Antônio Paim é, entre nós, um dos pesquisadores que mais têm estudado a realidade dos partidos políticos, como fica claro no volume, de sua autoria, dedicado ao assunto no Curso de Introdução ao Pensamento Político Brasileiro (Rio de Janeiro: Universidade Gama Filho, 1994, 13 volumes, edição coordenada por ele). No que tange à realidade européia, Paim escreveu clássico da história do pensamento político intitulado: O Liberalismo Contemporâneo (3ª edição. Londrina: Edições Humanidades, 2007). Divulgo aqui recente resenha que o mestre escreveu sobre obra de Daniel-Louis Seiler, acerca da evolução dos Partidos Políticos na Europa, bem como das relações entre eles.
Comentarei aqui a obra de Daniel-Louis Seiler - Clivages et familles
politiques em Europe. Editions de l´Universite de Bruxelles, 2011.
O Departamento de Ciência
Política da Universidade de Bruxelas corresponde, na atualidade, ao principal
centro de estudos da disciplina na Europa Ocidental. Realiza pesquisas
sistemáticas, muitas delas tornadas públicas no site Digithèque- Université
Libre de Bruxelles, destacando-se, entre as mais recentes aquela em que se
procede ao balanço dos sistemas proporcionais (incluindo os países do Leste
Europeu) e a que foi denominada Le mode
de scutin fait-il l´élection?. Em geral coordenadas pelos conhecidos
estudiosos Pascal Delwit e Jean-Michel De Waele.
Daniel-Louis Seiler é um dos
editores da obra que se tornou fonte obrigatória de consulta, que reúne ampla
caracterização de Les partis politiques
en Europe de l´Ouest (Paris,
Econômica, 1998). É considerado como o principal especialista contemporâneo no
tema. Além dessa edição monumental, publicou, entre outras obras, Les partis politiques (Armand Collin,
2000) e Les partis politiques en
Occident; sociologie historique du phénomène partisans (Ellipses, 2003).
Outra de suas obras muito citada corresponde a La méthode comparative en science politique (Armand Collin, 2004).
Para lembrar, a idéia de clivagem
provém da obra Party Systems and Voter
Alignments (1967), da autoria de
Seymour Lipset (1922/2008) e de Stein Rokkan (1921/1979) e corresponde à busca
de uma alternativa para a camisa de força imposta pelo marxismo --sistematicamente
trombeteada pelos franceses. Consiste na tese de que, com a emergência do
Estado Moderno e o surgimento da Revolução Industrial o conflito social
subdivide-se em quatro grandes blocos: Estado/Igreja; Centro/periferia;
Urbano/rural e Capital/Trabalho.
O livro de Seiler para o qual
estamos aqui chamando a atenção sugere muitas idéias interessantes que vamos
destacar, dispensando-nos de revisitar a minuciosa caracterização a que procede
das principais famílias políticas européias. Seriam o liberalismo, a social democracia; a democracia cristã e o
conservadorismo.
Entre estas destacaria uma
observação que considero muito
elucidativa para o estudo da vertente liberal. Trata-se de que os partidos
políticos que buscam encarná-la têm sido vítimas do próprio sucesso e da
criatividade evidenciada no curso histórico, a partir da constatação de que têm
sido apropriadas pelas outras correntes igualmente destacadas, em especial as
que provêm do socialismo.
A primeira dessas criações diz
respeito ao governo representativo e a sua posterior democratização,
seguindo-se a economia de mercado.
Os socialistas que nasceram
reivindicando a tomada do poder pela força aderem ao sistema
democrático-representativo, especialmente em sua forma parlamentar. Esta seria
a grande bandeira da Segunda Internacional Socialista, defraudada em fins do
século XIX e começos do seguinte. Nas décadas iniciais, sem romper com o marxismo,
que acabaria sendo abandonado nos começos do último pós-guerra, dando
nascedouro à social democracia. Esta abdica simultaneamente da estatização da
economia (aderindo portando à economia de mercado) e à utopia da sociedade sem
classes. Com a adesão dos trabalhistas ingleses (remember Tony Blair), torna-se
a bandeira da maioria dos partidos socialistas da Europa Ocidental.
Outra observação digna de
destaque diz respeito ao fato de que a abordagem da luta política pela ótica
esquerda/direita achar-se-ia, na Europa Ocidental, circunscrita praticamente à
França.
Avança a hipótese de que a
tendência consiste em que venham a consolidar-se e enfrentar-se --considerada a
Comunidade Européia e não os países isoladamente-- três grandes correntes:
liberais, socialistas e sociais-democratas. Nessa hipótese, a social democracia
seria liderada pelo Partido Social Democrata Alemão, contando com a adesão, na
França, do grupo chefiado por Chirac-Villepin, bem como uma parte dos
democratas cristãos (na Alemanha, presumivelmente CSU -União cristã- social da
Baviera). O PS Francês lideraria os socialistas remanescentes na Europa aos
quais se agregaria a extrema-esquerda (presumivelmente os remanescentes do PC
que têm conseguido atrair outros saudosistas do comunismo, sob a bandeira do
que chamam de Esquerda Unida). A facção liberal seria integrada pelo New Labour (ingleses herdeiros de Blair
no Partido Trabalhista), a parcela nuclear da democracia alemã, representada
pela CDU (União Cristã Democrata, principal agremiação dessa corrente na
Alemanha); pelo Partido Popular Europeu (no qual destaca o PP espanhol), o PSD
português e os pós-comunistas poloneses. Cabe lembrar que sobrevivem Partidos
Democratas Cristãos em muitos países europeus. No conjunto da obra, enfatiza o
papel do PSD português, como representante da vertente liberal.
De minha parte, a suposição que
acalentei era a de que a tendência na Europa seria a predominância do embate
entre sociais democratas e liberais conservadores. Tenho em vista a
popularidade, entre nós, alcançada pela divisão desse grupo em liberais conservadores
e liberais sociais, devida ao saudoso José Guilherme Merquior (1941/1991). Na
3ª edição de O liberalismo contemporâneo
(2007) registro o virtual desaparecimento, na Europa, do liberalismo
social, sobretudo em decorrência da fusão do Partido Liberal inglês com o
Partido Social Democrata (fins de 1988).
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