (1787-1874) considerava que a missão dos doutrinários
consistiria em "completar a Revolução Francesa" mediante a defesa da
liberdade individual, através das instituições do governo representativo.
Tocqueville alargava a defesa da liberdade individual, com bicameralismo e
instituições representativas para todos os franceses, não apenas para a
burguesia encarrapitada no poder, a partir da restauração monárquica e o
reinado de Luís Filipe (1830-1848). Acho que as jovens gerações de pensadores
liberal-conservadores terão muito a ganhar com a leitura dos doutrinários, de
Tocqueville e do representante dessa tendência, na França, no século XX:
Raymond Aron (1905-1983).
A
meu ver, a meditação brasileira do século XIX louvou-se, principalmente, dos
doutrinários, embora conhecesse as fontes britânicas e o pensamento de Burke. O
principal expoente dessa versão do nosso liberal-conservadorismo foi, no início
desse século, Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846),[9]
com a sua teoria da dupla representação (dos interesses permanentes da Nação e
dos interesses mudáveis, dos indivíduos), tese que foi seguida nas propostas de
criar a representação e o Poder Moderador pelos estadistas do Segundo Reinado,
entre os que se destaca o visconde de Uruguai, com o seu Tratado de
Direito Administrativo (1860).[10]
Mas, já no final do século e no início da República, Rui Barbosa (1849-1923) retomou
as teses tocquevillianas de um
liberalismo conservador, que quer fazer da República uma experiência liberal,
acorde com a representação de interesses e a tripartição de poderes. Idêntico
trabalho de arrumação teórica foi feito pelos liberais gaúchos que combateram o
castilhismo no final do século XIX, notadamente Gaspar da Silveira Martins (1835-1901)
e Joaquim Francisco de Assis Brasil (1857-1838). Todas essas são as fontes
inspiradoras dos nossos primeiros liberais-conservadores do século XX, Reale,
Roque Spencer Maciel de Barros, Merquior, Antônio e Gilberto Paim, Ubiratan
Macedo, Meira Penna, Alberto Oliva, Mário Guerreiro, Roberto Fendt, etc. Eu
próprio me filio a essa tendência.
Os
fundadores do Instituto Liberal (notadamente Donald Stewart e Og Leme) e alguns
pensadores próximos deles como Meira Penna, filiam-se, sobretudo, aos liberais
austríacos e partem para discutir os afazeres da política à luz da velha tradição
liberal pensada por eles, mas que entronca em Locke e nos patriarcas da
Independência americana, bem como no liberalismo telúrico dos pensadores da
segunda escolástica ibérica capitaneados por Francisco Suárez (1548-1617),
levando em consideração, também, a mediação de Tocqueville e Aron. A essa turma
junta-se, como muito bem mostra Berlanza nas suas páginas, o grande Roberto
Campos (1917-2001), na sua última fase, sendo que ele se inspira, também, nas
teses do liberalismo econômico já defendidas pelo professor Eugênio Gudin
(1886-1986) e pela Escola Austríaca.
Os
jovens da novel geração à qual Berlanza pertence, partem, com desassombro, para
uma meditação liberal-conservadora que tece fios de ligação com a primeira
geração de liberais conservadores do século XIX, bem como com os seus
discípulos brasileiros, ao longo do século XX. Parece-me sobremaneira
alvissareira a perspectiva que se abre entre os participantes da nova geração,
que não se intimidam diante da discussão de questões acirradas como a que diz
relação às teses sustentadas pelos libertários (tipo Rothbard) e que enfrentam,
de peito aberto, os seus adversários e inimigos, como faz Berlanza no capítulo
IV do seu livro.
No
seio dos adversários, ganham destaque, nas páginas de Berlanza, os teóricos da
social-democracia capitaneados por Fernando Henrique Cardoso (1931), cujo
pecado principal foi o festival de tributação que impulsionou, nos seus dois
governos, e que se prolongou, acintosamente, na lamentável gestão lulo-petista,
ao longo dos últimos 14 anos. Entre os inimigos figuram os já conhecidos ícones
do totalitarismo do século XX, a dupla Lenin (1870-1924) e Stalin (1878-1953);
o pai do nazismo, Hitler (1889-1945), e Benito Mussolini (1883-1945),
formatador do fascismo. Entre os adversários aparecem, no Brasil, estatistas
conhecidos: à direita, Ernesto Geisel (1907-1996) e à esquerda Nelson Werneck
Sodré (1911-1999).
A
nova geração de liberais-conservadores brasileiros (e coisa semelhante está a
acontecer em outros países latino-americanos como Chile, México, Argentina,
Colômbia, Argentina e Peru) lê, diretamente, os clássicos britânicos,
irlandeses e americanos do pensamento liberal-conservador. A redescoberta de
Burke, pela atual geração brasileira, situa-se nesse contexto.
Lucas
Berlanza dá continuidade ao liberalismo-conservador que inspirou ao grande
Carlos Lacerda, um dos ícones do liberalismo brasileiro. Lacerda foi
injustiçado pelo regime militar, que identificou, erradamente, com os liberais,
o inimigo a ser combatido, como lembra o professor Antônio Paim na sua obra, A
querela do estatismo,[11]
quando o real inimigo eram os totalitários comunistas mimetizados, após 1985,
em vários partidos e movimentos da esquerda revolucionária.
O
atual liberal-conservadorismo brasileiro não se colocou contra as mudanças,
muito pelo contrário: aposta naquelas que se enraízam na tradição. Insere-se,
assim, no seio dessa secular tradição liberal que endossa as "revoluções
conservadoras", como a Gloriosa Revolução inglesa de 1688, cujo grande
propagandista foi John Locke e a Revolução Americana de 1776. O Brasil, também,
conheceu essas "revoluções conservadoras" com o "Fico" de
Dom Pedro I (1798-1834), em 1822, ou o Ato Adicional de 1841. A nova geração de
liberais-conservadores, da qual Berlanza é lúcido expoente, aposta, também,
nessas mudanças de longo curso, à maneira da "revolução conservadora"
de Margareth Thatcher e de Ronald Reagan, dando continuidade à gesta de
estadistas da talha de Winston Churchill e, entre nós, dos Construtores do Império,
lembrando o título de conhecida obra de João Camillo de Oliveira Torres
(1915-1973).[12]
A obra
de Lucas Berlanza: Lacerda: a virtude da polêmica,[13]
destaca que vivemos tempos semelhantes aos enfrentados pelo líder liberal. Duas
notas sobressaem em Lacerda: a defesa da liberdade e o alerta constante e
combativo, contra os que pretendem dar sobrevida ao Estado Patrimonial, que
encara a coisa pública como bem de família.
O
traço marcante do Estado brasileiro, nestes tempos de luta contra o lulopetismo
e de triunfo de uma opção liberal-conservadora, representada por Jair
Bolsonaro, continua sendo o Patrimonialismo, que teima em sobreviver, encarando
o público como privado. Nesse combate, Lacerda revive o clima de luta
periclitante pela liberdade, que foi o traço marcante dos Doutrinários e de
Tocqueville, na França. E retoma o melhor da nossa tradição política
liberal-conservadora que, inspirada em figuras como Winston Churchill, não tem
medo de lutar o bom combate, em prol da liberdade e dos valores da nossa
civilização cristã, sem ceder à tentação de um regime de força para superar,
definitivamente, o marxismo cultural lulopetista.
Lacerda
deixou, para o Brasil, frisa Berlanza, “o legado de Ícaro”, encarnando o papel
do “líder que (...) sustentou simultaneamente princípios como a
descentralização do poder e da administração, a valorização da herança cultural
ocidental e cristã (...), o receio do Estado agigantado e opressor, o apreço
pela sensibilidade patriótica e pelas virtudes cívicas”.
BIBLIOGRAFIA
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estatismo. 1ª edição. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978.
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sobre o direito administrativo com referência ao Estado e instituições
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Célio Borja). 3ª edição. Brasília: Ministério da Justiça, 1997.
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Oliveira. Os Construtores do Império: Ideias e
lutas do Partido Conservador brasileiro. São
Paulo: Companhia Editora Nacional 1968.
NOTAS
[1]
BERLANZA, Lucas. Guia bibliográfico da nova
direita – 39 livros para compreender o fenômeno brasileiro. (Prefácio
de Rodrigo Constantino). São Luís:
Resistência cultural, 1917.
[2]
CAMPOS, José Narino de. Brasil: uma Igreja diferente. São Paulo:
T. A. Queiroz, 1981.
[3]
BERLANZA, Lucas. Guia bibliográfico da nova direita – 39 livros para compreender
o fenômeno brasileiro. Ob. cit., p. 19.
[4]
Guia bibliográfico da nova direita – 39 livros para compreender o
fenômeno brasileiro. Ob. cit., p. 19-20.
[5]
Cf. BARROS, Roque Spencer Maciel de. O fenômeno totalitário. Belo
Horizonte: Itatiaia, 1990. Biblioteca de Cultura Humanística, v. 6.
[6]
Cf. MERCADANTE, Paulo. A consciência conservadora no Brasil. Contribuição ao
estudo da formação brasileira. Rio de Janeiro: Saga, 1965. Do mesmo autor, cf. Tobias
Barreto na cultura brasileira: uma reavaliação. Rio de Janeiro: Zahar,
1973. Do mesmo autor, ainda: cf. Militares & Civis: a ética e o
compromisso. Rio de Janeiro: Zahar,
1978. Outra obra que merece ser lembrada deste autor é: A
coerência das incertezas. Símbolos e mitos na fenomenologia histórica luso-brasileira.
(Introdução de Olavo de Carvalho). São Paulo: É Realizações, 2001.
[7]
Cf. CARVALHO, Olavo de. Símbolos e mitos no filme “O silêncio dos
inocentes”. Rio de Janeiro: IAL & Stella Caymmi, 1993. Do mesmo
autor, cf. Os gêneros literários: seus fundamentos metafísicos.
Rio de Janeiro: IAL & Stella Caymmi, 1993. Do mesmo autor, cf. também: O
imbecil coletivo: Atualidades Inculturais brasileiras. Rio de Janeiro:
Faculdade da Cidade / Academia Brasileira de Filosofia, 1996, bem como: O
futuro do pensamento brasileiro: estudos sobre o nosso lugar no mundo.
Rio de Janeiro: Faculdade da Cidade, 1997 e A longa marcha da vaca para o
brejo: o imbecil coletivo II. Rio de Janeiro: Topbooks, 1998.
[9]
Cf. FERREIRA, Silvestre Pinheiro. Manual do cidadão em um
governo representativo. (Introdução de Antônio Paim). Brasília: Senado
Federal, 1998, 3 vol. (Edição fac-similar).
[10] Cf. SOARES, Paulino José, visconde de
Uruguai. Tratado de Direito Administrativo. Ensaio sobre o direito
administrativo com referência ao Estado e instituições peculiares do Brasil.
(Apresentação de Nelson Jobim; introdução de Célio Borja). 3ª edição. Brasília:
Ministério da Justiça, 1997.
[11]
Cf. PAIM, Antônio. A querela do estatismo. 1ª edição. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1978.
[12]
Cf. TORRES, João Camillo de Oliveira. Os construtores do Império. Ideais
e lutas do Partido Conservador. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
1968.
[13] BERLANZA,
Lucas. Lacerda: a virtude da polêmica. São Paulo: LVM, 2019.
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