Artigo publicado no Estadão de 22-10-2016
O Presidente Lula, em maio de 2010 e o Presidente boliviano Evo Morales, ostentando colares de folhas de coca em Santa Cruz de la Sierra (Revista Veja, blog de Reinaldo Azevedo, 28 de maio de 2010). |
O PCC, ao longo das últimas décadas, converteu-se no Cartel do "Narcosul". Nascido da reação contra o massacre do Carandirú (1992), o PCC já domina a maior parte dos presídios brasileiros. E, desde essa posição, passou a dominar o tráfico de drogas no Brasil e na região do MERCOSUL. Daí o nome dado pelos meliantes à organização: "Narcosul". É o que revela a pesquisa publicada pela revista Veja sob o título: "O Carandiru e o PCC" (edição 2498, 5 de outubro de 2016, pgs. 84-97).
Era questão de tempo o Brasil ter o seu grande cartel das
drogas. Acontece que, em política, se falta a perspectiva estratégica (que,
infelizmente, está longe das mentes dos nossos políticos), fica aberta a porta
para eventos negativos. É o que está acontecendo com a força demonstrada pelo
PCC em matéria de narcotráfico. Hoje é a principal organização criminosa
brasileira que rivaliza, em lucros, com as maiores empresas do país, chegando a
ocupar a 16ª posição, com ganhos da ordem de 20,3 bilhões de reais ao ano, à
frente de grandes empresas como a Volkswagen e a JBS Foods. Como chegou a
acontecer isso, após termos conhecido as desgraças patrocinadas na Colômbia
pelo Cartel de Medellín, de Pablo Escobar, nos anos 80 e 90 do século passado?
A resposta é: descaso e populismo.
Esse perigoso binômio nos levou a menosprezar a lição dada
pela Colômbia após sofrer a dura guerra do narcotráfico e da narcoguerrilha,
com os seus mais de 250 mil mortos. Lembro que, no final dos anos 90, fiz uma
palestra no Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio, no Rio de
Janeiro, acerca das desgraças produzidas pelo narcotráfico na "Cidade
Maravilhosa", que se tornou incontrolável após o ciclo populista dos dois
governos de Brizola.
Alertava, na época, para o risco de o Brasil se tornar
palco do crescimento de grandes cartéis de drogas, em decorrência do vácuo que
o populismo abriu em matéria de segurança pública e também como consequência do
vazio econômico gerado pela insegurança jurídica ensejada pelo "socialismo
moreno" do caudilho gaúcho, que fez com que mais de 800 empresas
abandonassem o Rio de Janeiro, quando da primeira administração brizolista que
começou em 1983, à sombra da retórica socialista das “perdas internacionais”,
que o capitalismo teria trazido ao país. Brizola, efetivamente, deu o passo
grande em matéria de abrir espaço ao crime organizado, ao pregar que a polícia
não subia em morro. Os traficantes ocuparam rapidamente o vácuo aberto e,
orientados pelos meliantes colombianos, começaram a adquirir armamento pesado.
Data daí a explosão da violência que o narcotráfico ainda impõe aos cidadãos
cariocas.
O empurrão inicial dado pelo brizolismo ao narcotráfico no
Rio veio ser potencializado, em nível nacional, pelos 13 anos de populismo
lulopetista, que simplesmente abriram as portas para o mercado de tóxicos no
Brasil. Lula, no palanque em Santa Cruz de La Sierra com Evo Morales, no início
do seu primeiro governo, ostentando no seu peito um colar feito de folhas de
coca, essa foi a imagem que percorreu o mundo do narconegócio, indicando o
"liberou geral" dos petistas para a produção e a distribuição das
drogas. Rapidamente o Brasil viu aumentar de forma fantástica a entrada de
pasta base de coca boliviana. O cocalero Evo Morales não fez por menos: ao
longo dos governos petistas, simplesmente duplicou a extensão que os bolivianos
dedicavam ao cultivo da folha de coca, a fim de destinar a maior parte da
produção para o mercado de tóxicos brasileiro.
Resultado: viramos mercado para a droga, ao mesmo tempo em
que nos firmamos como corredor de exportação de narcóticos para a Europa. Do
mercado americano, cada vez mais próspero, os nossos meliantes deixaram que
cuidassem os mexicanos, que ocuparam rapidamente o vácuo deixado com a morte de
Pablo Escobar, em 1993. As coisas se facilitaram enormemente para os
traficantes da América do Sul, com a instauração, na Venezuela chavista, de um
autêntico narcoestado que passou a proteger a narcoguerrilha colombiana das
Farc e que intermediou a compra de armas (lembremos que Fernandinho Beira-Mar
era um dos elos da cadeia de compra de armas por cocaína no mercado americano e
também no Brasil).
O corredor brasileiro de exportação de cocaína
transladou-se do centro-sul do país para as desguarnecidas cidades do Norte e
do Nordeste, carregando consigo a sua procissão de assassinatos e violência
generalizada, que explodiu nessas regiões. A África Ocidental, ocupada por narcoestados,
passou a ser a nova fronteira a ser atingida pelos traficantes brasileiros. Mas
o Brasil virou, também, como previam os mafiosos italianos no final dos anos
80, um próspero mercado para o consumo de entorpecentes.
Segundo a pesquisa divulgada pela Revista Veja (na edição citada no início
deste artigo), o Brasil tem 2 milhões de viciados em cocaína, 1 milhão de
viciados em crack e 1,5 milhão de dependentes da maconha. Esses consumidores
regulares de tóxicos garantem ao PCC um lucro que, como frisei anteriormente,
chega hoje aos 20,3 bilhões de reais por ano. Vai ser difícil nos desfazermos
dessa indústria da morte, hoje plenamente estabelecida e que funciona pelo país
afora, dinamizada pela enorme e abandonada população carcerária (que já chega a
550.000 indivíduos) dominada na sua maior parte pelo PCC. Um verdadeiro
exército da morte, que espalha assassinatos nos presídios e em todos os cantos
do Brasil! Mais uma herança perversa do populismo brasileiro.
Abre-se, pois, nova frente para desmontarmos o descaso
aberto no país pelo populismo. Mas é melhor agirmos enquanto é tempo. O PCC já
mostrou que tem bala na agulha.
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