Esgoto na praia da Barra da Tijuca. (Foto: The Guardian, 03-08-2016) |
A Festa Olímpica, com todo o seu brilho, não desfaz, num passe de mágica, os problemas que o Brasil enfrenta nesta difícil quadra da sua história. Está aí o "custo Brasil" que superfaturou obras e encareceu para os brasileiros a conta a pagar. Não há almoço de graça, como dizia conhecido economista. Mas tampouco há Olimpíada de graça. A conta é paga pelos contribuintes, que podem sentir muito forte o baque. A Grécia que o diga.
Os problemas com o descaso em face do meio ambiente estão sendo sentidos pelos participantes dos Jogos Olímpicos do Rio. E nem adianta disfarçá-los. Estão aí, aos olhos de todos, como o esgoto e os detritos que contaminam as águas da Baia da Guanabara e que já estão dando dores de cabeça aos esportistas de remo, vela, caiaque e assemelhados, bem como aos seus auxiliares. No caso do esgoto visível nas águas do mar no Rio de Janeiro, será difícil convencer o honorável público estrangeiro de que são fatalidades da natureza.
Reportagem do jornalista John Vida, do londrino The Guardian intitulado: “Por que o Rio de Janeiro está achando tão difícil limpar o seu lixo?”(03-08-2016) informava: “Um entre três dos mais de 10 milhões de habitantes da grande área metropolitana vive em lugares que não possuem saneamento básico e metade do lixo da cidade não é tratado antes de ser despejado nos cursos de água e, eventualmente, no oceano”.
Reportagem de Pauline Fréour do jornal parisiense Le
Figaro, em artigo intitulado: “Jogos Olímpicos: no mar e sobre a terra,
os atletas face à poluição”, alertava acerca do perigo que os esportistas vão
encontrar na Lagoa Rodrigo de Freitas nas competições de caiaque e canoagem, em
decorrência das altas porcentagens de microrganismos nocivos presentes na água,
sendo que “a concentração de adenovírus é 25 mil vezes superior ao nível de
alerta fixado nas praias da Califórnia”. John
Griffith, biólogo marinho da
Carolina do Sul, nos Estados Unidos, entrevistado a respeito, frisava: “O que
há lá é água de esgoto, simplesmente”.
Os australianos, aliás, na tela dos noticiários por causa das
suas legítimas reclamações quanto às obras inacabadas dos apartamentos na Vila
Olímpica, quando foi a vez deles, em Sydney, nas Olimpíadas de 2000, não se
viram às voltas com esses problemas de contaminação das águas. Muito pelo
contrário: fizeram da sua Olimpíada um belo exemplo de políticas públicas para
cuidar da natureza, como lembrou recentemente André Trigueiro no seu programa
“Cidades e Soluções”, divulgado pela Globo News.
A Austrália deu um show de preservação ambiental cuidando, de
forma exemplar, da pureza das águas da hiperpoluída baía de Homebush, conhecida
como o maior esgoto do país, muito semelhante, em deterioração, ao estado em
que se encontra a nossa baía da Guanabara. Esse foi o cenário para os esportes náuticos
e ficou como legado da Olimpíada, ao ter totalmente saneadas as suas águas e ao
ser convertido o seu entorno num parque natural de 430 hectares. Para conseguirem obter em
tempo recorde esses magníficos resultados, os organizadores não pouparam esforços: gastaram
2,1 bilhões de dólares australianos e chamaram para colaborar no planejamento
ecológico grupos ambientalistas internacionais, conhecidos pelo seu rigor nas
políticas preservacionistas, como o Greenpeace. Ali foi estabelecido o primeiro
sistema integrado do país de reciclagem total da água. Lembremos, por outro
lado, que a Vila Olímpica foi abastecida totalmente com energia renovável
proveniente de painéis solares.
As obras de preservação ambiental continuaram nos anos seguintes. Em 2014 foi inaugurado um parque ecológico sui-generis. O navio de suprimentos americano SS Armyfield de 1.400 toneladas, construído em 1911 e que tinha sido abandonado perto da praia pelos americanos após o final da 2ª Guerra Mundial, foi transformado em parque ecológico flutuante e passou a ornar, como uma espécie de grande vaso verde, as tranquilas águas da baia de Homebush.
"Floresta flutuante" em navio abandonado, na bela e despoluída baía de Hombebush, em Sydney. (Foto: Divulgação). |
As obras de preservação ambiental continuaram nos anos seguintes. Em 2014 foi inaugurado um parque ecológico sui-generis. O navio de suprimentos americano SS Armyfield de 1.400 toneladas, construído em 1911 e que tinha sido abandonado perto da praia pelos americanos após o final da 2ª Guerra Mundial, foi transformado em parque ecológico flutuante e passou a ornar, como uma espécie de grande vaso verde, as tranquilas águas da baia de Homebush.
Bem que os brasileiros poderíamos ter feito bonito nesse
item. Mas não: optamos pela improvisação. A administração municipal ficou refém
das piadinhas sem graça do Prefeito, que ofereceu cangurus aos australianos e se queixou (sem fundamento) de ter de "oferecer caviar" ao Comitê Olímpico.
De outro lado e já no plano nacional, ficará difícil para
explicar aos estrangeiros presentes nas Olimpíadas as cenas de terrorismo
deflagradas em Natal pelo Primeiro Comando da Capital e quejandos, que dominam
os presídios brasileiros e que decidiram mostrar a sua força perante o mundo,
envergonhando as autoridades brasileiras e a todos nós. Uma centena de ônibus incendiados
para aterrorizar a população em pleno período de Olimpíada é terrorismo no
duro. Vamos ver se as autoridades estaduais e federais vão dar o tratamento que
merecem os autores desses crimes. Já temos uma lei antiterror que os petralhas
fizeram o possível para que não fosse aprovada. Terão coragem as autoridades
competentes para aplica-la, como a opinião pública espera?
E, por falar em terrorismo, ficaram famosas as fotografias tiradas pela equipe masculina chinesa de basquete (mostrando pessoas se jogando ao chão para se protegerem do tiroteio patrocinado por traficantes). A equipe chinesa tinha ficado presa, entre as Linhas Amarela e Vermelha, logo após o seu desembarque no aeroporto do Galeão. Isso não podia acontecer. Grave falha do esquema de segurança!
E, por falar em terrorismo, ficaram famosas as fotografias tiradas pela equipe masculina chinesa de basquete (mostrando pessoas se jogando ao chão para se protegerem do tiroteio patrocinado por traficantes). A equipe chinesa tinha ficado presa, entre as Linhas Amarela e Vermelha, logo após o seu desembarque no aeroporto do Galeão. Isso não podia acontecer. Grave falha do esquema de segurança!
Tiroteio na entrada ao Rio, na junção das Vias expressas Amarela e Vermelha. Fotografia tirada pela equipe masculina de basquete da China (04-08-2016). |
Numa outra abordagem dos jornalistas internacionais, reportagem do jornal espanhol El
País fez ampla matéria sobre a prostituição de jovens mulheres ao
ensejo da Olimpíada no Rio de Janeiro. As “trabalhadoras sexuais”, como a
esquerda gramsciana gosta de chama-las, não se sentem à vontade na sua
profissão durante esses dias de folguedo. Como destacou a jornalista Maria
Martin em duas matérias publicadas no dia 2 de Agosto, (“El sueño agridulce de
las prostitutas de los Juegos Olímpicos” y “Prostitución infantil con vistas al
Parque Olímpico”), muitas mulheres de várias regiões do país viajaram para o
Rio de Janeiro, aliciadas por falsos empresários que lhes pagaram a viagem de
ida e retorno, além de uma refeição básica, a fim de se prostituírem na região
central da cidade ou em alguns clubes noturnos da zona sul. A reportagem
entrevistou várias delas. Todas declararam que se tratava de uma opção difícil
e que caíram na esparrela do comércio sexual em decorrência do aperto econômico
ensejado pela crise que vive o país em tempos de Petrolão. Perderam o precário
emprego que tinham ou simplesmente não conseguiam pagar as contas por ganharem
somas irrisórias em face das necessidades de sobrevivência. Nenhuma manifestou
satisfação com as condições de trabalho.
A reportagem informou acerca do estouro, pela polícia civil
do Rio, de sofisticado esquema de “prostituição chique” com adolescentes que
foram aliciadas em várias cidades brasileiras, mediante anúncio de oportunidade
ímpar para entrar nas passarelas como modelos, ou na carreira artística como
cantantes ou atrizes de cinema. Três luxuosos apartamentos com vista para o
Parque Olímpico foram invadidos pelos policiais. Num deles, confinadas, moravam
as adolescentes. Os outros dois serviam como base para as “atividades
profissionais”. Os dois aliciadores, garotões malhados, vestiam roupas luxuosas
e andavam em carrões importados, mas sumiram. Quando chegaram os policiais, os meliantes se escafederam. Ao que tudo indica, tratava-se de
narcotraficantes tentando lavar dinheiro sujo e buscando faturar um extra com
motivo da festa olímpica.
É claro que nem tudo é contaminação das águas, terrorismo no
Rio Grande do Norte, tiroteios nas vias de acesso ao Rio Olímpico ou cenas de prostituição. A Cidade Maravilhosa ganhou
obras significativas para a mobilidade urbana. A região do Porto foi
definitivamente revitalizada. Museus e espaços públicos foram inaugurados e
ficarão para serem desfrutados pela cidadania. O Parque Olímpico é um marco de
referência na urbanização da zona oeste e as suas instalações são certamente
motivo de alegria e orgulho para cariocas e visitantes. Mas festa olímpica é
evento exigente e a presença de visitantes de outras nacionalidades, acostumados
a que as coisas funcionam a contento, enxergaram as nossas falhas e as
colocaram aos olhos do mundo. É melhor tomar conhecimento desses defeitos e
procurar saná-los. E assumirmos as nossas responsabilidades, num mundo
globalizado, para quando recebermos visitantes estrangeiros em eventos que, no
futuro, sejam novamente programados.
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