O Professor Wanderley-Guilherme dos Santos (1935-2019). (Foto: skoob.com.br) |
Faleceu recentemente, em 26 de outubro de 2019, no Rio de Janeiro, o cientista político Wanderley-Guilherme dos Santos. Nasceu no Rio de Janeiro em 1935, tendo concluído o curso de Filosofia nos anos 50. Dedicou-se ao magistério universitário na antiga Faculdade Nacional de Filosofia, tendo se especializado na História da Filosofia. A agitação que tomou conta do país nas áreas política e cultural, levou-o a se interessar pelo estudo da problemática política brasileira. Com o advento do regime militar, viajou aos Estados Unidos, onde se doutorou em Ciência Política na Universidade de Stanford, tendo terminado os seus estudos em 1979.
Tornou-se um dos mais importantes cientistas políticos do Brasil, tendo-se dedicado à pesquisa e à docência no Instituto Universitário de Pesquisas da Universidade Cândido Mendes (IUPERJ), no Rio de Janeiro. Lecionou, também, em outros centros de ensino superior, como a Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde se tornou titular de Ciência Política, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, tendo-se aposentado nesse cargo. Implantou e dirigiu o Laboratório de Estudos Experimentais (LEEX) da Universidade Cândido Mendes, onde também desempenhou o cargo de Pro-Reitor Acadêmico.
A sua produção intelectual, na seara da especialidade da Ciência Política, constitui um patrimônio bastante significativo. Estudou com afinco o fenômeno do autoritarismo no seio da sociedade brasileira, sendo da sua lavra a tipologia sociológica do "autoritarismo instrumental", para caracterizar os ciclos modernizadores do Estado brasileiro, fruto da insuficiente modernização da nossa sociedade, que ancorou em modelos de dirigismo paternalista.
A respeito da modernização, considerava que ela tinha, no nosso meio, uma característica mitigada, que alcunhou de "autoritarismo instrumental", uma de cujas manifestações, no regime militar, foi o famoso adágio do general-presidente João Batista Figueiredo: "Juro fazer deste país uma democracia, e prendo e arrebento quem se opuser".
Tive a satisfação e o orgulho de contar com o professor Wanderley-Guilherme, como um dos examinadores da minha tese de doutoramento em Pensamento Luso-brasileiro na Universidade Gama Filho em 1982, que versou sobre o tema: "Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro". No meu estudo, aproximei-me da obra do sociólogo fluminense Francisco José de Oliveira Vianna (1883-1951), a fim de aprofundar no sentido da modernização dirigista por ele proposta e que inspirou a ação de Getúlio Vargas (1882-1954) na sua volta ao poder no período 1951-1954.
Em 2007, o professor Wanderley-Guilherme foi nomeado pelo presidente Lula como membro do Conselho Curador da Rede Pública TV Brasil. Desempenhou as funções de Presidente da Fundação Casa Rui Barbosa no período compreendido entre 2011 e 2013.
Wanderley-Guilherme recebeu, ao longo de sua vida acadêmica, os seguintes reconhecimentos: Medalha Minerva (2004), Prêmio Literário na categoria Ensaio e História Literária, da academia Brasileira de Letras (2004), Prêmio Victor Nunes Leal de Ciência Política.
Quando do seu falecimento, a Associação Nacional de Ciência Política publicou a seguinte nota: "Wanderley-Guilherme foi um dos principais responsáveis pela introdução da pós-graduação em Ciência Política no Brasil e é considerado, por muitos, como o maior cientista político do Brasil".
Por sua vez, Míriam Pillar Grossi, presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Ciências Sociais, lembrou que Wanderley-Guilherme foi um dos fundadores e um dos primeiros presidentes da ANPOCS, tendo participado diuturnamente das atividades da mesma, ao longo dos seus 43 anos de existência. Frisou: "Há duas semanas, na comemoração dos 50 anos do IESP, o professor Wanderley-Guilherme fez a conferência final do evento. Pronunciou uma conferência brilhante e superatual, na sua reflexão sobre a produção de conhecimento no Brasil. Lotou o auditório. Vi, ali, o carinho que os ex-alunos do professor Wanderley-Guilherme têm por ele. A forma como eles reverenciaram o professor Wanderley, naquele dia, me emocionou muito".
Bibliografia de Wanderley-Guilherme dos Santos
Quem dará o golpe no Brasil? Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1962, 98 p. (Cadernos do Povo Brasileiro, 15).
Introdução ao estudo das contradições sociais no Brasil. Rio de Janeiro: ISEB, 1963, 122 p.
Reforma contra reforma. Rio de Janeiro: Tempo /Brasileiro, 1963, 90 p. ( Coleção Brasil Hoje, 3).
Dialética e ciências sociais. Rio de Janeiro: Zahar, 1967, 150 p. (Textos Básicos de Ciências Sociais).
Ordem burguesa e liberalismo político. São Paulo: Duas Cidades, 1978, 172 p. (Coleção História e Sociedade).
Poder e política: crônica do autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1978, 211 p.
Cidadania e justiça: a política social na ordem brasileira. Rio de Janeiro: Campus, 1979, 138 p. (Contribuição em Ciências Sociais, 1).
O limite do laissez-faire e os princípios do governo. Rio de Janeiro: IUPERJ, 1983, 66 p. (Série Estudos, 14).
O século de Michels: competição oligopólica, lógica autoritária e transição na América Latina. Rio de Janeiro, 1984, 61 p.
Kantianas brasileiras: a dual-ética da razão política nacional. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984, 93 p. (Coleção Estudos Brasileiros, 72).
Modelos endógenos de decadência liberal. Rio de Janeiro: IUPERJ, 1984, 54 p. (Série Estudos, 21).
Sessenta e quatro: anatomia da crise. São Paulo: Vértice, 1986, 195 p.
Crise e castigo: partidos e generais na política brasileira. São Paulo: Vértice; Rio de Janeiro: IUPERJ, 1987, 208 p. (Grande Brasil Veredas, 5).
Política social e combate à pobreza. Rio de Janeiro: Zahar, 1987, 126 p.
Paradoxos do Liberalismo: teoria e história. São Paulo: Vértice; Rio de Janeiro: IUPERJ, 1988, 160 p. (Grande Brasil Veredas, 6).
Discurso sobre o objeto: uma poética do social. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
Que Brasil é este? - Manual de indicadores políticos e sociais. São Paulo: Vértice, 1990, 261 p.
Dois escritos democráticos de José de Alencar: Sistema representativo, 1868. Reforma eleitoral, 1874. Rio de Janeiro: Editora da UFRJ, 1991, 122 p.
Razões da desordem. Rio de Janeiro: Rocco, 1993, 148 p.
Regresso, máscaras institucionais do liberalismo oligárquico. Rio de Janeiro: Ópera Nostra, 1994, 86 p.
Décadas de espanto e uma apologia democrática. Rio de Janeiro: Rocco, 1998, 192 p.
Estudos sobre o Autor:
ABRANCHES, Sérgio. "As origens do estatismo". Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 24/04/1993.
BARRETTO, Vicente. "O Brasil entre o cinismo e o civismo". O Globo, Rio de Janeiro,30/05/1993.
CORRÊA, Marcos Sá. "Plebiscito sem causa". Veja, São Paulo, 28/04/1993, p. 7-9 (entrevista).
GASPARI Elio."Uma cabeça que bate contra a maré". Veja, São Paulo, 18/05/1994, p. 40-43.
MACEDO, Ubiratan. Os caminhos da democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Universidade Gama Filho, 1984 (tese de doutorado).
NEVES, Luiz Felipe Baêta. "Um douto tratado da ignorância"; Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14/07/1990.
PAIM, Antônio. A querela do estatismo. 2ª Edição. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994.
PAIM, Antônio. "SANTOS, Wanderley-Guilherme dos". In: Dicionário biobibliográfico de autores brasileiros. Brasília: Senado Federal. Salvador - Bahia: Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro, 1999, p. 437-439.
PAIM, Antônio. História das ideias filosóficas no Brasil. 5ª edição. Londrina: Editora da UEL, 1997.
VÉLEZ Rodríguez, Ricardo. Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro. Londrina: Editora da UEL, 1997, p. 49-64.
VÉLEZ Rodríguez, Ricardo. Pensamento político brasileiro contemporâneo. Rio de Janeiro: Editora Clube da Aeronáutica, 2012, p. 10-15.
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