Estive em Porto Alegre proferindo
palestra sobre o tema: “Castilhismo, autoritarismo e republicanismo”, no
contexto do Seminário Internacional sobre “A República Velha: conflitos
armados, embates ideológicos”, desenvolvido pelo Programa de Pós-graduação em
História da PUC do Rio Grande do Sul e tive uma grata surpresa. Confirmei que a
nova geração de historiadores brasileiros caracteriza-se pela abertura de
perspectivas, tendo deixado para trás o ranço ideológico que caracterizou a
atividade de pesquisadores no setor, em décadas anteriores. O fenômeno se dá de
dez anos para cá. Os jovens que buscam os cursos de história certamente se
cansaram da surrada vulgata marxista que lhes era servida como refeição
obrigatória, no cardápio de fome em que terminaram afundando muitas
universidades na área de ensino da história e, em geral, das ciências humanas.
Os pesquisadores querem ter conhecimento de tudo que se passa no universo da
historiografia mundial, quais os temas mais debatidos nos maiores centros,
quais os assuntos acerca dos que se pode estabelecer um diálogo frutífero com
outras áreas do conhecimento, etc. No caso da historiografia brasileira, jovens estudantes, professores e pesquisadores estão resgatando progressivamente o estudo das ideias liberais e conservadoras, que foram relegadas ao saco sem fundo da denominada "direita" pelos ideólogos da vulgata marxista.
Já tinha apreciado esse fenômeno
entre os alunos e os jovens docentes do Departamento de História da
Universidade em que trabalhei ao longo das últimas décadas, a Federal de Juiz
de Fora. Vi jovens pesquisadores orientarem os seus alunos para a pesquisa de
autores brasileiros outrora menosprezados pelos historiadores marxistas, como é
o caso do nosso Silvestre Pinheiro Ferreira. O terreno, aliás, da história das
ideias políticas e, em geral, da historiografia do pensamento e das
mentalidades, começou a ser desbravado nos Cursos de História, antes agarrados
à história econômica, seguindo a trilha do dogmatismo marxista.
Bairro Moinhos de Vento (vista parcial). |
Volto ao Seminário Internacional
sobre “A República Velha, conflitos armados, embates ideológicos”. A maior
parte das intervenções, pelo que se pode depreender do programa, foi
constituída pelas pesquisas que estão sendo desenvolvidas pelos doutorandos do
programa de Pós-graduação em História da PUC-RS. As palestras do evento foram
as seguintes, após a conferência de abertura pronunciada pelo Prof. Dr. Gerardo
Caetano (docente da UDELAR – Uruguai): “Castilhismo, autoritarismo e
liberalismo” (que esteve sob a minha responsabilidade, tendo sido os debates coordenados por Luiz Claudio Nunes Knierim, Diretor Técnico da Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folklore); “Positivismo” (a cargo
do prof. Dr. Cássio Albernaz, jovem pesquisador e docente da PUC-RS);
“Biografias: Júlio de Castilhos” (Miguel Espírito Santo – Instituto Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Sul); “Biografias: Gaspar da Silveira Martins”
(Eduardo Rouston Jr., doutorando da PUC-RS); “Revolução de 1893: continuidades
e descontinuidades” (Giovanni Mesquita, IGTF); “1893 para além das fronteiras”
(Ana Luiza Setti Reckziegel, UPF); “Cenário econômico da Revolução de 1893”
(Luiz Roberto Targa, FEE); “Conflitos armados de 1893” (Luiz Roberto Grijó,
UFRGS); “Revolução de 1923” (Luciano Abreu, PUC-RS); “Cenário econômico de
1923” (Ronaldo Herrlein, UFRGS); “Liberalismo Assissista” (Manuel Passos,
UFRGS); Exibição do filme “Revolução 1923” (Luis Carlos dos Passos Martins,
PUCRS); Abertura da exposição fotográfica “1923”, no Solar dos Câmara;
Solenidade de entrega do retrato do Marechal Câmara, no Solar dos Câmara.
(Da esquerda para a direita): Miguel do Espírito Santo (Instituto Histórico do Rio Grande do Sul), este cronista e Prof. Dr. Cássio Albernaz (PUCRS), no campus da PUC, Porto Alegre. |
Ressalta na programação a grande
importância que, no Rio Grande do Sul, tem a historiografia regional. Essa
tendência não é nova e já era observada quando realizei as minhas pesquisas
sobre o Castilhismo, no decurso dos anos 70. Contrariamente ao que acontecia em
outras regiões do país, onde a orientação prevalecente era uma historiografia
com foco no eixo Rio – São Paulo, os gaúchos sempre apreciaram a análise da
história regional. Hoje, os cursos de pós-graduação stricto sensu voltam-se para essa orientação.
Em conversas que tive com os
coordenadores do evento, os professores doutores Luciano Aronne de Abreu
(Coordenador do Departamento de História da PUCRS) e Cássio Albernaz (pesquisador
e docente do Programa), percebi que é grande o interesse pelo estudo de temas
até há pouco tempo vetados pelo patrulhamento ideológico nos Departamentos de
História das Universidades brasileiras. Eles mostraram-se muito empenhados em
continuar o seu trabalho de garimpo de ideias, nas searas do denominado “pensamento liberal-conservador”. Um exemplo: eles estudam com afinco a obra de Oliveira Vianna, outrora descartado como "fascista" nos claustros acadêmicos.
Várias comunicações do evento realizado resgataram a memória dos liberais gaúchos Gaspar da Silveira Martins e Joaquim Francisco de Assis Brasil. Manifestei, é claro, o meu interesse em colaborar com o Programa de Pós-graduação
em História da PUCRS no aprofundamento desses temas. Já encaminhei a eles o meu
trabalho sobre o sociólogo fluminense, intitulado: Oliveira Vianna e o papel
modernizador do Estado brasileiro (Londrina: Editora da Universidade
Estadual de Londrina, 1997), bem como estudo recente que realizei, intitulado: Pensamento
Político Brasileiro Contemporâneo (Rio de Janeiro: Editora Revista
Aeronáutica, 2012). Enviei, também, o meu livro intitulado: Keynes, doutrina e crítica (São Paulo: Massao Ohno/Instituto Tancredo Neves, 1999). Nesse estudo, destaco, ao lado das ideias matrizes de Keynes, a crítica feita pelos autores neoliberais na segunda metade do século XX.
Por outro lado, estou lendo com interesse o livro do professor Aronne de Abreu, intitulado: Um olhar regional sobre o Estado Novo (apresentação de René E. Gertz, Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007), que constituiu a sua tese de doutorado defendida na Unisinos com o título de: O Rio Grande estadonovista: interventores e interventorias. Tive, outrossim, oportunidade de trocar ideias com o prof. Albernaz, acerca das pesquisas por ele desenvolvidas na Universidade Sorbonne, em Paris, ao ensejo da sua tese de doutorado, sobre temas relacionados com a origem e funcionamento dos Conselhos Técnicos Integrados à Administração da era Vargas. Tema que, aliás, me interessa muitíssimo, pois assinala o marco da consolidação, na nossa tradição política marcada pelo cientificismo pombalino, da tecnocracia de cunho autoritário, que ainda assombra as perspectivas das políticas públicas brasileiras.
(Da esquerda para a dir.): Miguel do Espírito Santo (Instituto Histórico), este cronista e doutorando Eduardo Rouston Jr., no campus da PUC, Porto Alegre. |
Por outro lado, estou lendo com interesse o livro do professor Aronne de Abreu, intitulado: Um olhar regional sobre o Estado Novo (apresentação de René E. Gertz, Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007), que constituiu a sua tese de doutorado defendida na Unisinos com o título de: O Rio Grande estadonovista: interventores e interventorias. Tive, outrossim, oportunidade de trocar ideias com o prof. Albernaz, acerca das pesquisas por ele desenvolvidas na Universidade Sorbonne, em Paris, ao ensejo da sua tese de doutorado, sobre temas relacionados com a origem e funcionamento dos Conselhos Técnicos Integrados à Administração da era Vargas. Tema que, aliás, me interessa muitíssimo, pois assinala o marco da consolidação, na nossa tradição política marcada pelo cientificismo pombalino, da tecnocracia de cunho autoritário, que ainda assombra as perspectivas das políticas públicas brasileiras.
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