“Eu fiz dois abortos e também digo que sou avó do aborto também porque por mim já passou” [da entrevista concedida por Eleonora Menicucci a Joana Maria Pedro, da Universidade Federal de Santa Catarina, em 2004].
Quando pensávamos que já tínhamos visto tudo em matéria de trambique patrimonialista neste governo de presidencialismo de coalizão, eis que somos presenteados com a vovozinha-lobo na Secretaria da Política para as Mulheres. A julgar pela longa entrevista transcrita por Reinaldo Azevedo no seu Blog (“A lenda da vovozinha vermelha que engoliu o lobo” e “Ministra das Mulheres confessa ter cometido crime na Colômbia”, 13/02/2012, Revista Veja), a titular da pasta está mais para a cruel velhinha que engoliu chapeuzinho e o próprio lobo, do que para funcionária qualificada e isenta, apta a presidir a mencionada Secretaria (que tem nível de Ministério). Tudo se resumiu, em matéria de exigências que a qualificassem para o cargo, ao fato de a candidata à pasta ter dividido a cela da cadeia com a presidente Dilma, nos tempos de aventuras guerrilheiras. Critério duvidoso e, a todas as luzes, insuficiente. Ressaltemos, de entrada, para prevenir as ladainhas da petralhada, que não se trata de preconceito contra uma mulher que teve compromissos com a esquerda radical. Trata-se, sim, de analisar os contornos das convicções políticas de uma pessoa que, ao ser guindada ao palco ministerial, é pública, deixando, portanto, de ser uma simples cidadã confinada à vida privada.
Causam espécie ao cidadão comum alguns itens do pensamento da nova Ministra. Em primeiro lugar, a sua convicção, revelada na entrevista mencionada (concedida em 2004 a Joana Maria Pedro, para a Revista IHV on line, da Universidade Federal de Santa Catarina), de que o que define a moralidade dos atos é o julgamento do “coletivo”, ou seja, do aparelho político, não a voz da consciência individual. A própria entrevistada deu um exemplo desse tipo de prática onde a pessoa simplesmente não conta: ela confessa que praticou um aborto simplesmente porque o “aparelho” no qual estava inserida mandou (ela militava no POC, Partido Operário Comunista). Ora, a moralidade é algo que se alicerça nos imperativos categóricos da pessoa, não nas consignas da praça pública, ou nas ordens do “coletivo”, seja ele o partido, o aparelho de agitação revolucionária, uma ONG ou a patota. Em segundo lugar, a senhora Eleonora Menicucci apresenta-se como praticante do aborto sem ser médica, tendo feito, na Colômbia, curso de AMIU (aspiração manual intra-uterina). Na longa entrevista, ela diz que o ideal seria que as pessoas leigas se capacitassem, no nosso país, para praticar o aborto em casa, mediante o citado método. Posição que fere a ordem legal existente no Brasil, onde o aborto é crime, fora os casos previstos em lei e quando praticado em hospitais por médicos credenciados (mediante autorização explícita da Justiça). O que não é o caso do aborto pregado e praticado pela senhora Menicucci e pela sua ONG “Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde”. Ao praticar o aborto nas condições confessadas por ela, simplesmente cometeu um crime, agravado pelo fato de incentivar publicamente, na sua ONG, a prática criminosa. Em terceiro lugar, a senhora Menicucci feriu os sentimentos de moralidade das famílias brasileiras, ao confessar aos quatro ventos que pratica uma sexualidade tresloucada com homens e mulheres, frisando que saiu de Belo Horizonte justamente porque os seus companheiros de ação política a achavam excessivamente “libertária”. Não se trata de censurar aqui a opção sexual dessa senhora. Trata-se, sim, de criticar a forma arrogante e inapropriada em que ela coloca as suas opções de vida privada, manifestando claramente a intenção de que se tornem normas de comportamento “revolucionário” no seio da sociedade. Explica-se, assim, certamente, a reação de setores evangélicos e do bispo católico de Assis, D. José Benedito Simão (Presidente da Comissão Pela Vida, no Estado de São Paulo) que enquadraram as declarações da senhora Menicucci como algo ofensivo às suas convicções religiosas. Mais do que uma proletária atitude de “épater le bourgeois” (“escandalizar a burguesia careta”), prevalece, nas declarações da mencionada senhora, o sofisma gramsciano de praticar a “revolução passiva” mediante a desconstrução dos valores burgueses, entre os quais a ordem familiar aparece como o primeiro empecilho para a hegemonia dos “intelectuais orgânicos”. Maluquice ideológica que somente pode ser sustentada por quem fez da ideologia marxista-leninista o seu credo particular. Opção que, certamente, não é a da maioria dos brasileiros. Por último, a senhora Menicucci diz professar um tipo de feminismo radical no qual a defesa dos direitos das mulheres está associada a uma proposta de “sexualidade revolucionária”, quando afirma: “E eu digo que a questão feminista é tão dentro de mim, e a questão dos Direitos Reprodutivos também, que eu sou avó de uma criança que foi gerada por inseminação artificial na mãe lésbica”. Ora, essa é uma versão de “feminismo” que não se compagina com os usos e costumes da nossa sociedade, onde ainda prevalece a prática da união entre um homem e uma mulher, como a forma básica de família. O que não significa, de forma alguma, negar os direitos das minorias sexuais. Trata-se, simplesmente, de reconhecer que esse respeito às minorias não se deve traduzir na aberração de que todo mundo vire minoria. A maioria conta! O direito das minorias sexuais tem um limite: ali onde começa o direito da maioria dos cidadãos que não pertencem a essa minoria. As convicções destes não podem ser desconhecidas e achincalhadas publicamente pelos que dizem pertencer à minoria.
A anomalia de que a moralidade não é questão de responsabilidade das pessoas, mas uma unanimidade a ser implantada, a ferro e fogo, pelo “coletivo” foi inventada, na modernidade, pelo filósofo Jean-Jacques Rousseau (que, diga-se de passagem, não era nenhum exemplo de moralidade familiar, tendo abandonado os cinco filhos que teve com uma humilde lavadeira). Para o mencionado pensador, deveria ser varrido do mapa o indivíduo que defendesse os seus interesses particulares, a fim de substituí-lo pelo “homem novo”, aquele unicamente identificado com o “bem público”, que seria formatado pelos “puros” (aqueles que renunciaram à defesa dos seus interesses particulares, para se identificarem com o bem coletivo, raiz da felicidade geral da nação).
Conhecemos a linhagem desses “puros”: em primeiro lugar os jacobinos, na Revolução Francesa, que semearam o Terror com a guilhotina como corolário (que terminou por cortar as suas próprias cabeças). Em segundo lugar, os revolucionários de 1848 e 1870, na França, com as primeiras tentativas de um “governo popular” exercido por operários. O clima de terror implantado pelos agitadores profissionais foi genialmente descrito por Tocqueville na sua obra intitulada: Lembranças de 1848 (tradução de Modesto Florenzano, São Paulo: Penguin / Companhia das Letras, 2011). Em terceiro lugar, os bolcheviques, na Revolução Comunista de 1917, na Rússia, que ensejaram um dos mais sanguinolentos regimes totalitários de que se tem notícia, com milhões de vítimas. Em quarto lugar, os nazistas e fascistas, que pretendiam criar o “homem novo” ao ensejo do culto ao líder superior, à raça e ao estatismo. Em quinto lugar, os comunistas das várias nacionalidades, que seguiram, ao longo do tumultuado século XX, as diretrizes do comunismo internacional pregado por Moscou. Duzentos milhões de vítimas foi o saldo trágico dos que, pelo mundo afora, foram eliminados na implantação desse ideal de “homem novo”. Em sexto lugar, os comunistas latino-americanos da hora presente, que estimulados por Fidel Castro, Lula, frei Betto, as FARC, etc. no Foro de São Paulo, tentam reviver, hodiernamente, o cadáver insepulto do comunismo, numa anacrônica aventura que faz mergulhar muitos países da região nas sombras de um Patrimonialismo predatório capaz de empobrecer todo um continente. Entre eles, certamente se situam os nossos bravos militantes petistas e coligados, dos quais é expressão a senhora Ministra das Mulheres.
Estava informando aos meus leitores, no final desta matéria, que podiam consultar a íntegra da entrevista de Eleonora Menicucci no seguinte portal da Universidade Federal de Santa Catarina:
http://www.ieg.ufsc.br/admin/downloads/entrevistas/29092009-111002menicucci.pdf
Acabo de ver que o mencionado site tirou do ar a entrevista da senhora Menicucci, num ato de autocensura provocada evidentemente pela petralhada. Felizmente Reinaldo Azevedo tinha colocado no ar, dias atrás, no seu blog, a íntegra da matéria censurada. Palmas para o bom jornalismo que enfrenta com coragem a pressão do PT e coligados!
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