Em boa hora foi publicada a tese de doutorado de Marco Antônio
Barroso (nascido em 1978) acerca do pensamento de Benjamin Constant de Rebecque sobre a Religião. A tese de Marco Antônio apareceu com o título: Benjamin Constant de Rebecque, um pensador entre o Iluminismo e o Romantismo (Prefácio de Ricardo Vélez Rodríguez. Curitiba: Appris Editora, 2016, 249 p.). A obra de Constant de Rebecque, que foi uma das fontes do liberalismo no Brasil ao longo
do Primeiro Reinado, já tinha sido estudada no nosso meio do ângulo da sua
concepção política.
Antes de apresentar o conteúdo da obra, umas linhas acerca do autor. Marco Antônio Barroso forma parte da nova geração de estudiosos do pensamento brasileiro, que se formou na Universidade Federal de Juiz de Fora sob a minha orientação, ao longo dos últimos vinte anos. Possui Licenciatura (obtida em 2005) e Bacharelado (atingido em 2006) em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora. No que tange à pós-graduação, Marco Antônio realizou, com sucesso, estudos de pós-graduação em Ciência da Religião na mesma Universidade, tendo concluído a especialização (em 2006), o Mestrado (em 2009) e o Doutorado (em 2013).
Tive a satisfação de participar da orientação de Marco Antônio nas duas últimas etapas dos seus estudos de pós-graduação, como membro da Banca Examinadora da sua Dissertação de Mestrado (que versou sobre o pensamento de Henri Bergson, no que tange à filosofia da religião) e como Orientador da sua Tese de Doutorado.
Desde o início encontrei em Marco Antônio um pesquisador de qualidade, dotado de rigorosa disciplina de trabalho, aliada a uma aguda percepção do rumo das ideias filosóficas na rica conjuntura representada pelo Romantismo no cenário europeu e pelo Espiritualismo no decorrer do século XIX, ao ensejo da formulação das filosofias que se contrapuseram, na Europa e no Brasil, ao Cientificismo.
Interessava a Marco Antônio estudar de perto as respostas dadas pelos filósofos no âmbito do pensamento liberal-conservador. Isso explica as suas escolhas temáticas para a Dissertação de Mestrado (Bergson) e para a Tese de Doutorado (Constant). Marco Antônio dedica-se hoje, com inegável sucesso, às atividades de docência e de pesquisa na Universidade Estadual de Minas Gerais (campus de Ubá). É membro da Associação Brasileira de História das Religiões e da Sociedade Brasileira de História da Ciência.
Desde o início encontrei em Marco Antônio um pesquisador de qualidade, dotado de rigorosa disciplina de trabalho, aliada a uma aguda percepção do rumo das ideias filosóficas na rica conjuntura representada pelo Romantismo no cenário europeu e pelo Espiritualismo no decorrer do século XIX, ao ensejo da formulação das filosofias que se contrapuseram, na Europa e no Brasil, ao Cientificismo.
Interessava a Marco Antônio estudar de perto as respostas dadas pelos filósofos no âmbito do pensamento liberal-conservador. Isso explica as suas escolhas temáticas para a Dissertação de Mestrado (Bergson) e para a Tese de Doutorado (Constant). Marco Antônio dedica-se hoje, com inegável sucesso, às atividades de docência e de pesquisa na Universidade Estadual de Minas Gerais (campus de Ubá). É membro da Associação Brasileira de História das Religiões e da Sociedade Brasileira de História da Ciência.
Antônio Paim chamou a
atenção para a influência de Constant na nossa cultura política, no seu
clássico livro História do liberalismo brasileiro (São Paulo: Mandarim, 1998),
com as seguintes palavras: “Benjamin Constant considerava a liberdade como o
núcleo do seu sistema. A partir de tal princípio concebeu a monarquia
constitucional, de governo representativo, embrionariamente parlamentarista e
bicameral, como definiu Ubiratan Macedo. À segunda Câmara (o Senado),
duradoura, incumbe não apenas a prudência nas reformas, mas, sobretudo, evitar
retrocessos na marcha política para maior liberdade e igualdade. O modelo de
Constant atribui especial papel ao Monarca, ao lhe delegar a função que se
chamou de Poder Moderador”.
Ubiratan Macedo destacou o importante lugar ocupado por
Constant na formação das ideias liberais no Brasil, ao longo do século XIX. A
propósito da influência de Constant na educação política de Dom Pedro I,
escreveu: “(...) O nosso primeiro imperador lutou denodadamente contra o
absolutismo monárquico e na formação desse seu espírito liberal o conhecimento
da obra de Benjamin Constant há de ter desempenhado um papel decisivo, fato
atestado pelo seu biógrafo Octavio Tarquínio de Souza. Não seria estranha à
predileção do nosso primeiro imperante a tumultuada vida pessoal de Benjamin:
paixões e casamentos sucessivos, duelos, a postura boêmia, nada conservadora”
(Ubiratan Macedo, “O liberalismo doutrinário”, in: Evolução histórica do liberalismo,
organização de Antônio Paim. Belo Horizonte: Itatiaia 1987).
José Osvaldo de Meira Penna indicou Constant como uma das
fontes do ideal libertário no pensamento brasileiro (de forma semelhante a como
Tzvetan Todorov enfatizou a inspiração desse ideal, tão caro à tradição
francesa, em Benjamin Constant). Outro estudioso pioneiro no nosso meio da obra
de Constant, do ângulo da filosofia política, foi Roque Spencer Maciel de
Barros (Introdução à Filosofia Liberal, São Paulo: Grijalbo, 1971).
Em livro por mim escrito em 2002 (O Liberalismo Francês: a tradição
doutrinária e a sua influência no Brasil, Londrina: Instituto de
Humanidades, 2002, edição digital) destaquei também a influência de Constant na
formação do liberalismo brasileiro, notadamente no pensamento de Silvestre
Pinheiro Ferreira, em especial no que tange à doutrina da representação como
salvaguarda das liberdades dos cidadãos.
Marco Antônio Barroso formou parte do grupo de estudantes dos
cursos de Filosofia, História, Ciências Sociais e Direito da Universidade
Federal de Juiz de Fora que pesquisaram, sob a minha orientação, a evolução das
ideias filosóficas no Brasil, no Núcleo de Estudos Ibéricos e
Ibero-americanos, criado por mim em 2003 e que funcionou até a minha
aposentadoria nessa Universidade, em meados de 2013. A partir desse Núcleo
tive oportunidade de orientar a elaboração da dissertação de mestrado,
bem como a tese de doutoramento de Marco Antônio, como já foi frisado, no
Curso de Doutorado em Ciência da Religião da UFJF.
Outros membros do Núcleo defenderam as suas teses de
pós-graduação no mencionado curso: Alexandre Ferreira de Souza, Humberto
Schubert Coelho, Júlia Junqueira, Jefferson Silveira Teodoro e César Rafael
Pitt. Na área de História, alguns membros do Núcleo: Bruno Maciel Pereira, Sérgio
Luna Couto e Antônio Gasparetto defenderam as suas dissertações de Mestrado no
Curso de Pós-graduação em História da UFJF. Fabrício Oliveira, professor da
Faculdade de Direito da UFJF, defendeu a sua tese de doutoramento em Filosofia
do Direito na Universidade de Coimbra, com pesquisa realizada na Universidade
de Stanford (Estados Unidos).
Foram criadas, por iniciativa dos membros do Núcleo, as revistas eletrônicas: Ibérica e Cogitationes (ambas dirigidas por Alexandre Ferreira de Souza e Marco Antônio Barroso), recomendadas pela Capes como publicações periódicas referenciais na área de Ciências Humanas. O Núcleo de Estudos Ibéricos e Ibero-americanos, que foi iniciativa dos meus alunos, revelou-se, assim, celeiro de pesquisadores.
Foram criadas, por iniciativa dos membros do Núcleo, as revistas eletrônicas: Ibérica e Cogitationes (ambas dirigidas por Alexandre Ferreira de Souza e Marco Antônio Barroso), recomendadas pela Capes como publicações periódicas referenciais na área de Ciências Humanas. O Núcleo de Estudos Ibéricos e Ibero-americanos, que foi iniciativa dos meus alunos, revelou-se, assim, celeiro de pesquisadores.
Apresentei o projeto e a primeira fase da pesquisa da Tese de
Marco Antônio Barroso à minha orientadora de pós-doutorado, Françoise Mélonio,
do Instituto de estudos Sciences Po de Paris e o meu
orientando foi aceito para completar a pesquisa nesse prestigioso centro, sob a
orientação dela e do professor Lucien Jaume, diretor do mesmo. Por razões
burocráticas Marco Antônio não conseguiu viajar, tendo desenvolvido
integralmente a sua pesquisa no Brasil. Mas o fato de o projeto ter sido
aprovado pelos pesquisadores do Science Po revela as acertadas
hipóteses levantadas pelo meu orientando, bem como a seriedade da sua pesquisa.
A obra de Marco Antônio Barroso, que ora tenho a honra de
apresentar, vem dar uma contribuição original ao estudo do pensamento de
Benjamin Constant de Rebecque, porquanto se debruça sobre aspecto não estudado,
no nosso meio, da magna obra desse pensador: a sua filosofia da religião. No
entender de Marco Antônio, Constant era um libertário. Formado na tradição
espiritualista da filosofia escocesa do senso comum (na Universidade de
Edimburgo foi aluno de Adam Smith) e no estudo do idealismo alemão, o pensador suíço-francês
dedicou a sua vida à pesquisa e à defesa filosófica e política do ideal da
liberdade. No terreno das ideias, Constant considerava que esta era um dom de
Deus, plantado por Ele no fundo dos nossos corações e que se revelava, junto
com o sentimento religioso, como uma espécie de apriori axiológico que
condicionava toda atividade humana. Ambos esses sentimentos estavam, assim,
estreitamente ligados. O indisfarçável espiritualismo escocês vinculava-se, na
obra de Constant, ao augustinismo, na trilha do espiritualismo cristão de
inspiração paulina.
A Religião para Constant era, segundo a acurada análise de
Marco Antônio Barroso, uma manifestação primigênia do indivíduo, na trilha da
valorização do livre-exame e do pietismo protestante, reforçando a tradição dos
huguenotes franceses. O seu conceito de “sentimento religioso” era análogo ao
de “sentimento de liberdade” e constituía a base ontológica sobre a qual
ancorava a sua concepção romântica do aperfeiçoamento individual. O homem
descobria esse núcleo luminoso que o aproximava da divindade, no interior do
seu coração. Constant aproximava-se, destarte, do conceito de “Ich-Ur” do
romantismo alemão. Benjamin Constant, como Madame de Staël, sua companheira
afetiva e de aventuras intelectuais, valorizava o conceito de “perfectibilidade
humana” e o alicerçava em ambos os sentimentos: o religioso e o de liberdade
que, no seu entender, estavam estreitamente vinculados, sendo indissociáveis no
que tange à adequada compreensão de cada um deles.
Assim sintetiza Marco Antônio Barroso o cerne
da sua pesquisa: “A hermenêutica
apresentada por Constant de Rebecque consistiria em se arriscar no terreno da
teologia do seu tempo em lugar de formular uma estrutura argumentativa
puramente histórica para a descrição do fenômeno religioso. As finalidades da
pesquisa de Constant, em De la
religion, são: 1 -
escrever uma obra sobre as religiões em geral e, em especial, sobre as
religiões antigas, para analisar o que é o fato religioso em suas manifestações
(históricas, sociológicas e políticas); 2 - descrever o que é o sentimento religioso em sua essência.
Neste segundo caso trata-se, pois, de demonstrar que a religiosidade, ou o
sentimento religioso, é um dos fundamentos da individualidade. Para o nosso
autor este sentimento, enquanto disposição humana, sempre ativa, perfectível e
percebida de forma individual, serve como referência para o que é a verdadeira religião e também para a liberdade”.
Num momento especialmente delicado da nossa história política, com o
Estado Patrimonial procurando se reforçar contra a vontade explícita dos
cidadãos, é patente a atualidade da pesquisa de Marco Antônio Barroso sobre a
obra de Benjamin Constant de Rebecque. O estudo sistemático do pensamento
político e filosófico deste grande autor, um dos clássicos do liberalismo,
certamente trará muitos subsídios para a geração de jovens estudiosos que
buscam alternativas diferentes em face da já gasta propaganda do positivismo
marxista, que terminou vingando nas nossas Universidades, notadamente as
públicas.
Bom saber que seus esforços geram frutos importantes! A tese de mestrado foi publicada? É possível acessa-la? Abração, MAM
ResponderExcluirCaro Professor....suas preciosas sementes plantadas na UFJF estão (e continuarão) gerando frutos substanciosos. Parabéns!!!
ResponderExcluir