A posse de Renan Calheiros, do
PMDB, como presidente do Senado, longe de constituir um episódio regular da
vida política brasileira, está a indicar a entropia das nossas Instituições.
Não apenas pelos paradoxais discursos pronunciados ao ensejo da posse pelo
próprio Calheiros e por figuras que, décadas atrás, foram esconjuradas da cúpula
do governo por práticas não republicanas, como o senador Collor de Melo, que do
alto da tribuna fez sérias acusações contra o Procurador Geral da República, pressupondo
que as ações públicas deste estivessem motivadas, apenas, por baixos interesses
de proveito pessoal. O fato de Renan Calheiros se apresentar como paladino da
ética, num momento em que está sendo questionado pelo Ministério Público, em
denúncia que foi apresentada pela Procuradoria ao Supremo por prática de atos
contrários à dignidade republicana é, no mínimo, um acinte aos cidadãos que ainda
acreditamos que é possível viver num país civilizado. De outro lado, a posse,
na presidência da Câmara, do deputado Enrique Alves (do PMDB), cuja proposta legislativa
se centra na manutenção de práticas clientelistas que atrelam o Congresso ao
Executivo (como as emendas parlamentares), completa o quadro de desmoralização
do Congresso.
As coisas não seriam tão graves
se correspondessem, apenas, a uma crise ética e política do Poder Legislativo.
Acontece que a doença é mais radical. Os sintomas da decomposição inserem-se no
contexto mais amplo de uma maré negra que aponta para a desmoralização total
das Instituições Republicanas, num fatídico balé que tem como regente o
ex-presidente Lula.
Os próximos alvos, nessa
empreitada de morte cívica, serão a cabeça do Judiciário e do Ministério
Público, na retomada do processo de desmoralização já iniciado pelo lulopetismo
contra o Presidente do Supremo e contra o Procurador Geral da República. Alvo
já anunciado dos ataques da petralhada será também a Imprensa, que passará a
ser acusada pela instabilidade política, numa manobra leninista de acusação,
pela militância, das culpas cometidas pelos próprios denunciantes. Afinal, quem
mais tem trabalhado em prol da instabilidade é o próprio lulopetismo, que tem
buscado de forma incessante colocar a República, exclusivamente, a serviço de
Lula e dos interesses partidários.
Em paralela, eficaz e deletéria
ação, o crime organizado vai cumprindo o seu papel de amedrontar os cidadãos,
mediante uma prática que, no século passado, Pablo Escobar pôs em funcionamento
na decomposição colombiana: o assassinato sistemático de policiais e a realização
rigorosamente programada de atos de terrorismo que têm como finalidade
fragilizar ainda mais a psique coletiva, como está acontecendo, de vários meses
para cá, em São Paulo e no interior de Estados outrora pacíficos como Santa
Catarina. Afinal, se o clima imperante na alta cúpula do Governo é o de colocar
o Brasil a serviço de interesses particulares, o crime organizado aproveita a
brecha e pratica a sua própria demolição das Instituições.
O lulopetismo age, no tecido
social brasileiro, como aqueles aracnídeos altamente peçonhentos que inoculam
nas suas vítimas o fatal veneno que, aos poucos, lhes paralisa os membros,
reduzindo-as totalmente à inação e à morte. Na caminhada de séculos do
Patrimonialismo brasileiro, nessa dança macabra de privatização de tudo para
obedecer às instâncias familisticas de um clientelismo rastacuera, o
lulopetismo não tem paralelo nos itens de cinismo e eficácia. O homem do chapéu
está conseguindo cooptar todo mundo, criando um consenso fatídico ao redor da
desmoralização das Instituições Republicanas. É o capítulo que antecede à morte
cívica e ao império de um desolador peronismo à brasileira, como já previu
Fernando Henrique Cardoso. “Nunca antes na história deste país” tinha se
apresentado alguém, como Lula, dotado de tão grande carisma, arguto e excelente
articulador, pondo tudo a serviço de uma era de domínio unipessoal e da
companheirada.
Não cometamos a injustiça
histórica de comparar esse quadro do avanço patrimonialista com o do getulismo
ou com o do regime de 64. Nestes dois momentos da nossa história, ergueu-se
proposta de modernização autoritária, para esconjurar forças dissolventes
arregimentadas pelo totalitarismo de plantão e para dotar o país das
instituições sociais e da infraestrutura que lhe garantiriam entrar no mundo da
industrialização. Nunca concordei com esse viés autoritário. Teria sido
possível, sim, modernizar o Brasil, preservando os institutos do governo
representativo e do respeito aos direitos individuais. Teríamos dado um passo
bem à frente do tradicional patrimonialismo modernizador na América Latina. Mas
não há dúvida quanto ao fato de que, tanto no getulismo quanto no regime militar,
o país se modernizou. Ora, isso não aconteceu na década lulopetista. Tudo
aquilo que parecia programado para efetivamente democratizar e modernizar de
vez a nossa vida política, terminou desaguando no mais deslavado clientelismo,
num projeto de cooptação amplo, geral e irrestrito da sociedade pelo Executivo
hipertrofiado, sem a mínima racionalidade para com a política econômica e sem o
cuidado necessário para com a manutenção sadia das nossas contas públicas
iniciado com o Plano Real.
Estão aí os processos de
cooptação dos institutos de pesquisa, como o IPEA e o IBGE, que gozavam outrora
de grande credibilidade, e que a petralhada no poder conseguiu desprestigiar,
por tê-los colocado a serviço da propaganda governamental. Estão aí, também, os
índices de crescimento econômico que despencam, junto com a credibilidade de
estatais como a Petrobrás. Está aí a perda progressiva de independência do
Banco Central, docilmente manobrado pelo PT. Está aí a inflação que volta a
assombrar os nossos lares, com remarcação geral de preços e com endividamento
crescente dos cidadãos. Está aí a sombria tendência à desindustrialização, que
preocupa cada vez mais os nossos empreendedores. Estão aí os crescentes índices
de queda da competitividade dos produtos da indústria brasileira, afetada pela
instabilidade jurídica, pelo modesto desenvolvimento da pesquisa tecnológica e
pelo gasto público descontrolado que impede a modernização da infraestrutura. Está
aí, enfim, a gastança do dinheiro público sem nenhum controle, efetivada pelos
sindicatos (desonerados, por Lula, da obrigação de prestar contas ao TCU), por
governadores e prefeitos do PT e da base aliada, que mandaram às favas a Lei de
Responsabilidade Fiscal; está aí também a aceleração desenfreada do gasto
público por parte do próprio governo federal, nessa corrida maluca das
políticas sociais, erradamente concebidas sem contrapartida dos beneficiários e
sem a devida transparência; está aí a aceleração do gasto público no PAC e nas
obras preparatórias para a Copa do Mundo e as Olimpíadas, que já vão superando os
limites previstos, fazendo desembestar o dragão inflacionário. Os obscuros
episódios da Delta e da intermediação do meliante Cachoeira foram empurrados
para baixo do tapete pela espertice lulista, ao ensejo do encerramento da
correspondente CPI, que foi estimulada pelo ex-presidente Lula unicamente para
deitar uma cortina de fumaça sobre o mensalão, mas que terminou abrindo mais um
flanco na já fraca credibilidade do governo.
Dadas as repetidas investidas do
desgoverno de Dilma e do lulismo em ação contra a transparência e contra a
sadia gestão da economia, poderíamos terminar este quadro sombrio com mais uma
imagem tomada de empréstimo à entomologia. O Brasil é, hoje, vítima da terceira
epidemia da dengue patrimonalista, que se seguiu às duas outras sofridas
durante os governos de Lula. Conseguirá o corpo social da Nação agüentar toda
essa carga negativa?
Para variar, uma excelente analise da situação da politica brasileira, que se encontra na UTI por causa de uma doença de país subdesenvolvido.
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