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quinta-feira, 24 de março de 2016

AS GUERRAS DO TERRORISMO NA EUROPA E NA AMÉRICA LATINA

Logotipo da solidariedade francesa para com a Bélgica, após os atentados de Bruxelas.

Pablo Escobar e os restos do Boeing da empresa Avianca derrubado por ordem do capo, no início dos anos 90, nos arredores de Bogotá. 

O continente europeu está em guerra. Não adianta adotar a posição politicamente correta de alguns, de que chamar o que está acontecendo na Europa de guerra é dar força aos terroristas. É bobagem do emcimadomurismo internacional. Trata-se, claro, de um conflito sui generis, como os que eclodem no século 21. Guerra declarada? – Sim, a julgar pelos comunicados do Estado Islâmico. Guerra diferente das outras, travadas pela OTAN no final do século 20 no Médio Oriente e nos Balcãs?  Também. Porque esta guerra ataca em casa.

Os primeiros alvos foram objetivos militares, representados por policiais e forças de segurança assassinados nas ruas na calada da noite, praças vazias e outros lugares ermos. Os segundos alvos, após os atentados ocorridos em Paris ao longo do ano passado e no decorrer deste ano, foram espaços abertos e de transporte de massa, onde se encontra a população civil para viajar, se divertir, ir para o trabalho, passear com a família. A guerra agora foi declarada contra o cidadão médio. Os atentados de Bruxelas têm esse selo: trata-se de ferir o homem comum, a fim de disseminar o terror, de forma mais eficaz, no seio da sociedade. Isso já se anunciava nos ataques de Al Qaeda de Londres e Madri, há vários anos atrás. Mas essa modalidade de terror ganhou atualidade com a ofensiva dos radicais do Estado Islâmico contra a população civil das cidades europeias, utilizando tecnologia de mídia de ponta, difícil de ser seguida pela polícia e pelos vários grupos de segurança das comunicações.

Os Estados Unidos, após o fatídico 11 de Setembro de 2001, conseguiram reagir à altura, criando uma rede eficaz de segurança interna, que tem impedido a realização desses atentados em solo americano. O imperativo da preservação do bem comum exigiu restrições aos direitos individuais de ir e vir. Também se preveniram contra esse mal governos como o israelense, que sempre atualiza as suas políticas de segurança contra o terror.

Mas não ocorre o mesmo com os países europeus, que derrubaram barreiras entre eles e baixaram a guarda. Moral da história: estão desarmados em face dos reptos estratégicos do século 21, representados por duas séries de eventos: o terror islâmico, de um lado, e, de outro, as ondas migratórias multitudinárias que se abatem sobre a Europa, como outrora, nos estertores do Império Romano e no ciclo medieval, ao ensejo das ondas de populações bárbaras empurradas de dentro da Ásia Central por seculares déspotas como Gengis Khan e outros. Esses são os reptos aos que os europeus devem fazer frente hoje em dia, que se somam ao desgaste sofrido pelo modelo de welfare state, que tem produzido tantas dores de cabeça aos governantes da Europa Ocidental, ao longo dos últimos quinze anos.

No quadrante latino-americano do cenário mundial, as condições vividas pelos diversos países ao longo do final do século 20 e começos do 21, ao ensejo da guerra suja das drogas, assemelham-se às que a Europa Ocidental sofre hoje com o terrorismo islâmico. A brutalidade do terror democratizou-se de forma inexorável e paradoxal.

O colunista do diário Observador de Lisboa, João Marques de Almeida, escreveu recentemente (“Minha querida Bruxelas”, 23/03/2016) um texto que poderia ter sido redigido, também, por um colombiano durante a guerra dos cartéis das drogas na época de Pablo Escobar, nos anos noventa do século passado, ou por um mexicano afetado pela guerra que os vários cartéis de traficantes movem contra o Estado mexicano nos dias atuais: “Não sei se é uma guerra, nem tenho um bom nome para lhe dar. Mas sei que a nossa vida mudou. Rotinas simples como apanhar o metro para ir trabalhar pode significar o fim, a morte. Obviamente, não vamos mudar a nossa vida. Seria conceder uma vitória aos terroristas (...). A vida é mais insegura, nossas famílias e amigos (e todos nós) viverão mais preocupados. Mas não podemos alterar os nossos hábitos (...). Estamos a assistir à banalização (no sentido em que Arendt usou o termo) de ataques terroristas (...). Inevitavelmente, isto fará de nós menos tolerantes. As nossas sociedades serão mais nacionalistas e mais fechadas (...)”.

Matéria publicada pelo jornal Folha de São Paulo (“América Latina: holocausto movido pela cocaína”, 19/03/2016 e reproduzido pelo ex-blog do César Maia) noticiava que o jornalista britânico Ioan Grillo, radicado no México e autor de El Narco, em artigo recente intitulado: “Gangster Warlords” se perguntava o seguinte: “Por que as Américas se encontram afundadas em sangue no amanhecer do século 21?” Grillo pesquisou vários grupos de narcoguerrilheiros atuantes na região: Mara Salvatrucha (El Salvador, Guatemala e Honduras), Shower Posse (Jamaica), Comando Vermelho (Brasil) e Cavaleiros Templários (México). O jornalista destaca que, desde o início do século até 2010, esses grupos armados mataram mais de um milhão de pessoas. Levando em consideração que as cifras dos mortos nessa guerra só aumentam, o autor conclui que a América Latina vive um particular Holocausto movido pela cocaína. O autor considera que por trás de todas essas vítimas esconde-se um enorme empreendimento econômico: os narcotraficantes fazem circular na região um lucrativo montante de 300 bilhões de dólares anuais.

No nosso país é claro que a violência disparou ao ensejo da explosão de consumo de crack, presente hoje em 97% dos municípios brasileiros, tudo isso potencializado pela “colaboração” do “companheiro” Morales na Bolívia, que aumentou assustadoramente a exportação de pasta base de coca para o Brasil ao longo dos governos petistas. Os nossos cartéis das drogas são diversificados e poderosos, sendo os dois mais destacados o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital, que controlam boa parte dos presídios brasileiros. Os cartéis caboclos já desataram há anos a “guerra suja” contra as forças de segurança, pagando recompensas pelo assassinato de policiais, que se tornou corriqueiro no Rio e em São Paulo. Abriram também a caixa de pandora do terrorismo indiscriminado contra a população civil, com o incêndio de ônibus lotados de passageiros apavorados. Pablo Escobar, lembremos, chegou a derrubar um Boeing cheio de passageiros, nos arredores de Bogotá. Isso o jornalista britânico não leva em consideração. Como tampouco o fato da participação, na guerra das drogas, de grupos paramilitares dos governos “bolivarianos” de Chávez e Maduro na Venezuela, que transformaram o vizinho país num virtual narcoestado, ao serem as elites políticas irrigadas pelos lucros da exportação de narcóticos.

O jornalista britânico tampouco leva em consideração que as FARC, na Colômbia, viraram cartel de drogas após a derrubada do Muro de Berlim, no final do século passado. Como se tratava de guerrilheiros de esquerda, os governos petistas recusaram-se sempre a catalogar as FARC como grupo terrorista. Afinal de contas, tratava-se de “companheiros” que lutavam pela instauração do comunismo apregoado pelo Foro de São Paulo. Alguns deles refugiaram-se no Brasil, tendo sido muito bem recebidos pelo governo.

Concluindo: tanto na Europa quanto na América Latina estão em curso respectivas guerras contra o terrorismo, com inúmeras vítimas entrando nessa ciranda da morte, sendo que no nosso continente esse número é infinitamente maior do na Europa. Que o digam os 60 mil assassinatos ocorridos anualmente no Brasil em decorrência, em grande medida, da violência desatada pelos cartéis das drogas que se assenhorearam das cidades nordestinas e do norte, na Amazônia, por onde hoje são exportadas para os narcoestados da África Ocidental as drogas que os traficantes processam. Com uma legislação antiterrorista fraca que poupa os denominados “movimentos sociais” em caso de terrorismo, estamos mal preparados para fazer frente ao desafio terrorista, num momento delicado ao ensejo da realização de eventos internacionais massivos (como as Olimpíadas do Rio, em meados deste ano).

Certamente, os cidadãos europeus e latino-americanos vivem hoje sob o constante medo de atos terroristas, como os que acabam de ser cometidos em Bruxelas. O terrorismo se tornou democrático, abarcando igualmente países desenvolvidos ou em desenvolvimento.


 

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