Amigos, divulgo a seguir o mais recente estudo do Professor Antônio Paim acerca das características que marcam a Filosofia Contemporânea e os seus reflexos no Brasil.
O conjunto da obra deste pensador constitui, certamente, na circunstância da crise de valores que ora enfrentamos no país, norte seguro para as futuras gerações, no que tange ao arcabouço de ideias essenciais da nossa cultura e da herança recebida da Civilização Ocidental.
O professor Antônio Paim (1927), o maior estudioso da Filosofia Brasileira. |
Tudo indica que o ciclo da Filosofia Contemporânea vivenciado desde o
último pós-guerra experimenta uma certa exaustão. Notadamente desde a última
década do século passado, a filosofia ocidental estaria ingressando num novo
período, embora os dados disponíveis ainda não permitam indicar quais seriam
precisamente as suas características. São visíveis seus sinais no que respeita
ao ambiente filosófico brasileiro, com a peculiaridade de que, na ausência de
sistemas dominantes, tradições seculares ocupariam inteiramente a cena, o que dificulta
uma previsão quanto a uma provável
configuração futura.
No plano internacional sobressaem o fim do predomínio de sistemas
filosóficos dotados de universalidade e o avanço da contra-cultura, em especial
na INTERNET.
No plano nacional, o principal efeito da ausência de sistemas de
projeção internacional parece ter sido a inusitada visibilidade, na esfera
correspondente do ensino superior, das tradições contra-reformista e
cientificista. O culto da meditação
filosófica propriamente dita circunscreve-se a uns quantos núcleos dispersos.
Nesse ambiente, a filosofia brasileira
busca sobreviver marcando presença na INTERNET, visivelmente prejudicada pelo
falecimento do prof. Miguel Reale, em 2006, de que resultou a perda, pelo
Instituto Brasileiro de Filosofia, da capacidade de continuar exercendo o papel aglutinador que
desempenhou ao longo de meio século. Tenha-se presente que o IBF buscou educar
as novas gerações de estudiosos da filosofia no aprendizado prático da
convivência das diversas correntes, na contra-mão das tradições consagradas no
país, empenhadas no estabelecimento de samba de uma nota só.
Os indícios comprobatórios do quadro antes esboçado são reunidos nesta
breve nota.
Capa da obra de Antônio Paim intitulada: História das Ideias filosóficas no Brasil, considerada um estudo clássico sobre a cultura brasileira. |
Ausência de sistemas predominantes
e avanço da contra-cultura
Adotamos na História das idéias Filosóficas no Brasil a forma encontrada, pela
historiografia filosófica, para estabelecer uma clara distinção entre Filosofia
Moderna e Filosofia Contemporânea. Nesta, o eixo principal de desenvolvimento é
impulsionado pelo propósito de superação do positivismo. Basicamente, consistia
em restaurar a inquirição metafísica, abolida por essa corrente.
O propósito em causa foi alcançado, plenamente, entre a década de
oitenta do século XIX e a época da primeira guerra mundial. Naquela altura, o
neokantismo tornara-se a principal corrente filosófica na Alemanha, estimulando
o surgimento de duas outras vertentes que iriam ajudá-la a restaurar o
pensamento filosófico em sua plenitude, isto é, não confinado apenas a esse ou
aquele país, mas abrangendo as diversas nações do Ocidente. Temos em vista a
fenomenologia e o existencialismo. O quadro se completa com a vivacidade e
abertura de espírito reveladas pelo empenho dos católicos em restaurar o
tomismo, escoimando-o do precedente empenho dogmático e repetitivo. Tal era o
quadro vigente nas décadas subseqüentes à Segunda Guerra.
Tratava-se contudo, num ou noutro dos países, do predomínio de um ou
outro dos sistemas apontados. A esse tempo, pensadores dos mais representativos
já se tinham dado conta de que a perenidade da filosofia era assegurada não
pelos sistemas mas pelos problemas que inevitavelmente suscitavam. Para dizê-lo
na palavra de um dos mais eminentes historiadores da filosofia da época:
Rodolfo Mondolfo (1877/1976) na obra tornada clássica que intitulou de Problemas e métodos de investigação em
historia da filosofia (1949):
“Como sistema é evidente que o pensamento filosófico, apesar de sua
pretensão, sempre asseverada, de uma contemplação sub specie aeterni, não consegue na realidade afirmar-se senão sub specie temporis, isto é, vinculado
necessariamente com a fase de desenvolvimento espiritual própria de sua época e
de seu autor, destinado a ser superado por outras épocas e outros autores
sucessivos. Ao contrário, no aspecto dos problemas que coloca, ainda que subordinado
sempre ao tempo de sua geração e desenvolvimento progressivo, o pensamento
filosófico mostra-se não obstante como uma realização gradual de um processo
eterno. Os sistemas, com efeito, passam e caem; mas sempre ficam os problemas
colocados, como conquistas da consciência filosófica, conquistas imorredouras
apesar da variedade de soluções que se intentam e das próprias formas em que são colocados,
porque esta variação representa o aprofundamento progressivo da consciência
filosófica.”
Se considerarmos as décadas mais recentes, parece evidente que a
filosofia experimenta um novo ciclo, representado, como os precedentes, pelo
fim do predomínio dos sistemas dominantes. As últimas décadas do século XX e
primeiras do novo milênio marcariam, assim, o término do ciclo configurado pela
Filosofia Contemporânea (existência de filosofias nacionais que ganhavam
projeção mundial, sendo a diferente preferência por uma das correntes
dominantes explicável pela preferência da nação respectiva por determinado
problema)..
A distinção que se poderia estabelecer consiste em que tenhamos
adquirido a compreensão de que as filosofias nacionais distinguem-se umas das
outras justamente pela preferência (histórica) que atribuem a determinados
problemas. No que respeita ao Brasil, na ausência de sistemas catalisadores, o
mais provável seria que viessem a sobressair os eixos tradicionais, com maior
destaque para as vertentes que orbitam em torno das nossas tradições culturais
mais arraigadas, quais sejam, o contra-reformismo e o cientificismo. Como
indicaremos, dispomos de indícios eloqüentes que corroboram essa hipótese. A
inquirição sobre a pessoa humana, onde a filosofia brasileira revelou-se mais
criativa, parece amortecida embora não se deva descartar a possibilidade de
que, a médio prazo, venha a dar o ar de sua graça.
No quadro internacional o que sobressai é o avanço da contra-cultura. No
que respeita à filosofia, dada a influência que exerce entre nós a filosofia
francesa, cumpre termos presente que assumiu-se abertamente como demolidora da
cultura ocidental, embora não se saiba ao certo o que colocaria no lugar, já
que o prenúncio é de um simples vazio.
O papel assumido pela filosofia francesa vem de ser caracterizado por
Guillaume le Blanc (nascido em 1966). Professor de universidade em Bordeaux, ocupa a cátedra Foucault no College de
France. Trata-se de figura popular nos meios universitários brasileiros, a
julgar pelo fato de que acham-se disponibilizados na INTERNET a gravação de 13
de seus cursos no College de France.
Vem de publicar La philosophie
comme contre-culture. Philosophie française contemporaine. Paris, PUF,
2014.
Entende que a filosofia é crítica por definição. De Sócrates a nossos
dias, não cessa de colocar à prova as nossas idéias. É recentemente, de modo singular
na França, que se torna voluntariamente contestação, revolução, transgressão,
dito de outra forma, contra-cultura, em luta ativa contra a
dominação sob todas as formas. Desejoso
de tornar-se o arauto desse combate, esboça uma vibrante defesa e
ilustração desta contra-cultura filosófica sob as diferentes formas de gênero,
da razão econômica, do ethos democrático, da via “não-fascista”, apoiando-se
sobretudo em Judith Butler, Foucault, Derrida e Deleuze. Depois dessa época, a mudança do
papel da filosofia é inevitável, pretendendo para tanto dar a sua contribuição.
No livro que publicou em 2012, com o
título de A civilização do espetáculo
(tradução brasileira Rio de Janeiro, Ed. Objetiva, 2013), Vargas Llosa
considera que os meios de comunicação colocam em lugar da cultura o empenho de
reduzir-se progressivamente a alimentar as paixões baixas do comum dos mortais.
Ao mesmo tempo, repetem exaustivamente que o importante é dispor da informação
instantânea. Justamente esta tem passado a ser a característica de nosso tempo.
Enquanto a obra de cultura que erigimos no passado pretendeu construir algo a
ser preservado no tempo, a INTERNET de nossa época cuida de tudo reduzir a fenômenos
instantâneos.
Correntes de filosofia
e tradições culturais
A documentação reunida sobre a
evolução do pensamento filosófico brasileiro --de que considero ter dado conta
na História das idéias filosóficas no
Brasil e nos sete volumes de Estudos
complementares-- permite concluir que nos seus diversos momentos históricos
por aqui repercutem as principais correntes européias mas somente umas poucas
deitam raízes. Como explicar a circunstância?
Louvei-me da hipótese de que somente deitaram raízes aquelas que se
afeiçoaram a tradições culturais que se formaram a partir do século XVIII.
Para a cultura portuguesa, da qual fazemos parte e à época considerada dela
não nos distinguíamos, o século XVIII, de um lado, marca a derrota do
empreendimento açucareiro que nos colocava na rota que conduziu à Revolução
Industrial. Ficamos com os valores que nos foram impostos pela Contra Reforma:
o ódio ao lucro e à riqueza. Em termos práticos, opção pela pobreza.
De outro lado, especialmente na segunda metade, graças ao Marquês de
Pombal, abrimos as portas ao que a Época Moderna trazia de novo e até então
obstinadamente recusado: a física newtoniana. Mas o fizemos de uma forma
limitadora dos seus efeitos, graças ao que se chamou de cientificismo.
Falando em nome da ciência moderna, o cientificismo nega o essencial de
seu espírito, que consiste no anti-dogmatismo, nutrido pelo que Karl Popper
(1902/1994) iria denominar como sendo típico de sua feição: a dependência da conjectura (formulação da hipótese,
para dizê-lo de outra forma), seguida da aceitação de que os resultados obtidos
acham-se sujeitos à refutação.
Pombal impôs pela força a incorporação da física newtoniana, não
recuando nesse propósito nem mesmo diante do radical enfrentamento da então
poderosa Ordem dos Jesuítas. Mas entendeu que se tratava de um tipo de saber pronto e acabado. Incumbia tão somente incorporá-lo.
Lançadas assim as bases dessas duas componentes fundamentais da cultura,
a valoração fundada no ódio ao lucro e à riqueza e na idéia de ciência pronta e
acabada, a partir do século XIX, quando nos tornamos independentes, emergiriam
formas poderosas de enraizá-las, tornando-as perenes e, porque não dizê-lo,
praticamente insuperáveis.
No primeiro caso, através da pregação incessante da Igreja Católica do
princípio de que seria mais fácil a passagem de um calabre (cabo de certa
espessura usado em embarcações) pelo fundo de uma agulha do que ocorrer a
entrada do rico nos reinos dos céus.
E, no segundo, pelo enraizamento da mencionada noção de ciência, desde
os tempos da Real Academia Militar, entendimento que se perpetuaria com a
ascensão do positivismo, sob a República, do mesmo modo que a sua simbiose com
o marxismo, a famosa versão positivista do marxismo que seria a nossa marca
distintiva. Sem embargo da vertente cientificista da versão brasileira do
marxismo, sua presença assinala-se, sobretudo, pelo reforço à tradição
contra-reformista, ao direcioná-la contra o capitalismo.
No século XIX dá-se ainda a emergência da tradição liberal, que não deve
ser entendida como limitando-se à doutrina política. Esta esbarraria com uma
outra tradição herdada de Portugal, que lhe é limitadora e a tem impedido de
florescer plenamente. Temos em vista o patrimonialismo. Contudo, tem uma outra
parcela que poderia ser agrupada sob a denominação de educação liberal, à qual incumbe, justamente, opor-se e tratar de
derrotar, no plano cultural, as tradições contra-reformista e cientificista.
Vejamos, como o término do predomínio dos sistemas filosóficos,
emergentes no Período Contemporâneo, reflete-se no panorama filosófico
brasileiro destas últimas décadas.
Capa da obra de Paim intitulada: Balanço do marxismo e descendência, um corajoso e aprofundado estudo sobre a influência do marxismo na cultura brasileira. |
O contra-reformismo
recalcitrante
Os cursos de filosofia, formalmente destinados a diplomar professores da
disciplina --no período considerado reintroduzido no ensino médio-- mantêm a
média da fase anterior: em 2011 eram em número de 67, com 6.323 alunos
matriculados e conclusões anuais de 1087. A expansão deu-se nos cursos de
pós-graduação que em 2014 ascendiam a 43.
Em grande número desses cursos, o mais visível consiste no renascimento
da propaganda marxista, como se no início dos anos noventa tivéssemos assistido
não ao fim do comunismo mas ao prenúncio do fim do capitalismo. Como escrevem
Armando Boito (professor da UNICAMP) e Luiz Edmundo Motta (professor da
UFRJ) “na segunda metade da década de noventa, o modelo capitalista neoliberal
começou a apresentar fortes sinais de desgaste”. Na verdade, contudo,
tratava-se da simples evidência de quão arraigada é a tradição contra
reformista em nosso meio (ódio ao lucro e à riqueza que se expressa na
obstinada recusa do capitalismo).
São ainda os mencionados docentes que enumeram os feitos a seguir.
Em 1988, comemorou-se amplamente os 150 anos do Manifesto Comunista e,
logo a seguir, em 2001, os 130 anos da Comuna de Paris de 1871. Em decorrência
dessas iniciativas foram criados Centros de Estudos Marxistas (CEMARX) na
Universidade Estadual de Campinas (1996), seguindo-se na Universidade Federal
Fluminense, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul e em algumas outras. Coube às novas instituições
realizar, em 1999, na UNICAMP, o I Congresso Internacional Marx e Engels. Logo
esse trabalho desdobrou-se em encontros de pesquisadores marxistas na área de
educação. Não tendo cabimento que ficasse de fora, a USP promoveu o Colóquio
Marx e Engels. Dizem os autores que estamos seguindo: “esses e outros encontros
reúnem, se somados, milhares de pesquisadores, anual ou bienalmente.”
Por fim, mais essa indicação: “Nesses últimos 15 anos de revitalização
do marxismo no Brasil, foram publicados aproximadamente trinta livros que
trataram diretamente da obra de Marx, em grande parte resultados de pesquisas
universitárias, e, em destaque, oriundos das faculdades de filosofia.”
O balanço em causa data de 2010, disponibilizado na INTERNET com a
indicação de que a versão em inglês se publicou na revista Socialism and Democracy. A
versão em português intitula-se “Karl Marx no Brasil”.
A vertente considerada domina a Associação Nacional de Pós-Graduação em
Filosofia (ANPOF), que dispõe de amplo
apoio das instituições oficiais, notadamente
a CAPES. Criada em 1983, realiza desde então congressos bi-anuais. Assim,
para o ano de 2014, convoca-se o XVI Encontro Nacional de Filosofia. Em média,
nesses encontros são apresentados dois mil trabalhos. Como o domínio marxista
compreende a recusa da coexistência de múltiplos pontos de vista --que deveria
ser a característica dominante da inquirição de natureza filosófica-- os
núcleos de outra índole são pouco numerosos e não alcançam maior visibilidade,
como teremos oportunidade de referir.
Nessa matéria, o fato novo corresponde à amplitude com que editoras e
instituições afins mobilizam-se para oferecer alternativas teóricas a essa
profusão do que há de típico no marxismo brasileiro, isto é, tratar-se de uma
versão positivista, primando por reduzi-lo à mais grosseira simplificação de
algumas de suas teses centrais, como se não tivessem sido refutadas pelo
próprio processo histórico, a começar do reconhecimento da experiência
soviética como a Grande Mentira, para usar o enunciado devido a Leszek
Kolakowski (1927/2009). Um único exemplo
comprobatório da pertinência da caracterização. Ainda nos tempos de
Gorbachov (segunda metade dos anos oitenta), ficou-se sabendo que metade da
população soviética vivia na faixa da pobreza. A par disto, que o país não dispunha
de nenhum sistema de seguridade. A salvação viria, com o fim do regime
comunista, pela mão da renascida Igreja Ortodoxa, que iria incumbir-se de
organizar a assistência social.
Em 2011, passamos a dispor de
uma edição primorosa da tese que explica a peculiaridade da versão brasileira
do marxismo, a cargo do Senado Federal: A formação do capital e seu desenvolvimento,
de Leônidas de Resende (1889/1950), apresentação de Antonio Paim. Elaborada
para concorrer a cátedra da Faculdade
Nacional de Direito, em 1932, efetiva amplo confronto entre Marx e Comte
(a presente edição tem 666 páginas) para comprovar que, tendo vivido na mesma
época tinham as mesmas idéias e uma única diferença: o primeiro era
revolucionário e o segundo reformista. Tenha-se presente que o positivismo de
Comte tornara-se uma espécie de filosofia oficial da República brasileira. A
comprovação de que passou a nutrir a vertente brasileira do marxismo é
efetivada neste livro.
Complementada por João Cruz Costa (1904/1978) --a quem coube a tarefa de
organizar o Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP)--,
passou a dispor de tribuna privilegiada de difusão, assegurando a primazia
daquela versão de índole positivista, no entendimento do marxismo, que passou a
vigorar no país.
Sediada em São Paulo, a Editora É Realizações assumiu a responsabilidade
de colocar à disposição, dos eventuais interessados, livros de filósofos que evidenciam --como
sempre insistiu o saudoso Miguel Reale-- o caráter plural da filosofia, ao
contrário da unanimidade (mesmo compulsória) buscada pelo nosso marxismo
positivista. A par disto, dá uma grande contribuição à preservação da cultura
clássica.
O catálogo dessa editora reúne hoje grande número de títulos, agrupados
em diversas coleções.
Sem pretender referi-los exaustivamente, destacaríamos a presença de
importantes filósofos e estudiosos contemporâneos, a exemplo de Charles Taylor,
Louis Lavelle, Xavier Zubiri, Thomas Sowell,
Gertrude Himmerfarb, Eric Voeglin, Eric Weil e Michele Frederico
Sciacca, entre outros.
Em matéria de cultura clássica editou a obra de Mortimer Adler (1902/2001)
que, entre outros títulos, figura entre os inspiradores da famosa coleção Great
Books, da Britânica.
É Realizações prestigia autores brasileiros como José Guilherme
Merquior, Gilberto Freyre, Vicente Ferreira da Silva e Olavo de Carvalho.
Duas outras editoras vêm igualmente
contribuindo no sentido e reduzir
os efeitos do patrulhamento ideológico estabelecido pela área de humanidades de
diversas universidades: Vide Editorial, de Campinas, São Paulo, e Resistência
Cultural, de São Luís, Maranhão.
A Vide Editorial inclui em seu
catálogo uma interessante coleção do pensador Peter Kreeff que encontrou uma
forma original de difusão de textos filosóficos, imaginando que Sócrates dialoga
com os principais deles. Apareceram aqueles em que o diálogo se dá com Marx,
Sartre, Maquiavel, Kant, Hume e Descartes.
Editou textos fundamentais da Escola Austríaca de Economia, a saber, de
Ludwig Von Mises: A mentalidade
capitalista e Caminho da Servidão;
e, de Eugene von Bohm-Bowerk: Teoria da
exploração socialismo-comunismo; textos filosóficos de Olavo de Carvalho (Aristóteles em nova perspectiva e A filosofia e seu inverso); e Marxismo e descendência, de Antonio
Paim.
A Resistência Cultural, a par de
secundar o empenho de manter viva no país a chama do pluralismo, desenvolve
notável trabalho de superar o isolamento cultural existente entre estados e
regiões, tendo se disposto a organizar a difusão de livros editados no
Sudoeste, que atendam ao propósito de preservar o legado liberal. Neste
sentido, organizou uma biblioteca de obras dessa índole, com base em doações.
A Resistência Cultural patrocina o
funcionamento do Instituto Liberal do Nordeste que, entre outras atividades,
realiza as Semanas da Liberdade, alternativamente, em capitais do Norte e
Nordeste.
Dando início ao programa editorial,
lançou uma coletânea de textos de Roberto Campos, organizados por Aristóteles
Drumond, com o título de O homem mais lúcido
do Brasil.
Tem programada a edição da obra
completa de João Camilo de Oliveira Torres (1915/1973).
Capa da obra de Antônio Paim intitulada: Problemática do Culturalismo, em que o autor aprofunda nas raízes filosóficas da Corrente Culturalista, herdeira do neokantismo e da fenomenologia. |
A
sobrevivência
do cientificismo
O cientificismo corresponde a uma
tradição cultural tão antiga quanto o contra-reformismo porquanto é cultuado
desde os tempos de Pombal. Acabou impondo-se à sociologia brasileira, em que
pese, nessa matéria, tenhamos produzido notável grupo de pensadores independentes, a
exemplo de Silvio Romero, Oliveira Viana, e, em nossos dias, a obra criativa de
Roberto da Matta.
No período recente, basicamente, nutre-se da tradição sociológica
francesa que, pela mão de Emile Durkheim 1858/1917), atribui à sociologia a função de contribuir
para a instauração do socialismo, enquanto equipara o fato social ao fato natural. Ao privá-lo do
valor, retira-lhe toda especificidade, como se pode evidenciar dos que deram
continuidade a tais ensinamentos e criaram autêntica tradição durkheiniana.
Ademais, no período considerado, tivemos uma herança pesada. O
endurecimento dos governos militares levou à mais brutal perseguição de
numerosos intelectuais. Em diversas universidades, foram criadas comissões de inquérito,
integradas por militares. O resultado não poderia ser mais desastroso. Sobretudo
no ciclo de vigência do AI5, quando o empenho consistia em eliminar toda e
qualquer oposição, cometeram-se toda sorte de arbitrariedades, difíceis de
serem sanadas quando a alta hierarquia do Exército impôs o que passou à
história como abertura (demasiado) “lenta e gradual.”
Do combate às idéias pela força
resultou sobretudo que professores que
não tinham méritos para sobressair, vítimas de perseguição, tornaram-se
mártires. Aqueles que teriam condições de derrotá-los no plano ideológico
sentiram-se inibidos, porquanto não concordavam com a perseguição política de
que estavam sendo vítimas. E assim, a emenda ficou pior que o soneto.
Exemplo edificante do imbróglio criado
é a notoriedade alcançada pela profa. Maria Yeda Linhares (1921/2011), professora
do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, da UFRJ, resultante do
desmembramento dos cursos mantidos pela Faculdade Nacional de Filosofia,
determinado pela reforma universitária de 1968. Presa, processada e demitida em
decorrência do AI5, mais tarde viria a alcançar notoriedade inusitada, sem
dispor de obra que justificasse tais deferências. Com a anistia decretada pelo
último governo militar, foi readmitida.
Ainda no governo Geisel, passou a
dirigir grupo de estudos da Fundação Getúlio Vargas destinado a reconstituir a
história da agricultura brasileira. Desse trabalho resultaria, na UFRJ, a
criação em 1977 do CPDA (Ciências Sociais em Desenvolvimento da Agricultura) que
viria a tornar-se o principal centro irradiador da hostilidade ao agronegócio,
dispondo de ampla cobertura internacional. Como curso de pós-graduação, iria
constituir uma ampla rede integrada por diversas universidades, dispondo da
possibilidade de assegurar bolsas de estudo tanto no país como no exterior.
Pessoalmente, Maria Yeda Linhares
tornou-se professora emérita da UFRJ, mereceu homenagem patrocinada pelo CNPq.
Ao completar 80 anos, em 2001, a FAPERJ incumbiu-se de organizar publicação em
sua homenagem.
Em vão procurar-se-á em sua
bibliografia o que explicaria tal notoriedade. Consta dois livros, um como
organizadora (História geral do Brasil,
Editora Campus, 1980) e outro em parceria com Francisco C.T. da Silva (História da Agricultura Brasileira, Ed.
Civilização Brasileira, 1981).
Dispomos de amplo quadro do
desenvolvimento alcançado pelos cursos universitários dedicados às ciências
sociais, devido ao prof. Enno d. Liedke Filho, do curso de pós-graduação em
sociologia da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS), publicado na revista Sociologia (Porto Alegre, ano 7 nº 14; julho/dezembro, 2005).
Em 2002, achavam-se em funcionamento, nas áreas de Antropologia, Ciência Política e Sociologia,
51 cursos de pós-graduação, com um corpo docente de 901 professores em sua
quase totalidade dispondo de doutorado, e possuindo um total de 1.742 alunos de
mestrado e 1.476 de doutorado. A julgar pelos dados disponibilizados pela USP,
em torno da metade desses alunos são absorvidos pelas próprias instituições
gestoras dos cursos, destinando-se os demais para outras universidades.
O levantamento do professor gaúcho refere que uma das questões a que
deve dar conta essa proliferação de cursos refere-se à própria utilidade da
sociologia. Enumerando as respostas, vê-se que o entendimento predominante diz
respeito à orientação de determinada atuação política. Senão vejamos: identificação
dos instrumentos de dominação racial e de dominação de fração de classe;
disciplina auxiliar do que denomina “progressismo pedagógico” (que se pode
perfeitamente imaginar o que seja, no ambiente considerado); instrumento de
modernização societária; instrumento de libertação nacional; elemento de apoio
aos espaços de democratização da sociedade brasileira.
Levando em conta que núcleos constituídos nas principais universidades
tornaram-se a fonte do mais aguerrido combate ao agronegócio, fica claro o que entendem por “modernização
societária.” O desenvolvimento experimentado pela agricultura brasileira nas
últimas décadas, levando-a a figurar entre as maiores fornecedoras de alimentos
do mundo, corresponde a um tipo de modernização (capitalista) que recusam
liminarmente. O patrulhamento ideológico que se instaurou nos mencionados
centros universitários, por sua vez, demonstra o que entendem por “democratização”.
Ainda segundo o estudo em apreço, a principal influência é francesa, com
destaque para Pierre Bourdieu (1930/2002). Tive oportunidade de examinar
amplamente suas teses no livro Marxismo e
descendência (Vide Editorial, 2009, págs. 382/385). Apontarei brevemente
tais considerações, para termos presente o grau de simplificação a que se
resume o seu entendimento da vida social.
A representatividade desse autor é demonstrada pelo fato de que, como
professor da École Normale Supérieure alcançou notoriedade suficiente para
ganhar uma cadeira no Collège de France. Em 1993, foi homenageado com a Medalha
de Ouro do Centre National de la Recherche Cientifique (CNRS).
Seguindo o exemplo de Durkheim, ao criar o L´Année Sociologique como meio de organizar uma rede internacional
difusora de sua sociologia, Bourdieu editou a publicação periódica Actes de la recherche em sciences sociales,
ao que tudo indica (à luz do exemplo brasileiro) com pleno sucesso.
Em sua numerosa bibliografia estudou detidamente o que denominou de
“reprodução das classes sociais” e de “formas do capital”. A este último
desagregou em capital econômico (detém o controle dos recursos econômicos);
capital social (relações de grupos, redes de influência); capital cultural (conhecimento;
educação, entendendo que a escola é um instrumento de preservação de privilégios
e sua reprodução), e finalmente, capital simbólico (prestígio, honrarias) A
partir esse tipo de análise, estruturou a difusão da tese de que o capitalismo
engendraria uma teia diabólica, exigindo contrapor-lhe um “savoir engagé”.
Empenhou-se decididamente, desde os anos oitenta, em tornar-se um dos
principais artífices da luta contra as elites políticas e o capitalismo
“neoliberal”, ao qual atribui todos os males do mundo.
Bourdieu chegou a um exagero tal na demonização da vida social, por esse
monstro chamado globalização capitalista (neoliberal), que afirma que basta ler
os relatórios da Organização Mundial do Comércio (OMC) para conhecer a política
educacional que teremos em cinco anos. “O ministro da educação nacional,
escreve, somente reproduz as diretrizes elaboradas pelos juristas, sociólogos,
economistas que, uma vez formuladas, são postas em circulação”. O intelectual
engajado pode mudar esse quadro.
Como se não dispusesse de toda a
liberdade para expressar a convicção de que vivemos num clima de opressão sob o
capitalismo que compara literalmente o Estado Liberal de Direito ao Estado
Totalitário, de que os soviéticos nos deram uma amostra.
À pessoa não intoxicada por esse tipo de pregação, a catilinária de
Bourdieu parecerá algo de alucinatório. Como explicar que a sociologia ensinada
na universidade brasileira se haja ajustado a esse tipo de pregação se não
tivermos em conta a crença arraigada numa ciência social fornecedora de um
saber equivalente ao conhecimento difundido pelas ciências exatas?
Capa da obra do Paim intitulada: A meditação ética portuguesa. O autor é um dos mais profundos analistas das relações entre as filosofias portuguesa e brasileira. |
Capa da obra intitulada: Nascimento da ética social moderna, um aprofundado estudo acerca da forma em que foi tematizada, na Inglaterra, a Moral Social de tipo Consensual. |
Sobrevivência
de apropriada
meditação filosófica
Nos dois séculos de vida independente como país, no ensino superior
brasileiro formaram-se importantes centros de investigação
científica, primeiro nas Escolas Politécnicas bem como nas Faculdades de
Direito e Medicina, núcleos estes que foram abrigados por universidades, quando
finalmente se constituíram, ou em estabelecimentos estruturados para funcionar
isoladamente. Tais centros não poderiam sobreviver apoiando-se no conceito
oitocentista de ciência, sustentado pelo positivismo e pela versão marxista que
a este se fundiu. A busca de familiaridade com o conceito de ciência que se
forma a partir de fins do século XIX e começos do seguinte seria buscada, desde
o seu surgimento, pelas Escolas Politécnicas do Rio de Janeiro e de São Paulo.
O próprio movimento em prol da Universidade seria devido a esse grupo, do mesmo
modo que a organização da Academia Brasileira de Ciências, fundada em 1916.
O cerne da questão reside no adequado entendimento da relação entre
desenvolvimento tecnológico e pesquisa científica. Os estudiosos da história da
ciência assinalam que embora a investigação científica possa conduzir --e tenha
conduzido-- a aplicações de ordem tecnológica, sempre que estas são colocadas
como seu objetivo primordial a ciência entra em declínio. Portanto, a
realização da aspiração magna das gerações que vivenciaram os desdobramentos da
Revolução de 30 --que consistia na realização de nossa revolução industrial--
pressupunha a superação da idéia de que a ciência achava-se pronta e conclusa,
o que nos privava de participar do seu incessante desenvolvimento, motor do progresso
material das nações líderes do Ocidente.
Exemplo edificante da promissora relação existente entre pesquisa
científica e desenvolvimento tecnológico encontra-se no que tem sido denominado
de “modelo de desenvolvimento
tecnológico da Aeronáutica”. Tivemos oportunidade de proceder a uma ampla
caracterização dessa experiência, no estudo que leva essa denominação e pode
ser acessado no site www.institutodehumanidades.com.br/OBRAS,
razão pela qual vou aqui limitar-me a assinalar o essencial.
É certo que o impulso básico provinha da compreensão da necessidade de
modernização de nossas Forças Armadas. No documento que se encontra à base da
Revolução de 30 --Plataforma da Aliança
Liberal, divulgada a 2 de janeiro de 1930-- assinala-se a necessidade de “desenvolver-se entre nós a indústria
militar (assinalando-se que sobretudo no que se refere à artilharia e à
aviação) libertando-nos,tanto quanto possível, dos mercados estrangeiros na compra
de material bélico.” O propósito de implantar indústria siderúrgica é
relacionado diretamente a essa necessidade.
O notável é que, na criação do Instituto Tecnológico da Aeronáutica
(ITA) se haja começado por desenvolver a pesquisa científica. Desejava-se criar
quadros capazes de estar a par do desenvolvimento da pesquisa nos grandes
centros, em especial dos Estados Unidos.
Criado em 1945, toma por modelo o famoso Tecnological Institute of
Tecnology (MIT) de Massachusetts. Seu primeiro reitor seria o prof. Richard M.
Smith, do Corpo Docente daquele Instituto, que se incumbiu diretamente de sua
implantação, de 1946 a 1949. Depois dessa data, continuou exercendo as funções
de consultor. Nessa última condição, escreveria no relatório que elaborou em
1952: “A capacidade de pesquisa em uma
nação depende mais dos pesquisadores com que conta do que dos meios e
facilidades para pesquisa. Especialmente no campo da pesquisa pura, bons
pesquisadores, livres de burocracia, alcançam bons resultados com orçamentos
reduzidos e modestos recursos de laboratório.”
Cumpre, pois, na consideração do sucesso da EMBRAER, ter presente o
modelo que lhe deu origem.
O ITA proporcionou um modelo que se revelou como uma forma criativa de
incorporar à nossa meditação um importante segmento da filosofia ocidental,
modelo esse que, pelos indícios de que se dispõe, tem sobrevivido.
A par das disciplinas diretamente relacionadas à engenharia, com
destaque para a engenharia aeronáutica, o ITA passou a dispor de Departamento
de Humanidades, contando com duas cadeiras: lógica matemática e filosofia da
ciência. Implantou-as Leônidas Hegenberg
(1925/2012) que, além de preparar o material didático requerido, popularizou no
país a obra dos principais estudiosos contemporâneos das duas disciplinas. (1)
Preservado no ITA, o modelo em apreço veio a ser adotado em outros
centros, a exemplo do que adiante se refere.
Na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), o prof. Francisco
Caruso (nascido em 1959) -- do Instituto de Física da UERJ e editor da revista Ciência Hoje--ocupa-se da disciplina Aspectos epistemológicos e históricos do
espaço físico. Paralelamente, desenvolve atividade sistemática de
vulgarização científica. Pertence à Academia Brasileira de Filosofia.
Iniciativa análoga, desta vez na Universidade Federal do Paraná,
confirma a hipótese difundida pela profa. Creusa Capalbo, segundo a qual a
fenomenologia não deveria ser entendida como um sistema mas como método
destinado a ocupar-se da fundamentação (filosófica) das ciências humanas. Temos
em vista o trabalho desenvolvido, na citada Universidade, pelo prof. Adriano
Furtado Holanda, no Departamento de Psicologia, a que pertence. Doutor em
psicologia pela PUC de Campinas (2002), a simples menção de alguns de seus
livros indica a natureza da atividade acadêmica que desenvolve: O campo das psicoterapias. Reflexões
(2012); Gestalt-terapia e
contemporaneidade (2005); Fenomenologia e humanismo. Reflexões (2004); Psicologia,
religiosidade e fenomenologia (2004)
Ao que parece, a forma indicada de aproximar-se da filosofia da ciência
parece ser o modo apropriado de enraizá-la e permitir que prospere, vindo a
ocupar-se de temática que não se limite a dar conta do que faz o centro
correspondente da London Sochool of Economics. Este é parte de uma tradição
filosófica secular, consistindo numa autêntica filosofia nacional e não se acha
fadado a desaparecer em seu próprio país de origem mas apenas como um sistema a
ser imitado e copiado por outras nações..
A maneira como se estruturou o sistema de ensino da filosofia em nossas
universidades, atribuindo-lhe a exclusiva função de formar professores da
disciplina, condena os estudiosos dessa ou daquela disciplina a não deixar
herdeiros. A filosofia deveria ser ensinada a todos que ingressam nesse nível
de ensino e teria que ser adaptada ao desempenho da nova função. A insistência
no modelo atual a condena a tornar-se instrumento de grupos políticos (ou
religiosos), caudatários das tradições culturais arraigadas. Para a formação de
especialistas a pós-graduação teria que reduzir-se a uns poucos institutos de
pesquisa, onde as pessoas vocacionadas para esse mister pudessem ser
devidamente aproveitadas.
Experiências de preservação
da filosofia brasileira
A filosofia brasileira, para criar
“elos e derivações” --se quisermos usar a expressão consagrada pelo prof. Miguel
Reale-- não precisou que o país dispusesse de universidades. Ao longo de nossa história como
país independente mentes criativas defrontaram-se com problemas concretos que
exigiam ser considerados do ângulo filosófico. Progressivamente alguns temas
teóricos acabaram impondo-se. A começar da pergunta pela natureza da pessoa
humana mas também o problema de identificar seu papel em face do prestígio
crescente e da vocação imperialista da ciência. Como aproximar-se dessas
categorias de forma a dar-se conta de suas peculiaridades essenciais? Nessa
inquirição, a filosofia brasileira produziu
textos admiráveis. Nessa matéria, o grande mérito do prof. Reale consiste em ter-nos facultado um método
capaz de superar as antigas preocupações com originalidade e outros aspectos,
na matéria, de fato irrelevantes. E, por essa via, documentar a reconstituição
de tal trajetória.
A tarefa que se colocava para a geração que nos substituiu consistia em
preservar as conquistas alcançadas, como condição primordial de seu ulterior
desenvolvimento. Ter-se-ia de fazê-lo mesmo diante da circunstância de que, na
medida em que se consolidava no país a universidade limitada à
profissionalização, menores as possibilidades de, em seu seio, prosperar
atividades relacionadas à cultura geral. Esta, ainda que figure entre as
funções do sistema de ensino, é completamente ignorada.
As experiências que parecem mais afeiçoadas ao nosso tempo consistem
naquelas que repousam na utilização dos
meios de comunicação que emergiram e passaram a ser dominantes em nosso tempo.
Temos em vista a difusão mediante o recurso à computação.
O Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro (CDPB), estruturado
como uma biblioteca detentora do acervo disponível de livros e publicações
periódicas, relacionadas à filosofia, ao pensamento político, à sociologia e à
antropologia, organizou um site destinado a torná-los acessíveis na INTERNET. O
projeto consiste em digitalizar todos os estudos realizados no período recente,
sob a ótica do método que aplicamos na elaboração da História das Idéias Filosóficas no Brasil”, bem como textos de
autores relevantes.
Presentemente, no site em apreço -- www.cdpb.olrg.br
-- a matéria disponibilizada acha-se estruturado desta forma:
ESTUDOS DESTACADOS
BIBLIOGRAFIAS E ESTUDOS CRÍTICOS
DICIONÁRIO BIO-BIBLIOGRÁFICO
ÍNDICE DE REVISTAS
LEITURA BÁSICA DE HISTÓRIA DO BRASIL
Os ESTUDOS DESTACADOS abrigam os estudos dedicados à filosofia brasileira no período recente bem
como a obra de autores de destaque, subdivididas assim:
Obras gerais sobre o pensamento brasileiro (16 títulos)
Silvestre Pinheiro Ferreira (3
títulos)
Tradicionalismo (6 títulos)
A meditação ética brasileira (3
títulos)
Escola Eclética (6 títulos)
Escola do Recife (7 títulos, entre estes
os Estudos de filosofia, de Tobias Barreto
e os Ensaios de crítica de Artur Orlando)
Farias Brito; reação espiritualista e
correntes afins (2 títulos)
Movimento fenomenológico e
existencial; Culturalismo (8 títulos)
Estética; Filosofia do Direito, da
Educação e diversos (8 títulos)
Pensamento político (10 títulos)
Lógica e filosofia da ciência (4
títulos)
TOTAL: 73 títulos
BIBLIOGRAFIAS E ESTUDOS CRÍTICOS. Além das biografias e bibliografias,
reúne estudos dispersos, de difícil acesso, sobre pensadores destacados. Até o
presente acham-se acessíveis: Jackson de Figueiredo; Ubiratan Borges de Macedo;
Leonel Franca; Antonio Carlos Vilaça; Ivan Lins; Roque Spencer Maciel de
Barros; Silvestre Pinheiro Ferreira; Sílvio Romero; Miguel Reale; Tobias
Barreto; Djacir Menezes e Alceu Amoroso
Lima. Insere ainda a Bibliografia Filosófica Brasileira (1808/1985).
DICIONÁRIO BIO-BIBLIOGRÁGFICO contem verbetes de cerca de 400 autores
brasileiros de obras de filosofia; pensamento político; sociologia e
antropologia.
ÍNDICE DE REVISTAS. Acha-se digitalizado o Índice da Revista Brasileira de Filosofia (1945/2000) e estudo
sobre a Revista Convivium, da autoria
de Ronaldo Polletti.
LEITURA BÁSICA (antologias) de História do Brasil, destinada a preservar
parte do notável acervo da historiografia nacional (20 livros)
O trabalho desenvolvido pelo CDPB tem sido secundado por outras
iniciativas. Entre estas, destacaria as que têm sido patrocinadas por Ricardo
Vélez Rodriguez.
Ao tempo em que pertencia ao Corpo Docente da Universidade Federal de
Juiz de Fora (Minas Gerais) experimentou o patrulhamento da CAPES ao promover o
descredenciamento do Curso de Pós Graduação em Filosofia Brasileira, em que
pese tenha sido uma iniciativa muito bem sucedida, contando com grande
acolhimento de parte da intelectualidade local, já que não se limitava a aceitar
alunos oriundos da filosofia mas figuras representativas daquele grupo social,
notadamente médicos e engenheiros.
Diante desse desfecho, Vélez passou a ocupar-se da disciplina para a
qual, desde então, fora designado pelo Departamento de Filosofia. É
interessante destacar que a retomada
daquele empreendimento caberia a alunos da Universidade, nem todos provindos do
curso de filosofia. Tal se deu uma década depois da mencionada extinção do
estudo da filosofia brasileira na UFJF. Sua disposição era a de organizar o
estudo da filosofia brasileira de forma independente do Departamento,
inicialmente designado como Núcleo de Estudos. A formalização deu-se em 2003.
O mérito de iniciativas desse tipo advém do fato de que o estudo
autônomo da filosofia brasileira livra-a dos humores dos responsáveis pela
disciplina Filosofia Contemporânea --onde, segundo o programa oficial, figura a
Filosofia Brasileira-- nem sempre dispostos a atuar segundo o espírito
acadêmico, preferindo a linha do proselitismo.
A atividade básica desenvolvida pelo Núcleo de Estudos correspondeu à
efetivação de seminários. A par disto, editou revista (impressa e eletrônica)
destinada a divulgar o trabalho realizado.
Promoveu ainda Colóquio de Pesquisadores da Filosofia Brasileira em
Minas Gerais (2006); Semana de Estudos
sobre os duzentos anos da vinda da Corte Portuguesa para o Brasil (2008);
participação dos integrantes do Núcleo de Estudos no Colóquio em Homenagem a
Miguel Reale, realizado em 2009, em Lisboa, pelo Instituto de Filosofia
Luso-Brasileira; análise dos escritos de Silvestre Pinheiro Ferreira e estudo
da concepção ética em autores luso-brasileiros no decorrer do século XIX.
Por iniciativa dos alunos, o Núcleo de Estudos ampliou o escopo de suas
atividades para abranger pensadores espanhóis e ibero-americanos. A extensão
tornou-se possível à vista de que Ricardo Vélez é especialista na matéria.
Sem embargo dessa extensão, fornece um modelo interessante de
sobrevivência do estudo da filosofia brasileira na Universidade,
independentemente do que pensem eventuais responsáveis pela disciplina
Filosofia Contemporânea. Nesta suposição, vamos concentrar-nos no detalhamento
dos seminários, forma principal e permanente de funcionamento do Núcleo de
Estudos.
Para fazer-se uma idéia dos estudos desenvolvidos na matéria, o Núcleo
de Estudos adotou como fonte o ordenamento
produzido por José Maurício de Carvalho, acessível no site do CDPB. O material
de que se trata acha-se subdividido em cinco partes, a saber: I-Principais
autores plenamente estudados; II-Problemas e estudiosos contemporâneos;
III-Outros autores de destaque; IV-Contribuições em torno de problemas específicos;
V-Bibliogrfia.
Os seminários, principal atividade desenvolvida pelo Núcleo de Estudos
tiveram por objetivo o estudo conjunto de determinada obra. Dispondo da
informação relativa ao método empregado no estudo da filosofia brasileira
(centrado nos problemas teóricos enfrentados pelos autores), bem como da
indicação das obras mais destacadas que os espelham, é fácil efetivar uma
seleção de tais textos. A título de sugestão, poder-se-ia iniciar com duas
obras capazes, desde logo, de comprovar a fecundidade dessa meditação.: os Estudos de Filosofia, de Tobias Barreto
(acessível no site do CDPB; a par disto, em 2013, o governo de Sergipe promoveu
uma nova edição) e Experiência e Cultura,
de Miguel Reale, de fácil aquisição notadamente da 2ª edição (reproduz a
primeira, sem alterações).
No
modelo implantado por Ricardo Vélez, a obra escolhida é subdividida para estudo
em determinado número de sessões, tomando por base os capítulos ou temas que
seriam centrais. Sua discussão dá-se a partir de uma apresentação do relator,
designado na oportunidade da aprovação do programa de sessões. Deve conter os
temas que, a seu ver, deverão ser obrigatoriamente debatidos. Naturalmente,
cabe a todos os participantes proceder ao estudo respectivo de forma
independente para que possam ter participação ativa no debate.
Outro aspecto digno de ser destacado
diz respeito a que a escolha da obra seja sempre consensual.
NOTA
(1) O conjunto da obra de Leonidas
Hegenberg foi estudado por José Maurício de Carvalho, texto este que pode ser
acessado no site do Centro de Documentação
do Pensamento Brasileiro, a saber:
(www.cdpb.org.br/ESTUDOSDESTACADOS/LOGICAEFILOSOFIADACIÊNCIA).
Capa da obra Tratado de Ética, de Antônio Paim, um estudo sistemático acerca dos fundamentos da Moral Ocidental e das suas decorrências culturais no Brasil. |
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