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domingo, 18 de maio de 2014

DESTINOS CONTRÁRIOS DA AMÉRICA LATINA: ENTRE A GLOBALIZAÇÃO LIBERAL E O NEOPOPULISMO BOLIVARIANO

Este trabalho foi publicado pela Revista da Fundação Liberdade e Cidadania - Democratas na edição de Abril-Maio de 2014, com o título Neopopulismo na América Latina - Anorexia institucional.

Fazer um balanço dos caminhos da América Latina no meio a esta segunda década do século XXI não é tarefa simples. O cenário internacional complicou-se sobremaneira, em decorrência da multiplicação dos centros de poder que se seguiu à guerra contra o terror iniciada pelos Estados Unidos, após os acontecimentos de 11 de Setembro de 2001. Na desarrumação universal do cenário internacional, as variáveis se multiplicam. Mas tentarei elaborar uma síntese do cenário latino-americano, tendo como ponto de vista a dupla realidade que, nos últimos anos, tem-se apresentado como opção para os países desta área do mundo: o fenômeno do Neopopulismo Bolivariano (no seio do MERCOSUL) e a Aliança do Pacífico. 

Estas duas opções terão como pano de fundo uma realidade sociológica: o Estado patrimonial que vingou na formação histórica dos herdeiros dos velhos Impérios espanhol e português. Analisarei a perspectiva dos países, tentando mostrar que aqueles que se aproximam do eixo bolivariano, fazem-no fortalecendo a tendência a confundir público com privado e a gerir o Estado como se constituísse um bem patrimonial. Contrariamente, os países que se aproximam da área do Pacífico, com o pacto que tem sido assinado pelo Chile, o Peru, a Colômbia e o México, tendem a reagir contra a tradição do patrimonialismo, dando um impulso modernizador às velhas estruturas herdadas de séculos de paternalismo ibérico.

Analisarei essa complexa realidade, tendo como farol que me guia nesta empreitada, a defesa da liberdade, que considero o norte civilizado que pode nos remir do torpor da saga contrarreformista e de atraso em que nos mantivemos ao longo dos séculos. Farei a minha análise com os olhos postos na defesa da liberdade, nos cinco aspectos que lhe são essenciais, segundo a análise que Constant fazia das perspectivas francesas em 1810, na sua obra Princípios de Política [1]: a liberdade pessoal, a liberdade religiosa, a liberdade de opinião, o gozo da propriedade e a garantia contra o arbítrio. Ora, a minha posição é clara: um país – ou um conjunto de países – será tanto mais civilizado quanto mais se aproximar dessa quíntupla benfazeja realidade que garante o exercício da liberdade.

Não é difícil prever que a minha hipótese é a seguinte: enquanto a área dos países bolivarianos se distancia da busca da liberdade sob esse quíntuplo aspecto, a área conhecida como países da Aliança do Pacífico se aproxima desse ideal. Dividirei a minha exposição em duas grandes partes, uma dedicada aos países latino-americanos da Aliança do Pacífico, outra centrada nos países do MERCOSUL que giram ao redor do eixo do Neopopulismo Bolivariano.

I – Os países da Aliança do Pacífico: Chile, Peru, Colômbia e México.

Estes países construíram, ao longo dos últimos dez anos, um círculo virtuoso: sanearam as suas economias, mantiveram taxas sustentadas de crescimento, diminuíram sensivelmente o desemprego, melhoraram os parâmetros sociais notadamente nos itens educação, segurança, transporte público e saneamento, e colocaram as suas empresas no circuito do mercado mundial, mediante tratados de livre comércio com vários países, inclusive com os Estados Unidos e a União Europeia.

Paralelamente, as instituições republicanas foram fortalecidas mediante a valorização da representação política, o controle do gasto público e a maior participação da sociedade na gestão do Estado. Foi concretizada, de outro lado, em todos eles, uma sensível modernização das Forças Armadas e da Polícia, fator que foi decisivo para controlar os grupos armados, notadamente na Colômbia e no Peru. O fator negativo ficou por conta do avanço do narcotráfico no México, que tem ameaçado seriamente a sociedade civil, tanto na fronteira com os Estados Unidos como na região centro-americana.

A Aliança do Pacífico constituiu, desde o início, um bloco comercial. Na Declaração de Lima, assinada em 28 de Abril de 2011, foi anunciada a existência do mencionado bloco. A iniciativa originalmente partiu do ex-presidente peruano Alan García Pérez. A finalidade que foi atribuída à Aliança consistiu em “aprofundar a integração entre estas economias e definir ações conjuntas para a vinculação comercial com Ásia Pacífico, sobre a base dos acordos comerciais bilaterais existentes entre os Estados que formam parte da Aliança”. [2]

A República de Panamá também foi convidada a participar e se vinculou na qualidade de membro observador. Ainda na Declaração de Lima eram definidos estes objetivos complementares: “Estimular a integração regional, bem como um maior crescimento, desenvolvimento e competitividade” das economias dos países participantes da Aliança, e “avançar progressivamente em direção ao objetivo de atingir a livre circulação de bens, serviços, capitais e pessoas”.

Referindo-se à potencialidade econômica dos países latino-americanos que se integraram na Aliança, o presidente peruano Alan García, ao assinar o documento oficial, frisou que “(...) Os nossos quatro países e, no futuro, Panamá, representamos 200 milhões de habitantes (...). Os nossos países são responsáveis por 55% das exportações latino-americanas (...). Esta não é uma integração romântica, uma integração poética, trata-se de uma integração realista diante do mundo e em direção ao mundo”. Três requisitos foram assinalados como itens essenciais para participar da Aliança: a vigência do Estado de Direito, bem como da democracia e da ordem constitucional.

Deve-se destacar que os quatro países que integram a Aliança do Pacífico representam aproximadamente 40% do Produto Interno Bruto da América Latina. Se os membros da Aliança constituíssem um único país, este ocuparia o sexto lugar na economia mundial. Dois países da Aliança, Chile e México, já formam parte da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, com sede em Paris), enquanto que a Colômbia já solicitou formalmente o seu ingresso nesta organização. Segundo dados da Organização Mundial do Comércio, os países que integram a Aliança do Pacífico, em conjunto, exportaram em 2010 aproximadamente 445 bilhões de dólares, soma equivalente a quase 60% a mais do que as exportações do MERCOSUL, no mesmo período.

Depois da Declaração de Lima, de 2011, foram realizadas várias reuniões entre os governos dos países membros, com a finalidade de chegar a um consenso acerca dos objetivos e exigências para organizar a Aliança. O texto do acordo básico que dá vida à Aliança, destacando os seus objetivos, foi aprovado na terceira cimeira dos presidentes, realizada por videoconferência, em 5 de março de 2012. Os chefes de Estado concluíram a negociação de Acordo Marco da Aliança (que constituiu o documento fundador da entidade), em 6 de Junho de 2012, na cimeira realizada no norte do Chile, no Monte Paranal, localidade situada no Deserto de Atacama. O documento fundacional foi assinado pelos presidentes Sebastián Piñera (do Chile), Juan Manuel Santos (da Colômbia), Felipe Calderón (do México) e Ollanta Humala (do Peru).

O primeiro passo concreto no funcionamento da Aliança foi constituído pela eliminação de vistos entre Chile, Colômbia, México e Peru, medida que entrou em vigor em 1º de Novembro de 2012. A Secretaria de Relações Exteriores (SER) do México, por sua vez, anunciou a eliminação de vistos para cidadãos colombianos e peruanos, em 9 de Novembro de 2012, sendo que os cidadãos chilenos já estavam isentos desse requisito. De outro lado, já está funcionando o Mercado Integrado Latino-americano (MILA) formado pelo Chile, Colômbia e Peru. O México finaliza os trâmites necessários para a sua participação no MILA.

Na VII cimeira da Aliança do Pacífico, que teve lugar na cidade de Cali (Colômbia), os países integrantes da Aliança acordaram a criação de um fundo de cooperação de um milhão de dólares (tendo sido aportada, por cada país, a importância de 250 mil dólares), com a finalidade de estimular a criação de novos mercados no interior das economias dos países signatários da Aliança.

Outro passo importante rumo à plena integração econômica dos países da Aliança e a sua projeção na economia mundial, foi constituído pela decisão de criar embaixadas e consulados comuns. Assim, foi criada a embaixada comum de Chile, Colômbia, México e Peru em Ghana, na África. Foi assinado também um acordo entre Chile e Colômbia, com a finalidade de compartir embaixadas comuns na Argélia e no Marrocos. Documento semelhante foi assinado entre a Colômbia e o Peru, com a finalidade de compartir uma embaixada no Vietnam. Na Declaração de Cali são exortados os países membros da Aliança a continuar avançando nesse tipo de iniciativas.

Quanto aos mecanismos políticos de integração, na reunião dos presidentes dos Congressos do Chile, Colômbia, México e Peru, foi dado o primeiro passo para a criação de um Parlamento da Aliança do Pacífico. Foi prevista a configuração desse corpo colegiado com 10 representantes de cada um dos Congressos dos países membros. O marco legal para a criação desse parlamento colegiado foi assinado em 6 de Junho de 2012 em Antofagasta, Chile.

Ainda no contexto desta iniciativa parlamentar, foi criada, por representantes dos quatro Congressos dos países membros, em Santiago-Chile, em 11 de Julho de 2013, a Comissão de Acompanhamento Parlamentar da Aliança do Pacífico, com a presença de uma delegação observadora do governo espanhol. Foi nomeado coordenador da mencionada Comissão o ex-presidente chileno Eduardo Frei Ruiz-Tagle. A finalidade da Comissão consiste, segundo o coordenador, em transformar em leis os acordos dos governos da Aliança, com a finalidade de que a integração não se restrinja aos aspectos econômicos, mas abarque, também, os aspectos culturais e políticos.

Passos importantes para a configuração do Mercado Integrado Latino-americano (MILA) tem sido dados. Colômbia, Chile e Peru passaram a operar, de forma integrada, através das respectivas Bolsas de Valores, a partir de Novembro de 2010. Esse esforço tem dado lugar ao maior mercado de valores da América Latina no que tange ao número de emissões, ao segundo mercado em capitalização e ao terceiro em volume de negócios. A Bolsa Mexicana de Valores, por sua vez, adquiriu um total de 3.79 milhões de ações da Bolsa de Valores de Lima (BVL), equivalente a 6.7% dos títulos da Série A desse mercado. Espera-se, para este ano de 2014, a plena integração da Bolsa Mexicana de Valores (BMV).

Do ponto de vista brasileiro, a imprensa tem destacado o impressionante potencial da Aliança do Pacífico em face da realidade do MERCOSUL. Editorial do jornal O Estado de São Paulo frisava recentemente: “(...) Considerando-se que essa aliança existe formalmente há menos de dois anos, os progressos são impressionantes - ainda mais se comparados à letargia do MERCOSUL, cujos projetos de integração se arrastam há mais de duas décadas. Em poucas palavras, a diferença entre um e outro está na visão de mundo: enquanto os países do Pacífico apostam no livre mercado, os parceiros do MERCOSUL dão cada vez mais ênfase ao estatismo - uma doença que empobrece países importantes, como Argentina e Venezuela - e à ideologia, que, em nome de um suposto resgate dos pobres e dos oprimidos, repele investidores, criminaliza o lucro e condena a região ao atraso crônico. A intenção da Aliança do Pacífico não é modesta: pretende ser o principal polo de atração de investimentos na América Latina e quer ser a ponte para uma eventual integração com a Ásia. - China, Coreia do Sul e Japão já são observadores do bloco. A aliança reúne hoje 212 milhões de habitantes, e seu Produto Interno Bruto (PIB) somado representa 36% do PIB latino-americano. Vários países da América Central, como Costa Rica e Panamá, já manifestaram interesse em aderir, para não perder a chance de integrar um projeto que tem sido visto no resto do mundo como a mais importante iniciativa de comércio internacional no continente (...). O MERCOSUL, por sua vez, está cada vez mais atado ao bolivarianismo, que hostiliza os investimentos estrangeiros, ergue barreiras comerciais e reluta em relacionar-se com os europeus e, principalmente, com os americanos. A presença da Venezuela na presidência do bloco diz tudo sobre a prevalência da fantasia sobre a razão no MERCOSUL. Como resultado, seus membros aparecem entre os últimos colocados no ranking do Banco Mundial que analisa o ambiente de negócios na América Latina. O Uruguai é o 12.º entre os 33 países analisados, seguido do Brasil (23.º), da Argentina (26.º) e da Venezuela - a lanterninha. Os da Aliança do Pacífico ocupam quatro das cinco primeiras posições (...)”.[3]

A atividade conjunta dos países que integram a Aliança do Pacífico deu ensejo a oito reuniões cimeiras. Resumirei brevemente a agenda de cada uma delas:

A primeira, celebrada em Lima, em 28 de Abril de 2011, teve como ponto central o convite do presidente peruano, Alan García, feito aos presidentes da Colômbia (Juan Manuel Santos), do Chile (Sebastián Piñera) e do México (Felipe Calderón), para criarem a Aliança. Participou como membro observador o ministro panamenho para Assuntos do Canal, Rómulo Roux.

A segunda reunião cimeira da Aliança teve lugar no dia 4 de Dezembro de 2011 na cidade de Mérida (Yucatán – México), com a presença dos presidentes dos quatro países integrantes e também do presidente da República de Panamá. Foram reconhecidos os avanços no processo de integração, no terreno de acordos relativos à preservação do meio ambiente, ao desenvolvimento científico e tecnológico, ao intercâmbio empresarial e econômico (no que tange às questões da interconexão elétrica e energética) e à mobilidade das pessoas. Acordou-se criar um sistema de bolsas para melhorar a integração educacional entre os países membros. Os países membros comprometeram-se a assinar um Tratado Fundacional da Aliança nos seis meses seguintes a esta cimeira.

A terceira cimeira da Aliança foi realizada de forma virtual no dia 5 de Março de 2012 e teve a participação dos presidentes dos quatro países membros, bem como dos presidentes de Panamá (na qualidade de observador) e da Costa Rica (como convidado especial). Este país passou a formar parte da Aliança como observador. Tanto Panamá quanto Costa Rica comprometeram-se a agilizar os tratados de livre comércio com os países membros da Aliança, a fim de se tornarem membros plenos.

A quarta cimeira realizou-se na cidade de Antofagasta, Chile, no Observatório Astronómico de Paranal, no dia 6 de Junho de 2012. Participaram os presidentes dos quatro países membros, bem como representantes das chancelarias do Panamá e Costa Rica. Participaram, na qualidade de convidados especiais, o ministro das relações exteriores do Canadá, John Baird, bem como a embaixadora da Austrália na Colômbia e no Chile, Virgínia Greville, e o embaixador do Japão no Chile, Hidemori Murakami. Os presidentes dos países membros assinaram o Acordo Marco da Aliança do Pacífico. Foi definida a presidência pro-tempore da Aliança e foram fixadas as condições para a adesão de novos membros. Foram sublinhados os avanços dos países membros no terreno do intercâmbio comercial. Foi destacada, também, a futura vinculação da Bolsa Mexicana de Valores (BMV) e foi aprovada a colaboração do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e da Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Foi aprovada, igualmente, a eliminação de vistos para o ingresso de cidadãos da Colômbia e do Peru no México.

A quinta cimeira teve lugar na cidade de Cádiz (Espanha), em Novembro de 2012. Foi aprovada a participação (como membros observadores), dos seguintes países: Espanha, Austrália, Canadá, Nova Zelândia e Uruguai. Os presidentes dos países membros ratificaram a decisão de criar uma união econômica muito mais forte com a eliminação das tarifas aduaneiras em mais de 90% dos produtos.

A sexta cimeira foi realizada em Santiago de Chile, no dia 27 de Janeiro de 2013. Assistiram à reunião vários mandatários da América Latina e da Europa que participavam, em Santiago, da reunião da CELAC-EU. O presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy, destacou o interesse suscitado pela Aliança entre os países europeus, com as seguintes palavras: “As relações de integração no seio da Aliança do Pacífico vão reforçar a posição deste grupo nos planos regional e internacional, o que os torna atores ainda mais atraentes para os países europeus”.

A sétima cimeira da Aliança do Pacífico teve lugar na cidade colombiana de Cali, de 20 a 24 de Maio de 2013. Participaram os presidentes dos países membros da Aliança, Enrique Peña Nieto (México), Sebastián Piñera (Chile), Ollanta Humala (Peru) e Juan Manuel Santos (Colômbia). Como observadores assistiram Stephen Harper (primeiro ministro do Canadá), Mariano Rajoy (presidente do governo espanhol), Laura Chinchilla Miranda (presidente da Costa Rica), Ricardo Martinelli Berrocal (presidente do Panamá), Otto Pérez Molina (presidente da Guatemala) e delegações ministeriais de Uruguai, Austrália, Japão, Portugal, Nova Zelândia e República Dominicana, além de 300 presidentes de companhias de vários países. Foi aprovada a participação permanente, como países observadores, do Equador, El Salvador, França, Honduras, Paraguai, Portugal e República Dominicana. Foi aprovada a criação de um visto com a bandeira da Aliança do Pacífico, a fim de incrementar o turismo na região. A Costa Rica iniciou o seu processo de adesão à Aliança. Foi aprovada a criação de um fundo de cooperação de um milhão de dólares.

A oitava cimeira da Aliança realizou-se na cidade colombiana de Cartagena de Índias entre 8 e 10 de Fevereiro de 2014, com a participação dos quatro presidentes dos países membros e da presidente da Costa Rica, Laura Chinchilla. Foi assinado o protocolo que prevê a extinção de tarifas aduaneiras de 92% dos produtos. No caso da produção agrícola, a extinção das mencionadas tarifas foi prevista para ser realizada ao longo dos próximos 17 anos, com a finalidade de não criar problemas de abastecimento nas regiões contempladas. Passaram a formar parte da Aliança, como observadores, os seguintes países: Finlândia, Índia, Israel, Marrocos e Singapura. Colômbia e Chile decidiram criar uma embaixada conjunta no Azerbaijão, bem como perante a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), com sede em Paris. Os presidentes da Colômbia e da Costa Rica assinaram o documento que oficializa a entrada deste país na Aliança do Pacífico, uma vez tenha sido concretizado o Tratado de Livre Comércio com o México e com a Colômbia.

Terminemos esta exposição destacando o que os mandatários dos países membros esperam da Aliança do Pacífico. O presidente colombiano, Juan Manuel Santos, frisou na cimeira de Antofagasta, em Junho de 2012: “Gostaria de destacar a rapidez e a facilidade com que criamos este processo de integração, que eu não duvidaria em assinalar como o processo de integração mais importante da América Latina. (...) Os prognósticos da economia mundial para este ano (2012) é que o crescimento será, no mundo, próximo de 3,5 por cento. América Latina, de acordo com os cálculos do Fundo Monetário Internacional vai crescer 3,7, em média, ou seja, por cima da média mundial. Mas estes quatro países vão ter um crescimento muito maior, de 4,5 por cento. Isso os torna especialmente atrativos para um dos objetivos fundamentais, que consiste em atrair inversão para gerar mais empregos, para criar mais prosperidade nas nossas sociedades. Estamos observando que constituímos o grupo de países que mais cresce (...)”.

O presidente do México, Felipe Calderón Hinojosa frisou, em visita a Singapura, em Dezembro de 2012, que a Aliança do Pacífico tem estimulado alguns países da América Latina a impulsionar as suas economias e que a economia mexicana avança por bom caminho. “(...) Na América Latina criamos a Aliança do Pacífico entre México, Colômbia, Peru e Chile e convidamos outros jogadores. A Aliança do Pacífico conta com maior crescimento econômico, mais exportações e maior comércio do que a iniciativa do MERCOSUL”.

No decorrer da IV cimeira da Aliança do Pacífico, Sebastián Piñera, presidente do Chile, destacou, em Junho de 2012, que a Aliança é “muito mais do que um acordo de livre comércio, é um acordo de integração profunda e ampla que abarca o intercâmbio de bens, serviços, inversões, pessoas (...)”.  Ollanta Humala, presidente do Peru, nessa mesma oportunidade frisou: “Creio, também, que este é um espaço de não enfrentamento, nem ideológico, é um espaço aberto que não procura ser espaço de oposição a outros espaços de integração latino-americana. É, pelo contrário, um espaço que complementa e nos integra ainda mais (...)”.

II – Os países do MERCOSUL, influenciados pelo neopopulismo bolivariano: Venezuela, Argentina, Brasil, Bolívia, Paraguai (governo Lugo) e Uruguai.

O neopopulismo pode ser considerado como um sarampo que tomou conta do mundo nas duas últimas décadas do século passado e na primeira deste século, em várias regiões. Na Rússia apareceu este fenômeno, logo após a queda do Muro de Berlim, dando ensejo a uma revivescência da antiga tradição messiânica grã russa, que se perde nos confins da Idade Média com Ivã IV O Terrível (1530-1584) e que, nos dias de hoje, volta a assombrar o cenário internacional com Vladimir Putin e as suas aventuras expansionistas. [4]

Na América Latina, a tendência neopopulista apareceu vinculada à do messianismo político, de que se tornaram portadores líderes como o falecido presidente Hugo Chávez da Venezuela, o casal Kirchner na Argentina, Fernando Lugo no Paraguai, Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador. Isso para não mencionar a fonte de boa parte da ideologia que acompanhou este surto, a Cuba dos irmãos Castro. O neopopulismo latino-americano constitui a mais nova versão do velho patrimonialismo ibérico, com a sua tendência a gerir o Estado como bem de família, privatizando, em benefício de uma burocracia corrupta, o espaço público.

Lembremos os aspectos essenciais do neopopulismo. Para Taguieff, “o populismo, oscilando entre o autoritarismo e o hiper-democratismo, bem como entre o conservadorismo e o progressismo reformista – não poderia ser considerado nem como uma ideologia política, nem como um tipo de regime, mas como um estilo político, alicerçado no recurso sistemático à retórica de apelo ao povo e à posta em marcha de um modelo de legitimação de tipo carismático, o mais adequado para valorizar a mudança. É justamente porque se trata de um estilo, uma forma vazia preenchida do seu jeito por cada líder, que o populismo pode ser posto ao serviço de objetivos antidemocráticos, bem como de uma vontade de democratização” [5]

Alberto Oliva e Mário Guerreiro [6], fazem uma caracterização semelhante: “Longe de ser uma doutrina, o populismo é um modo de fazer política e de exercer o poder”. Esse caráter de estilo do populismo foi explicitado por Lula, quando foi indagado acerca das suas tendências ideológicas: “o senhor é comunista?” – perguntaram-lhe. Lula respondeu: “sou metalúrgico”.

O estilo político do neopopulismo se encarna na figura do salvador do povo, quando se juntam os aspectos da retórica fácil com os relativos à modalidade de legitimação que Max Weber [7] identificava como carismática. A respeito, frisa Taguieff [8]: “a combinação do populismo-retórico com o populismo-legitimação carismática encarna-se na figura do demagogo ou do tribuno do povo, personagem que é, ao mesmo tempo, expressão, guia e salvador do povo, e que se apresenta como homem providencial e realizador de milagres – ou de um porvir maravilhoso”. O povo, para o líder populista, é uma entidade mítica afinada misteriosamente com o seu carisma pessoal. Essa feição arcaica do populismo é assim destacada por Taguieff: [9] “É necessário não desconhecer a dimensão mitológica de todo populismo, que reside na tese, sempre pressuposta, de que o povo existe e de que ele é dotado de uma unidade que lhe confere a sua identidade (ou a unicidade de sua figura), em face das elites ou das potências ameaçadoras, ou contra elas”.

O líder populista trabalha somente para a sua causa pessoal e, para isso, elabora um discurso em que esta aparece identificada com a causa do povo, dando ensejo, assim, a uma deformação do princípio da soberania; ele é um demagogo cínico. A respeito da alteração que o princípio da soberania sofre nas mãos do líder populista, escreve Taguieff: [10] “O princípio democrático da soberania, isolado e privilegiado em relação aos princípios liberais da separação e limitação dos poderes, pode ser objeto de interpretações diversas e inspirar múltiplas práticas, para as quais ele serve de modo de legitimação. Nesse sentido, o populismo é definível como a demagogia da época democrática, ou como a forma mínima assumida pela demagogia, quando o povo é tratado como uma categoria que pertence ao domínio do sagrado e fazendo parte de um culto”.

O líder neopopulista apela para a vinculação direta entre ele e o povo, dispensadas mediações institucionais, como as que dizem relação ao governo representativo. É uma espécie de ação direta do líder carismático sobre as massas, em que, certamente, são utilizadas as novas tecnologias como a comunicação on line, via chats, blogs ou foros de debate. A propósito, escreve Taguieff: [11] “Enquanto que, nas democracias pluralistas instaladas e tranquilas, a política supõe mediações e contemporizações – sendo que os debates e as deliberações requerem tempo, bem como mediadores e lugares de mediação -, o imaginário antipolítico do populismo centra-se totalmente na rejeição das mediações, consideradas inúteis ou nocivas. Os líderes populistas propõem-se a derrubar a barreira ou a distância, ou seja, qualquer diferença entre governantes e governados, representantes e representados, ou bem sugerem que eles possuem o poder para abolir qualquer distância entre os desejos e a sua satisfação, de suspender este aspecto do princípio da realidade que é constituído pela inserção na duração, pelo respeito aos prazos, pela contemporização”. Trata-se, certamente, da irrupção pura e simples da magia na vida política. O líder-salvador tem o poder extraordinário de satisfazer instantaneamente os desejos das massas, só com a dinâmica onipotente de sua vontade, e sem que intermedeiem outras instâncias pessoais ou institucionais. 

Estilo eminentemente individual de relacionamento entre o líder carismático e o povo, o neopopulismo é, paradoxalmente, antipolítico, na medida em que rejeita qualquer institucionalização no exercício do poder; o líder populista aproxima-se, destarte, do ideal da anorexia institucional, com a finalidade de manter incólume a sua relação de prestígio pessoal em face do povo. García Márquez, [12] em O Outono do Patriarca, deixou clara esta característica, ao mostrar a despreocupação do líder – Juan Vicente Gómez, encarnado no Autocrata solitário – para com a estrutura do Estado, reduzido aos limites da sua casa.  Qualquer mediação que escape ao seu poder pessoal incomoda. Qualquer liderança que apague a sua presença deve ser banida. Características semelhantes encontrou Domingo Faustino Sarmiento no líder patrimonialista Facundo Quiroga, na Argentina da segunda metade do século XIX. Facundo gostava de exercer o poder, ou melhor, de influenciar sobre os que o desempenhavam em nome e em proveito dele. Era um preguiçoso crônico em termos de rotinas administrativas. [13]

O MERCOSUL, nos seus primórdios, representava uma instância de integração continental e um âmbito ampliado de liberdade para os cidadãos dos países que se acolheram à organização. Criado em 26 de Março de 1991 pelo Tratado de Assunção, assinado pelos presidentes da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, o Mercado Comum do Sul ampliou-se, passando a acolher os seguintes Estados Associados: Chile (1996), Bolívia (1996) Peru (2003) Equador (2004) e Colômbia (2004). Foram incluídos, na qualidade de Estados Observadores, os seguintes países: México e Nova Zelândia (2010). Em 31 de Julho de 2012 foi incluída como Membro Pleno a Venezuela, sendo que o Paraguai apresentou o seu veto a esta inclusão. O veto paraguaio fundamentou-se no fato de a Venezuela não ter as condições institucionais para se tornar membro do MERCOSUL, em decorrência das reformas ensejadas pelo presidente Chávez, que tornaram esse país um regime de força, tendo atrelado os poderes Legislativo e Judiciário à vontade do Executivo. O Paraguai, entretanto, terminou sendo excluído do MERCOSUL pelos demais Membros Plenos, em virtude de que este país estaria desconhecendo as exigências de adesão ao regime democrático, pelo fato de ter sido destituído, por impeachment, o presidente Lugo, em Junho de 2012.

Inserido o MERCOSUL no contexto neopopulista pelo predomínio, nele, do Brasil e da Argentina (nos governos de Lula e do casal Kirchner, respectivamente), terminou sendo esvaziado das suas características econômicas ao longo dos últimos anos, especialmente após a admissão da Venezuela como Membro Pleno, para se converter em aliança política de defesa de regimes patrimonialistas na America Latina. Após a consolidação da “Revolução Bolivariana” na Venezuela chavista, esta passou, lamentavelmente, a polarizar a inspiração das instituições regionais sul-americanas ligadas ao MERCOSUL.

 Em consequência, os países membros dessa organização desenharam, ao longo da última década, um círculo vicioso de privatização patrimonialista do Estado e de atraso. A saga percorreu as mesmas etapas nos vários países: 1 - Tomada do poder pela via das eleições.  2 – Atribuição, aos mandatários eleitos, de um poder sem limites, pressupondo que eram os únicos representantes da soberania popular e os salvadores das massas oprimidas. 3 – Centralização de todas as instituições republicanas em mãos do executivo hipertrofiado, ao qual foram submetidos os demais poderes públicos, mediante reformas constitucionais efetivadas a toque de caixa. 4 – Hipertrofia do partido do governo, que passou a ocupar todos os espaços do jogo político, banindo, mediante o terror policial, o pluralismo partidário e o exercício da oposição. 5 – Ataques sistemáticos à imprensa livre, que passou a ser considerada como instrumento das antigas elites. 6 – Desenvolvimento de uma política externa pautada pela ideologia do confronto anti-imperialista e pela idéia da missão salvadora em favor das massas, com a criação de novas instituições internacionais que melhor representassem os anseios dos novos messias. Assim, surgiram a ALBA (Alternativa Bolivariana para as Américas) e a UNASUL (União de Nações Sul-Americanas), contrapostas à Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), ao North American Free Trade Agreement (NAFTA) e à Organização dos Estados Americanos (OEA), embora esta tenha sido bastante infiltrada pelos novos salvadores, lhe sugando a capacidade de mediação nos conflitos por eles causados. 7 – Estatização progressiva da economia, sendo consideradas as empresas privadas não tuteladas pelo Estado como inimigas dos interesses populares. 8 Desvio de grandes somas de recursos públicos para apoiar a fragilizada economia cubana; têm-se destacado nessa empreitada especialmente a Venezuela (que entregou parte da sua soberania aos irmãos Castro, tendo transferido para Cuba o Ministério venezuelano da Informação) e o Brasil (que através de generosos empréstimos do BNDES financiou a construção do porto estratégico de Mariel, por onde os cubanos alimentam o tráfico de armas para a Coréia do Norte e outras ditaduras consideradas “populares”).[14]

Para os Membros Plenos da área do MERCOSUL passou a vingar essa ideologia messiânico-populista, acompanhada por reformas nacionalistas, que passaram a ser interpretadas como parte da missão salvadora dos novos donos do poder. Como a Venezuela foi a que mais se destacou na construção dessa ideologia messiânica sob o comando do carismático Hugo Chávez, que usou e abusou dos petrodólares para comprar adesões, o novo clima afinou-se, na organização, com o populismo chavista. A defesa incondicional da “Revolução Bolivariana” ocupou a ordem do dia. Tem sido lamentável a atitude leniente dos Membros Plenos do Mercosul em face dos desmandos autoritários do atual presidente venezuelano Nicolás Maduro, cujo governo, nas protestas populares dos últimos meses, já assassinou perto de meia centena de cidadãos do seu país.

No terreno econômico, os resultados têm sido trágicos nos vários países do MERCOSUL, que terminou se convertendo, apenas, numa organização político-ideológica, tendo sido esvaziado das antigas funções de promover o desenvolvimento econômico e o intercâmbio sem barreiras entre os países membros. A inflação disparou em todos eles, em decorrência das políticas populistas de distribuição irresponsável de renda, nas várias “missões”, “bolsas” ou “projetos”, que visavam a comprar o apoio popular para ganhar eleições. Isso aconteceu na Venezuela chavista, no Brasil do lulopetismo, na Argentina do velho tango do atraso dançado pelo casal Kirchner, no Paraguai nos tempos do bispo-presidente Lugo, no Equador do falastrão Rafael Correa, na Bolívia do telúrico líder cocalero Evo Morales. Na nova onda de salvacionismo populista arrolar-se-iam pequenos países centro-americanos cativados pelos dólares chavistas, como foi o caso da Nicarágua.

O Brasil mergulhou por inteiro na nova onda bolivariana. Não é aqui o lugar para fazer um balanço do dramático saldo político e econômico da era lulopetista. Faço apenas uma breve caracterização centrada no aspecto da política econômica regional. Como gafanhotos famintos, ou à maneira de ávidos cupins (para utilizar a imagem cunhada por lúcido crítico do neopopulismo brasileiro, o saudoso Gilberto Ferreira Paim)[15], os militantes passaram a aparelhar as grandes empresas estatais e a coloca-las a serviço do seu enriquecimento pessoal e da hegemonia partidária; assim, foi quebrada a Petrobrás e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social virou instrumento político dos anseios internacionais do Lula que, diga-se de passagem, após oito anos de governo, passou a formar parte da lista Forbes dos milionários latino-americanos.

O números não mentem: a inflação, que tinha sido controlada mediante reformas efetivadas nos vários países nas duas últimas décadas do século passado, voltou a disparar na Venezuela, na Argentina, no Brasil, na Bolívia, no Paraguai, no Uruguai, etc. Para garantir a continuidade das eleições dos populistas de plantão, Hugo Chávez fez desfilar pastas repletas de petrodólares pelos vários países sul-americanos. Assim aconteceu na Argentina, no Equador, no Paraguai de Lugo e na Bolívia. Petrodólares chavistas alimentaram movimentos sociais simpáticos ao lulopetismo no Brasil, inclusive mediante o financiamento de escolas de samba com enredos bolivarianos no carnaval. A refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que já custou bilhões de dólares ao Brasil sem produzir uma gota sequer de hidrocarbonetos, foi projetada para ser co-financiada pela estatal venezuelana PDVSA.  Nenhum tostão foi desembolsado pelos “generosos” vizinhos. A inflação, na Argentina, está na casa dos 20% ao ano, enquanto na Venezuela supera o teto de 50%. O Brasil que, com o Plano Real (rejeitado pelos petistas quando da sua implantação, nos anos 90) saneou as finanças públicas, vê a inflação atingir preocupantes patamares que, neste ano, já superarão os 7%, sem que se veja, no horizonte, uma perspectiva de controle efetivo. Essa foi a herança que receberam os países signatários do MERCOSUL, após as prestidigitações bolivarianas, à luz do conhecido princípio macunaímico: “privatização de lucros, socialização de prejuízos”.

Conclusão: os países da Aliança do Pacífico e os do MERCOSUL (bolivariano), em face das garantias para a liberdade.

Concluirei a minha análise realizando o confronto anunciado, na parte inicial deste trabalho, entre o ideal da liberdade (como a entendia Constant) e as garantias que, no contexto dos países da Aliança do Pacífico e do MERCOSUL (bolivariano) foram postas em prática. Lembremos as cinco instâncias em que o doutrinário francês entendia que se jogava o gozo da liberdade: a liberdade pessoal, a liberdade religiosa, a liberdade de opinião, o respeito à propriedade individual e a garantia contra o arbítrio.

Os países alinhados com a Aliança do Pacífico garantem o exercício da liberdade, mediante a preservação das cinco instâncias em que esta se realiza. As várias declarações dos presidentes, bem como os documentos que regem a Aliança e as políticas públicas executadas pelos governos, destacam que o regime de liberdades é garantido pelos países membros, como condição sine qua non da participação no pacto. A Aliança constitui uma ponte entre o leste e o oeste, justamente se vinculando, através do Pacífico, às duas maiores economias do Planeta: os Estados Unidos e a China, abrindo as portas, também, ao resto do mundo, notadamente à América Latina.

Observa-se, inclusive, um fenômeno curioso: alguns países do MERCOSUL, como é o caso do Paraguai e do Uruguai (justamente os menores, e que deveriam ver protegidos com maior zelo os seus interesses no organismo regional ao qual se vincularam) têm acenado com o desejo de formar parte da Aliança do Pacífico, tendo participado, como foi mostrado, da 7ª cimeira da Aliança realizada em Cali (Colômbia), em Maio de 2013. O clima social nos países membros da Aliança do Pacífico é de franco crescimento das liberdades civis. Isso apesar de que vários deles tiveram de enfrentar, nas últimas décadas, sérios movimentos de contestação armada protagonizados por grupos radicais de esquerda, como foi o caso da Colômbia e do Peru, e apesar da guerra das drogas que assombra especialmente aos habitantes da região norte do México. Nesses três casos, o combate à violência tem sido realizado, pelos governos, rigorosamente dentro da ordem constitucional e com respeito aos direitos humanos, tendo sido corrigidos os excessos dentro da vigência do Estado de Direito.

Outro país, o Equador, Estado Associado do MERCOSUL, que na última década circulou estreitamente vinculado à órbita chavista, foi admitido como observador da Aliança do Pacífico, na mesma cimeira. De outro lado, El Salvador, que foi cortejado pelo chavismo e pelo lulopetismo, bateu às portas da Aliança, tendo-se tornado, também, observador. Por último, o Uruguai, que é Membro Pleno do MERCOSUL, participou mediante representação ministerial na cúpula de Cali da Aliança, em Maio de 2013. Ideologia, certamente, não enche a barriga de ninguém e, quando a necessidade bate à porta, os pequenos países preferem se alinhar com quem defende a liberdade.

Já o bloco do MERCOSUL, como foi mostrado nas páginas anteriores, aderiu majoritariamente à retórica bolivariana, de forma progressiva, ao longo dos últimos dez anos. Os governos petistas, no Brasil, foram definitivos para que se consolidassem os descaminhos dessa organização regional. A política internacional do lulopetismo favoreceu, de forma clara, desde o início, o populismo bolivariano, fortalecendo os projetos de Chávez para se consolidar na América do Sul. Não é exagero dizer que a política do lulopetismo tem estado diuturnamente inspirada pelos princípios do Foro de São Paulo, que Lula, ao lado de Fidel Castro, ajudou a fundar no início dos anos 90 do século passado. O conselheiro dos governos petistas para assuntos da América Latina, Marco Aurélio Garcia, é um defensor claro do castrismo e do bolivarianismo.

Lula, ao longo dos seus dois mandatos, deu apoio estratégico a Chávez, chegando a afirmar que na Venezuela não havia autoritarismo, mas “democracia demais”, alicerçado no pífio argumento de que, porque foi eleito, o coronel bolivariano tinha legitimidade, sem olhar para a forma absurda em que o mandatário destruiu os fundamentos constitucionais do Estado, ao consolidar a preeminência do Executivo sobre os outros poderes públicos e ao institucionalizar um regime policial, que repassou parte da soberania a Cuba, permitindo que o Ministério venezuelano da Informação fosse administrado desde Havana e que 40 mil “assessores” cubanos se instalassem na Venezuela.[16]

O governo de Dilma Rousseff não mudou a posição em face dos descaminhos da administração venezuelana, ao apoiar de forma clara a violenta repressão do governo de Nicolás Maduro sobre a população civil, valendo-se, para isso, da força do Brasil nos colegiados internacionais (OEA, UNASUL). O apoio do Brasil à Venezuela foi coroado, em 2012, com o ingresso deste país ao MERCOSUL, como Membro Pleno, fato que, como apontamos, terminou desvirtuando ainda mais o perfil econômico desta organização, convertendo-a em foro ideológico e político de defesa do socialismo bolivariano.

Se há uma característica que salta à vista hoje, no MERCOSUL, é que a presença venezuelana e o apoio decidido da Argentina e do Brasil à “Revolução Bolivariana” fizeram com que a organização se afastasse dos princípios liberais de defesa da liberdade, na forma ampla em que tal visão política foi entendida por Constant. Ora, hoje, no âmbito do MERCOSUL, torna-se difícil reivindicar a defesa da liberdade de opinião, de livre imprensa, de consciência, de ir e vir, de segurança no uso das próprias posses e de valorização da livre iniciativa por parte dos cidadãos. O caminho que resta, para os países que ainda prezam a liberdade, é abandonar o MERCOSUL e aderir a outras instituições regionais (como a Aliança do Pacífico), em que as liberdades não sejam agredidas. É o que, parece, terminará acontecendo, se os rumos do MERCOSUL não mudarem, para voltar a ser o instrumento de integração econômica que foi pensado inicialmente, com pleno respeito à ordem constitucional e aos direitos civis e políticos dos cidadãos.

Bibliografia Consultada

ALIANÇA DO PACÍFICO.
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[1] CONSTANT de Rebecque, Henri-Benjamin. Principios de política. (Tradução espanhola de Josefa Hernández Alonso; introdução de José Alvarez Junco). Madrid: Aguilar, 1970, p. 8-10.

[2] Para todas as citações de documentos relativos à Aliança do Pacífico, tenho consultado o Portal da Aliança: http://alianzapacifico.net/documentos/ [consulta realizada em 14 de Abril de 2014]. Neste Portal também se encontram os pronunciamentos dos Presidentes dos países membros da Aliança, citados no final deste item.

[3] O Estado de São Paulo (editorial). Edição de 16 de Fevereiro de 2014, p. 3.
[4] Cf. a respeito, o meu ensaio intitulado: “Neopopulismo, uma realidade latino-americana”, publicado pela Carta Mensal, Rio de Janeiro, órgão do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio; n. 640; julho, 2008.
[5] TAGUIEFF, Pierre-André. L´Illusion populiste – Essai sur les démagogies de l´âge démocratique. 2ª. Edição. Paris: Flammarion, 2007, p. 9.
[6] GUERREIRO, Mário; OLIVA, Alberto.  “Populismo: ilusionismo e auto-engano”. In: Banco de Idéias – Instituto Liberal. Rio de Janeiro, vol. 10, no. 37 (dezembro 2006, janeiro/fevereiro 2007): p. 7.
[7] WEBER, Max. Economía y sociedad – Esbozo de sociología comprensiva. 2ª. Edição em espanhol. (Edição preparada por Johannes Winckelmann; nota preliminar de José Media Echavaría; tradução de José Medina Echavarría, Juan Roura Parella, Eduardo García Máynez, Eugenio Ímaz e José Ferrater Mora). México: Fondo de Cultura Econômica, 1977, 2º volume, p. 847-888.
[8] TAGUIEFF, Pierre-André. L´Illusion populiste – Essai sur les démagogies de l´âge démocratique. Ob. cit., p. 10.
[9] TAGUIEFF, Pierre-André. L´Illusion populiste – Essai sur les démagogies de l´âge démocratique. Ob. cit., p. 31-32.
[10] TAGUIEFF, Pierre-André. L´Illusion populiste – Essai sur les démagogies de l´âge démocratique. Ob. cit., p. 10-11.
[11] TAGUIEFF, Pierre-André. L´Illusion populiste – Essai sur les démagogies de l´âge démocratique. Ob. cit., p. 16.
[12] GARCÍA MÁRQUEZ, Gabriel. El otoño del patriarca. 4ª. Edição. Buenos Aires: Debolsillo, 2005, p. 41.
[13] SARMIENTO, Domingo Faustino. Facundo – Civilização e barbárie no pampa argentino. (Tradução e Introdução de Aldyr Garcia Schlee) Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul / Editora da PUC-RS, 1996, p. 102-103.
[14] A importação de médicos cubanos, pelo Brasil e pela Venezuela, é outra vergonhosa operação que permite aos irmãos Castro infiltrar agentes cubanos nas regiões carentes destes países, além de garantir a entrada regular de divisas para Cuba, como “pagamento” pelos serviços “médicos” prestados.
[15] Cf. PAIM, Gilberto Ferreira (1919-2013) nas suas obras: De Pombal à abertura dos portos.  Rio de Janeiro: Editorial Escrita, 2011 e: O filósofo do pragmatismo – Atualidade de Roberto Campos. (Prefácio de Francisco de Assis Grieco). Rio de Janeiro: Editorial Escrita, 2002, caracterizou como “cupinzeiro” a corrupta e ineficiente burocracia patrimonialista luso-brasileira, que historicamente sugou recursos da nação sem prestar aos cidadãos os serviços que dela se esperavam.

[16] Cf., a respeito, a obra da jornalista da France Presse, Beatriz LECUMBERRI, La revolución sentimental: viaje periodístico por la Venezuela de Chávez. (Prólogo de Cristina Marcano). Caracas: Puntocero, 2012. Desta obra fiz uma análise no ensaio intitulado: La Revolución sentimental – Uma lúcida análise do chavismo, publicado no Portal Defesa da UFJF em 20 de Dezembro de 2012: http://www.ecsbdefesa.com.br/defesa/fts/RLSC.pdf .

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