Passada mais de uma década de exercício do poder por parte do
lulopetismo convém fazer um balanço desse período, a fim de tirar algumas
conclusões à luz do que os anglo-americanos denominam de “a prova da história”.
O Partido dos Trabalhadores chegou ao poder com duas cartas
de navegação. Uma, simulada e provisória, elaborada rapidamente por
recomendação dos marqueteiros políticos de Lula e que foi publicada com o
título: “Carta ao povo brasileiro”, ou simplesmente: “Carta do Recife”, datada
no final de 2002. Outra, datada do primeiro semestre desse mesmo ano e
denominada: “Carta de Olinda” e elaborada nos laboratórios da direção do
Partido dos Trabalhadores sob a orientação de José Dirceu, que se converteria
pouco depois no todo-poderoso ministro “Da Casa Civil” do governo Lula. Nela,
os petistas deixavam claro o tipo de gestão pública que pretendiam pôr em
prática.
Na “Carta ao povo brasileiro”, elaborada pelos assessores de
marqueting eleitoral de Lula, destacava-se que o candidato petista, caso fosse
eleito presidente da República, honraria os contratos internacionais assinados
pelo Brasil, manteria o regime democrático de liberdades e tripartição de
poderes, respeitando a Constituição vigente, a rotatividade do poder entre os
partidos, bem como a economia de mercado, junto com os marcos da política
macroeconômica fixados no “Plano Real” e implementados nos dois governos
socialdemocratas de Fernando Henrique Cardoso. Seriam respeitados os tratados
internacionais e a gestão democrática da política externa administrada pelo
Itamaraty, seguindo a tradição de convívio pacífico do Brasil com as outras
nações. A classe média foi conquistada pela “Carta ao Povo brasileiro”.
Contrariamente ao acontecido em eleições anteriores, [1]
aquela deu decisivo apoio ao candidato Lula. Sempre o considerei um populista
por natureza, disposto a fazer o que fosse necessário para conquistar o poder.
Lula, antes de chegar à presidência da República, sempre deu claras provas de
desprezo pelas instituições republicanas. Chamou o Congresso com o apelativo de
“300 picaretas” (apesar de que ele próprio formava parte desse poder, como
deputado federal pelo PT). Não quis assinar a Constituição de 1988 que
sacramentou o regresso da democracia e abriu as portas das eleições aos
exilados do regime militar. Negou-se, também, a apoiar o “Plano Real” elaborado
por Fernando Henrique Cardoso, ministro de Economia do governo de Itamar
Franco, que pôs fim às inflação desenfreada. Mas as eleições, no mundo de hoje,
conquistam-se graças ao trabalho dos marqueteiros, especialmente nos países
emergentes que carecem de uma continuada tradição liberal, como é o caso do
Brasil.
Já na carta de navegação elaborada nos laboratórios petistas
sob a orientação de “Zé” Dirceu, a realidade tinha outras cores. O que os
petistas buscavam, em primeiro lugar, era, no plano econômico, instaurar um
sistema produtivo centrado na intervenção direta do Estado como empresário, [2]
que escolheria, por cooptação, os industriais e empreendedores que deveriam ser
os “campeões de bilheteria”, ou seja, os bem-sucedidos. [3]
Este modelo cooptativo, que já tinha sido posto em prática em outros ciclos do
patrimonialismo modernizador brasileiro (durante o Império, no século XIX e ao
longo dos momentos modernizadores da história republicana do século XX, por
Getúlio Vargas e os militares), foi adotado pelos petistas. O mecanismo
institucional que tornaria possível financiar os empresários cooptados seria
(como durante o ciclo getuliano, os governos de Juscelino Kubitschek e o
período militar), o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES. As
empresas estatais, controladas pelos executivos petistas, permitiriam ao
Partido dos Trabalhadores irrigar o seu caixa com generosos dinheiros desviados
dos lucros destas. [4]
Voltar-se-ia à estatização de empresas lucrativas como a Vale
do Rio Doce (que tinha sido privatizada por Fernando Henrique Cardoso) e de
outras empresas da área de mineração. Dar-se-ia um tinte mais político que
técnico a uma próspera estatal como a Petrobrás, que sob a gestão dos governos
de Fernando Henrique Cardoso tinha sido aberta aos capitais privados,
conseguindo se fortalecer para acelerar a exploração de hidrocarbonetos,
buscando a autossuficiência brasileira nesse setor. O que, no fundo, inspirava
a esse movimento dos petistas, era o denominado eufemisticamente de
“capitalismo de Estado”, que na realidade não é mais do que o desavergonhado
Patrimonialismo . Os petistas diziam se inspirarem nas práticas econômicas da
China, cujos índices de crescimento tinham-se acelerado significativamente nas
últimas décadas. No contexto desse esquema, o PT estava chamado a se tornar um
Partido hegemônico, se constituindo, sob a inspiração da filosofia gramsciana,
no “novo príncipe” da política brasileira.
Já a partir do primeiro governo de Lula (e à sombra da “Carta
de Olinda”) os chamados “Movimentos Sociais”, como o MST (Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra), por exemplo, foram contemplados com generosas dádivas
orçamentárias, para que ajudassem a efetivar os câmbios pretendidos. A Igreja
Católica Progressista recebeu significativa cota política, permitindo que a
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), através da “Pastoral da
Terra” e do “Conselho Indigenista Missionário” (CIMI) indicasse ministros e
funcionários para as áreas sensíveis da Reforma Agrária e das Políticas
Sociais. Foi desenvolvida agressiva política de demarcação de terras indígenas
(como aconteceu em Roraima com a área denominada de “Raposa Serra do Sol”), a
fim de extinguir as agroindústrias mantidas pela iniciativa privada. Foram
atacadas, mediante invasões do MST apoiadas pelo seu homólogo internacional
“Via Campesina”, as áreas de florescentes agroindústrias ao longo do país. Foi
gerado um clima de “insegurança jurídica” para empresas capitalistas ícones do
consumismo burguês como DASLU, em São Paulo (mediante estrondosas ações da
Polícia Federal contra os proprietários das mesmas), com o apoio do Ministério
Público, da Receita Federal e de juízes simpáticos às causas sociais. Foi
incrementada significativamente a propaganda oficial em nível federal e de
Estados em poder do PT e de partidos da base aliada. E acelerou-se, de forma
descontrolada, o crescimento da máquina burocrática, passando de 23 para 43
ministérios, fazendo saltar o gasto público até níveis jamais vistos na
história republicana brasileira.
Em conclusão: o Brasil passou a viver, na última década, uma
espécie de “esquizofrenia política” [5]
proveniente da duplicidade de programas em conflito, adotados à luz das duas
cartas de navegação às que foi feita alusão anteriormente. Um programa que
parecia conduzir ao reforço do modelo socialdemocrata (posto em marcha por
Fernando Henrique Cardoso) é derrubado por outro, de índole declaradamente
patrimonialista e alinhado com o que de mais atrasado há na política mundial
contemporânea.
Indiquemos as principais consequências desse estado de
coisas, que podem ser encaradas como os sete pecados capitais do lulopetismo
nestes doze anos de exercício do poder: 1 – Reforço definitivo ao
Patrimonialismo na gestão do Estado. 2 – Entropia administrativa. 3 – Corrupção
desenfreada. 4 – Enfraquecimento das instâncias institucionais que exercem
controle sobre o gasto público. 5 – Supremacia progressiva do Poder Executivo
sobre o Legislativo e o Judiciário. 6 – Formulação da política externa
brasileira contra os interesses da Nação e de acordo aos interesses ideológicos
do Partido dos Trabalhadores. 7 – Empobrecimento dos brasileiros, regresso da
inflação e aumento descontrolado da violência.
1 – Reforço definitivo
ao Patrimonialismo na gestão do Estado.
Escrevia sir Francis
Bacon (1651-1626), um dos ícones do empirismo inglês, na sua obra intitulada: Novum
Scientiarum Organon (1620), que a experiência humana possui momentos
privilegiados, aqueles em que os segredos da natureza revelam-se, por
instantes, perante a lente dos cientistas. O filósofo e chanceler do Reino da
Inglaterra considerava que alguns fatos constituíam instantiae ostensivae (instâncias
reveladoras, ou casos em que as estruturas da natureza estariam no seu
máximo de manifestação). Esses seriam os momentos de insight das leis que comandam o cosmo.
Os brasileiros
assistem, nos eventos do Petrolão, a uma dessas raras circunstâncias na
evolução do nosso secular Estado Patrimonial, que o público em geral não vê,
mas que é observável por mentes preparadas. A opinião pública não apreende
essas instâncias na sua estrutura profunda, mas percebe que algo está errado na
condução do país. E paga a conta. O contribuinte que o diga. Sente já no seu
bolso os desmandos da empresa patrimonialista, montada passo a passo, com
paciência de sindicalista que assiste à assembleia para, esvaziada pelo
cansaço, aprovar a greve almejada. No caso do Petrolão, esta seria a última
etapa, a mais visível, de aparelhamento do sistema produtivo por uma ávida
elite preparada para a função de privatiza-lo tudo em benefício da burocracia
estatal presidida pelo Partido. [6]
Não é de hoje o
projeto dessa empresa patrimonialista, que teve etapas memoráveis. Em todas
elas, a ciência aplicada foi posta serviço da burocracia estatal, a fim de
garantir a eficiência na racionalização da empresa do rei ou do primeiro
mandatário. Foi assim nas reformas pombalinas, na segunda metade do século
XVIII, quando o marquês de Pombal amarrou o sistema produtivo ao redor dos
Monopólios Reais, fora dos quais ninguém conseguiria sobreviver. Assim
aconteceu nas reformas modernizadoras do Império, com o Monarca como centro da
atividade econômica, colocando sob o seu tacape aqueles que quisessem se
apresentar como empresários independentes do Trono. As agruras sofridas pelo
visconde de Mauá, um dos nossos próceres do livre empreendedorismo, estão aí
para provar a eficiência do projeto patrimonialista. Assim aconteceu no ciclo
modernizador do getulismo, com as reformas ensejadas pela elite gaúcha
comandada com mão de ferro pelo próprio Getúlio Vargas, com o auxílio dos
jovens intelectuais que integravam a Segunda Geração Castilhista, com Lindolfo
Boeckel Collor à frente, tendo previamente sido cooptada a jovem elite
tenentista no Clube 3 de Outubro. Assim ocorreu no ciclo militar ao redor da
proposta modernizadora em andamento nos terrenos econômico e social, pensada no
petit comité que reunia, ao redor do
General Presidente, a elite tecnocrática e militar, responsável por traçar o
andamento da máquina pública rumo ao Brasil Grande.
O lulopetismo tentou
copiar esse esquema de modernidade ao redor do Estado empresário,
racionalizando ao máximo a máquina tributária, centralizando as receitas em
favor da União (com detrimento de Estados e Municípios), utilizando como mão
distribuidora de recursos entre os empresários cooptados o BNDES que partiu,
também, para aliciar fidelidades internacionais no Hemisfério Sul, na tentativa
de dar vida a essa nova diplomacia que está acabando de desmontar a primorosa
máquina construída, na aurora da República, pelo Barrão do Rio Branco no
Itamaraty.
O mecanismo foi o
mesmo do ângulo econômico: tudo centralizado ao redor dos Monopólios oficiais,
dentre os que se destacam a Petrobrás e a Eletrobrás. Ao colocar as empresas
públicas produtoras de energia como ponta de lança da dominação estatal sobre a
economia, o modelo modernizador lulopetista assemelha-se, assim, ao posto em
prática por Vladimir Putin, no seio do secular patrimonialismo russo, com a
hegemonia das empresas produtoras de gás e petróleo.
Proveniente do meio
sindical, Lula caprichou no sentido de dominar completamente os fundos de
pensão das estatais, dos bancos oficiais e dos sindicatos controlados pela CUT,
libertando-os de prestar contas dos seus gastos e de serem fiscalizados pelo
Tribunal de Contas da União. As duas entidades bancárias controladas pelo
governo, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, foram postas a serviço
do financiamento dos projetos sociais do governo, deixando em segundo plano a
transparência dos procedimentos seguidos. A Caixa Econômica Federal amarga hoje
dificuldades ensejadas pelas políticas populistas da presidente Dilma,
notadamente o programa “Minha casa minha vida”.
De outro lado, os
institutos de pesquisa que prestavam serviços ao Estado para identificar a
conjuntura econômica e social do país, foram aparelhados pelo partido do
governo, dando ênfase à divulgação de dados convenientes para manter a
popularidade deste e ocultando estatísticas incômodas. Foram, assim,
desmoralizados na seriedade que tinham conquistado em décadas anteriores o IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e o IPEA (Instituto de
Pesquisas Econômicas Aplicadas). Neste último, os pesquisadores mais renomados
foram obrigados a sair da entidade.
Fazem-se sentir hoje
os efeitos práticos dessa política patrimonialista: enriquecimento rápido dos
agentes públicos (garantida a sua segurança nas sombras da nossa complexa
legislação, que coloca sobre todos a espada de Democles da insegurança
jurídica, mas que para os amigos do rei constitui garantia de que nada
acontecerá com eles). Vide as penalidades muito diferentes impostas no
julgamento do Mensalão: pesadíssimas para os que foram cooptados no setor
privado pelo turbilhão de dólares na cueca e nas malas gordas de notas,
levíssimas para os arquitetos dos malfeitos
(para utilizar a terminologia do agrado da presidente Dilma). O empresário que
serviu de cabeça de ponte para os desvios, Marcos Valério de Souza, amarga hoje
condena a mais de 40 anos de prisão, enquanto os mandantes do esquema petista
de corrupção, que cooptaram Valério e os demais empresários involucrados no Mensalão,
sofreram punições bem leves, ridículas poder-se-ia dizer, em face da gravidade
das penas impostas aos agentes privados.
A maciça divulgação
dos feitos da ladroagem, notadamente no caso do Petrolão, estão sensibilizando
a opinião pública de que há algo de errado na estrutura do nosso Leviatã. Foi
de tal grau a tsunami da corrupção que inundou o quintal do dia a dia do
cidadão comum. Enquanto itens básicos da saúde pública faltam nas Unidades de
Pronto Atendimento, a elite larápia tem pronto atendimento de primeiro mundo no
Hospital Albert Einstein, o mais caro do país. Enquanto já começa a sobrar
calendário e a faltar dinheiro na metade do mês no bolso dos contribuintes, os
dólares desviados sobram nas contas milionárias da petralhada e dos empresários
corruptos. Enquanto a sociedade almeja por transparência na prestação de
contas, a presidência da República é pródiga em enrolação e em contradições
veiculadas pelos porta-vozes oficiais. Enquanto se esperava que o Ministério da
Justiça cumprisse com o seu papel de facilitador para que a Justiça operasse
livre e célere, converteu-se em guiché de reclamos dos larápios e em janela por
onde assomam os feitores dos desmandos, que buscam pressionar politicamente os magistrados
honestos.
Com o lulopetismo, a tendência patrimonialista herdada da
cultura ibérica, passou a ser prevalecente na realidade brasileira. Antônio
Paim já tinha afirmado isso em esclarecida análise, feita em 2002, acerca da
mentalidade petista. [7]
O PT encara o Estado como negócio particular de caráter familiar. Administra-o
como família sindical, de modo semelhante a como os militares entendiam o país
como uma grande família militar. Não é o Partido dos Trabalhadores quem deve se
acomodar à realidade brasileira. É o país que deve ser posto a serviço dos
interesses do Partido. Tudo é pensado em função de perpetuar a hegemonia
petista. O público é tratado como privado, como assunto de família. A amante
oficial de Lula, Rosemary Noronha, transitava tranquilamente da alcova
presidencial instalada no “Aerolula”, nas viagens internacionais do presidente,
como pessoa que prestava serviços particulares ao chefe e como assessora que
cuidava das milionárias transações financeiras do mandatário, além de alguns
trabalhos de intermediação clientelista para nomear funcionários do segundo
escalão. Estes são dados de domínio público, divulgados amplamente pela
imprensa. [8]
Ainda no seio dessa tendência patrimonialista, o governo,
através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou
a favorecer, com generosos créditos, empresários escolhidos pela Presidência da
República para serem guindados às alturas de mega-empreendedores,
entregando-lhes, entre outras coisas as obras do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC), assim como outras grandes iniciativas (transposição das
águas do Rio São Francisco, ampliação da rede ferroviária do Nordeste, etc.).
Esses procedimentos caracterizam-se pela falta de transparência que facilita o
desvio do dinheiro público.
O Executivo favoreceu, também, com empréstimos brandos a
governos estrangeiros, com a finalidade de desenvolver projetos de engenharia e
prospecção petroleira que contratem empresas brasileiras indicadas pelo
governo. Foram feitas, assim pesadas inversões em Cuba, na Venezuela, em
Angola, no Equador, na Bolívia, em países centro americanos, etc., sem que se
explicasse claramente à opinião pública e ao Congresso os benefícios que daí
derivariam para a economia brasileira. Foram desenvolvidos caros projetos
energéticos no Brasil, em colaboração com a Venezuela, como é o caso da
refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Como em toda transação entre amigos, o “do ut des” tem sido a regra seguida
fervorosamente por aqueles que se beneficiaram com a generosidade oficial:
conhecida empresa de engenharia, favorecida pelo governo petista, paga as
viagens de Lula aos países africanos, remunerando-o regiamente pelas suas
conferências.
A
lei é entendida pelos governantes patrimonialistas como pura formalidade a ser
posta a serviço dos donos do poder. Valha aqui uma comparação entre a
legislação imperante em dois contextos: o representado pelos Estados
contratualistas e o concretizado nos Estados patrimoniais. Os contratualistas,
herdeiros da tradição feudal que opunha nobres e burgueses no início da era moderna,
se consolidaram a partir da luta de classes pela posse do poder e de uma
diferenciação clara de interesses por parte destas, que deram ensejo ao
surgimento de regimes contratualistas. [9]
Na Europa Ocidental, onde se deu tal forma de Estado, surgiram as teorias do
“contrato social”. Já os Estados patrimoniais se sedimentaram ao ensejo da
hipertrofia de um poder patriarcal original, que alargou a sua dominação
doméstica sobre territórios, pessoas e coisas extrapatrimoniais, tratando tudo
como posse de família e impedindo a diferenciação da sociedade em classes com
interesses materiais diferentes. [10]
Enquanto
nos Estados contratualistas o poder estava a serviço da sociedade, havia
clara diferenciação entre a esfera pública e a privada, a lei, claramente
formulada, possuía uma dimensão impessoal e era aplicada universalmente com a
ajuda de uma burocracia racional treinada no valor da eficiência, nos Estados
patrimoniais a sociedade estava a serviço do poder, a esfera
pública confundia-se com a privada, a lei – essencialmente vaga - possuía uma
dimensão pessoal e casuísta em função da vontade do governante e surgia um
estamento pré-burocrático que oferecia dificuldades para vender facilidades.
Ora, o Estado patrimonial
luso-brasileiro sempre foi useiro e vezeiro em formular leis que se acomodassem
às necessidades dos donos do poder. Foi assim no ciclo pombalino, com as leis
feitas na medida certa pelos juristas do Rei para proteger os monopólios da
Coroa e esvaziar as tentativas das classes poderosas: a aristocracia e a
burguesia, no sentido de ganhar poder perante o Estado patrimonial. Foi assim
ao longo do Império, com os burocratas do Rei comodamente instalados no Banco
do Brasil e no Ministério da Fazenda e prontos para fazer afundar as
iniciativas de empresários quixotescos como Mauá, que aspiravam a se vincular
aos grandes centros da economia mundial, a fim de não dependerem do Estado: o
fracasso do visconde veio por este caminho. Foi assim no longo ciclo getuliano,
com a burguesia paulista sendo derrotada pelos donos do poder na Revolução
Constitucionalista de 32, tendo sido alijada do mesmo durante longo tempo. Não
foi diferente no ciclo militar, com os generais formulando verticalmente os
projetos estratégicos que garantiriam o equacionamento da questão da
“circulação” (integração nacional), apontada por Oliveira Vianna, e
privilegiando as empresas estatais que, sob seu comando, passaram de 92 para
mais de 400.
Não ocorreu de outra forma
na retomada da vida democrática na República Nova, com agressiva política
tributária montada em cima da iniciativa privada. As privatizações dos governos
de Fernando Henrique, bem como o Plano Real (iniciativas fortemente combatidas
pelos expoentes mais radicais do patrimonialismo como Lula e os seus
seguidores), se bem conseguiram arejar a atmosfera antes irrespirável pelos
ácaros do nepotismo e da reserva de mercado que emanavam das estatais,
terminaram sendo minimizadas pela maré montante do estatismo orçamentívoro do
lulismo nos treze anos que leva no poder.
Uma iniciativa tomou corpo
de destaque ao longo do ciclo lulopetista: o Executivo muniu-se de poderosa
máquina propagandística que, aliada aos marqueteiros de plantão, conseguiu
traduzir para o povo ignaro, em linguagem simples e coloquial, as teses da
proposta lulopetista, a da Carta de Olinda, que passou a comandar como espírito
das trevas as políticas sociais. O orçamento do Executivo destinado à
propaganda, no ciclo lulopetista, simplesmente disparou. Segundo pesquisa
realizada pelo jornal O Estado de São
Paulo, em 10 anos de governo petista (2003-2013) foram desembolsados 16
bilhões de reais nesse item. [11] Nisso os petistas foram
eficientes, como na consolidação do nacional-socialismo na Alemanha dos anos
trinta foi essencial, para o triunfo de Hitler, o magno empreendimento de
propaganda montado por Goebbels. Os méritos no caso brasileiro certamente podem
ser colocados no altar de José Dirceu e da nomenclatura estatizante do Partido
dos Trabalhadores.
Uma última observação sobre
o reforço ao patrimonialismo na gestão do Estado por parte do PT. Ação típica
de lideranças patrimonialistas consiste na cooptação de todas as forças que
possam competir com os donos do poder, especialmente se estiverem vinculadas às
massas populares. No caso do lulopetismo, as ligações entre o Executivo e os
chamados “movimentos sociais” ficaram claras desde o início do primeiro governo
Lula e continuaram ao longo do seu segundo mandato, bem como nos mandatos de
Dilma. Lula, do alto do palanque perpétuo em que se instalou, tem ameaçado com
“colocar na rua o exército de Stédile”, no sentido de que o MST e assemelhados
ocuparão as cidades na eventualidade de alguma ameaça significativa em face do
poder hegemônico petista. Diante das contradições que se tornaram evidentes
dentro do próprio governo de Dilma no segundo mandato, o recado de Lula foi
claro: pedir o impeachment da chefe do Executivo no caso do Petrolão equivale a
chamar à guerra os tais “movimentos sociais”. Evidente saída de constrangimento
ilegal que tenta desmoralizar qualquer oposição feita pela sociedade ao
governo. Algo semelhante ao que acontece na Argentina, onde os militantes do
peronismo constituem peça chave na desmoralização dos oposicionistas, chegando
até ao assassinato de algum fiscal bisbilhoteiro, como ocorreu recentemente com
o promotor Alberto Nisman. Voltando às tramoias lulopetistas para
desestabilizar oposicionistas, lembremos as denúncias que o delegado Tuma Júnior
divulgou na sua obra intitulada: Assassinato
de reputações, um crime de Estado. [12] Afinal de contas, os
lulopetistas estão movidos pelo modelo de ética totalitária, segundo o qual “os
fins justificam os meios”.
A utilização da força bruta
como instrumento de poder está no cardápio lulopetista e não foi servida ao
acaso. Ora, como o PT se fortaleceu na terceira etapa de sua caminhada (correspondente
ao exercício do poder), sob a inspiração de duas cartas de navegação
(mencionadas no início deste trabalho), é possível, em momentos de crise, tomar
elementos da primeira dessas cartas para inspirar respostas adequadas, quando
as atividades partidárias formais encontrarem obstáculos por parte dos
oposicionistas. Como a “Carta ao Povo Brasileiro”, que constitui a face “legal”
do Partido e à luz dela Lula conquistou o poder em 2002, em face de um
questionamento da legitimidade por motivo da corrupção nos momentos atuais, é
bem possível tirar do saco de maldades ações inspiradas na primeira carta de
navegação (Documento de Olinda), afinadas com procedimentos totalitários.
É o que Lula tentou ao
ameaçar com pôr na rua o “exército de Stédile”. Essa dinâmica foi posta em
prática ao longo do primeiro governo Dilma, por intermédio do representante de
Lula no gabinete ministerial, Gilberto Carvalho, chefe da pasta do Gabinete
Civil da Presidência da República, que ameaçou “fazer o diabo” para que a
candidata petista ganhasse as eleições de outubro de 2014. Nestes últimos
tempos, Lula deixou de agir por intermédio do seu instrumento no antigo
ministério da Dilma e passou a falar diretamente (como no discurso recente na
sede da Associação Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro, em 23/02/2015). [13]
Um último aspecto da
cooptação dos violentos para intimidar oposicionistas. Foram preocupantes e
muito graves os indícios de colaboração entre militantes petistas de São Paulo
e membros do Primeiro Comando da Capital [14] que, como todo mundo sabe,
constitui a maior organização criminosa do Brasil que busca controlar os
presídios em várias regiões do país. Fica uma pergunta no ar: a quem beneficiam
ações criminosas de guerrilha urbana em cidades situadas em Estados governados
pela oposição? Ora, as ações criminosas do PCC têm ocorrido, com regularidade
periclitante, em períodos pré-eleitorais, ao longo da última década.
2 – Entropia
administrativa.
Esta é a principal responsável
pelas dificuldades econômicas que o país vive atualmente, com a volta da
inflação, à qual tinha sido colocado limite com o “Plano Real” adotado por
Fernando Henrique Cardoso. Decisões contraditórias são tomadas pelo governo nos
mais variados campos: educacional, de saúde pública, segurança cidadã,
logística de portos, estradas e aeroportos, etc., em virtude da duplicidade de
princípios inspiradores das políticas públicas, correspondentes às duas cartas
de navegação que foram mencionadas. Poderia se dizer que foi rendido um tributo
ao marxismo vulgar ao se afirmar praticamente, na gestão governamental
ininteligível, que “as contradições são o motor da história”.
Um dos principais aspectos contraditórios foi a pretensa
redenção dos pobres mediante políticas de distribuição de renda (sugeridas pelo
Banco Mundial e adotadas pelos governos socialdemocratas e petistas). A ideia
de fazer justiça social distribuindo renda é sedutora. Mas deve ser concretizada
de forma responsável. Não foi isto que aconteceu com as políticas petistas
nesse campo que, segundo o governo, beneficiaram 50 milhões de brasileiros. Ao
ser coberta boa parte da população carente com o benefício da “Bolsa Família”,
distribuída diretamente pelo governo sem ter sido posto em marcha, previamente,
um mecanismo que permitisse o controle sobre os beneficiários, foi aberta a
porta à corrupção nesse setor. Foram detectados inúmeros casos de beneficiários
fantasmas ou com duplicidade de benefícios. A “Bolsa Família” converteu-se num
benefício “escatológico” ao não ser sinalizado claramente qual é o critério que
indica o termo do mesmo. Em várias regiões foi observado o fenômeno do abandono
do emprego por parte dos cidadãos mais pobres, com a finalidade de receber o
benefício oficial. O senador Jarbas Vasconcellos denunciou que o lulopetismo
organizou, assim, “o maior programa de compra de votos do hemisfério ocidental”.
[15]
3 – Corrupção
desenfreada.
Este vício foi estimulado pelo Executivo mediante a
estratégia de cooptação dos partidos políticos, no seio de um esquema de
distribuição sistemática de dinheiros públicos para comprar apoio no Congresso.
Esse esquema, denominado de “Mensalão” (em referência ao pagamento mensal de
propinas aos parlamentares fiéis ao governo), foi investigado pelo Ministério
Público e deu ensejo a importante processo julgado pelo Supremo Tribunal
Federal, entre 2012 e 2014. Essas duas instâncias da magistratura,
consequentemente, foram objeto de feroz campanha de difamação, posta em marcha
por Lula e o seu partido, com apoio da “Base Aliada”.
Foram encaminhadas pelo Partido dos Trabalhadores ao
Congresso, em 2013, duas propostas de emenda constitucional (PEC) elaboradas
pelo governo Lula, com a única finalidade de diminuir poderes ao Supremo
Tribunal Federal e ao Ministério Público, numa clara invasão de competências do
Executivo sobre o Poder Judiciário. Isso equivaleu a uma tentativa de golpe de
Estado perpetrado desde a Presidência da República. Isso feria a independência
dos Poderes Constitucionais. De forma semelhante, a imprensa livre tem sido
combatida pelos militantes petistas, que fizeram chegar ao Congresso, através
de parlamentares governistas, vários projetos de lei para limitar as funções
das empresas de comunicação e submetê-las, como acontece na Argentina, aos
caprichos dos governantes de plantão.
Em face do segundo affaire de corrupção dos governos
petistas, o denominado Petrolão, a corrupção atingiu níveis nunca vistos e
chegou a colocar em risco a sobrevivência da principal estatal brasileira, a
Petrobrás. [16] O
esquema de corrupção aponta para uma sofisticada empresa de desvio de recursos
públicos com finalidade político partidária de irrigar o caixa do PT. Ao que
tudo indica, não se tratou simplesmente de uma iniciativa de achaque praticada
por empresários corruptos. Foi uma ação friamente planejada dentro do próprio
governo, cooptando empresários que aceitaram formar parte de um clube de
privilegiados com as obras de infraestrutura da Petrobrás. Como frisou o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na dura resposta que deu ao governo,
diante da infundada denúncia de Dilma de que os sistemáticos desvios de recursos
da Petrobrás tinham começado no governo tucano, “(...)
no caso do ‘Petrolão’, não se trata de desvios de conduta individuais de
funcionários da Petrobras, nem são eles, empregados, em sua maioria, os
responsáveis. Trata-se de um processo sistemático que envolve os governos da
Presidente Dilma (que ademais foi presidente do Conselho de Administração da
empresa e Ministra de Minas e Energia) e do ex-presidente Lula. Foram eles ou
seus representantes na Petrobras que nomearam os diretores da empresa ora
acusados de, em conluio com empreiteiras e, no caso do PT, com o tesoureiro do
partido, de desviar recursos em benefício próprio ou para cofres partidários”. [17] O
tamanho do montante desviado no caso do Petrolão, segundo cálculos de
especialistas, equivaleria a “33 Mensalões”. [18]
4 – Enfraquecimento das
instâncias institucionais que exercem controle sobre o gasto público.
Os institutos que, no Brasil, exercem controle sobre o gasto
público são o Tribunal de Contas da União (órgão vinculado ao Poder
Legislativo), o Ministério Público e a Lei de Responsabilidade Fiscal, que põe
um limite aos gastos de municípios, Estados e União, para que os gestores não
gastem mais do que é arrecadado. Segundo decisão tomada por Lula, o tribunal
mencionado não poderia mais exercer controle sobre os gastos dos sindicatos,
sem que importasse o montante de dinheiro público recebido do governo. Tal
medida deu às organizações sindicais um poder extraordinário à margem da lei,
de forma a convertê-los em Estados dentro do Estado, configurando aquilo que o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso denominou, com propriedade, de
“peronismo à brasileira”.[19]
De outro lado, a Lei de Responsabilidade Fiscal foi derrogada na prática por
Lula, quando passou a ignorar a sua aplicação naqueles municípios administrados
por prefeitos do PT.
5 – Supremacia
progressiva do Poder Executivo sobre o Legislativo e o Judiciário.
O Executivo, na tradição política republicana, tornou-se,
como dizem os franceses, um “presidencialismo imperial”. Jean-François Revel
(1924-2006) caracterizou em livro memorável [20]
essa tendência que afeta também a vida política dos Franceses. Referindo-se a
esse mal na época de François Miterrand (1916-1996), o presidente socialista
que ficou 14 anos no poder entre 1981 e 1995, escrevia: “A Constituição (...)
queria garantir ao Estado um executivo estável, forte e eficiente, respeitando,
ao mesmo tempo, os princípios da democracia. Mas, com o correr dos anos, a
instituição presidencial virou onipotente, irresponsável e – paradoxalmente –
incompetente. Querendo abarcar a totalidade da vida pública, o poder
presidencial invade todos os domínios, paralisa a ação e não dá a mínima para a
sociedade que não consegue reforma-lo, enquanto que os poderes legislativo e
judiciário perdem a sua autoridade, os costumes políticos se corrompem e
instâncias desprovidas de legitimidade democrática ditam a sua lei. (...)”.
Como se pode observar, a semelhança com o Brasil de hoje é bem
grande. Porque a história francesa se assemelha muito à brasileira, no que
tange à forma como se consolidou o Estado, com um Executivo hipertrofiado. Lá
como cá, o Executivo hipertrofiado instalou no Estado a irracionalidade e a
improvisação. Lá como cá, essa pesada herança finca profundas raízes na
história. Na França, o imperialismo presidencial é herdeiro direto do espírito
absolutista de Luis XIV (1638-1715), que cunhou a famosa frase: “L´État c´est moi” (“O Estado sou eu”),
que passou para os jacobinos, no final do século XVIII, que protagonizaram as
desgraças da Revolução Francesa, ao colocar por cima de tudo e de todos o poder
total do Diretório, que terminou sendo canalizado pelo genial Napoleão
Bonaparte (1769-1821) no seu projeto de imperialismo unipessoal, que modificou
as fronteiras da Europa, entre 1804 e 1814, com um saldo trágico de 3 milhões
de vítimas.
No Brasil, o “presidencialismo imperial” é filho do Castilhismo,
que constituiu a primeira tentativa bem sucedida de ditadura republicana ao
redor de um Executivo-legiferante. Por sua vez, o Castilhismo inspirou-se no
despotismo esclarecido do Marquês de Pombal, com a tendência estatizante na
política, na economia (com os monopólios estatais) e na cultura (com a nova
forma de saber pseudocientífico garantido pelo Estado onipotente e legitimador
das suas aventuras). Getulismo, regime militar e, hoje, lulopetismo, seriam
frutos dessa árvore do absolutismo caboclo.
Convenhamos que com o
Getulismo e com o regime de 64 houve centralização do poder no Executivo, mas
com o cuidado de dar satisfação à sociedade por razões tecnocráticas, mantendo
um mínimo de eficiência e de decência no trato da coisa pública. No entanto,
infelizmente, com o correr das décadas, o Executivo imperial perdeu toda a
vergonha na cara e é exercido, hoje, como mandato unipessoal pela presidente,
que manda e desmanda na economia, na política e na cultura, sem dar a mínima
importância para os anseios e os reclamos da sociedade. O país é gerido como
apêndice familístico do PT e dos seus obscuros interesses sindicais, que enxergam
tudo como passível de privatização em benefício da nova oligarquia, que aspira
a se perpetuar no poder.
Em relação à desagregação social e à sem-vergonhice de que se
revestiu, na França, o “absolutismo ineficaz” do Presidente da República,
Jean-François Revel escreveu: “(...) É o presidente que está a serviço do
Estado, ou o Estado que está a serviço do presidente? Aí está toda a questão da
Vª República. Essa questão não consiste, pois, em saber quais são as falhas de
caráter de François Miterrand ou de não importa qual outro presidente francês.
A questão que se levanta é a de saber que a pendente das instituições as conduz
a ampliar os seus defeitos em detrimento de suas qualidades, que acabam por
desaparecer. De qualquer ângulo que se observe, o sistema presidencial francês
parece conter um vírus fatal, pois ele conduz, sem que freio nenhum possa
impedir, a este resultado: existe na França um único poder, o do presidente e,
ainda mais, um poder que se converte muito rapidamente em instância pessoal,
arbitrária e mesmo caprichosa, sem limite, sem decência, sem a menor sanção,
senão a sanção final pela demissão graças ao sufrágio universal, cuja
intervenção é infelizmente muito rara para dissuadir o soberano de confundir,
ao longo de sete anos, a sua subjetividade com as leis da República”. [21]
Esta tendência, que já estava presente na história
republicana brasileira (como, por exemplo, no longo ciclo getuliano, que se
estendeu de 1930 até 1945 e de 1951 até 1954), reforçou-se nos últimos treze
anos, com o abuso da prática autoritária das “medidas provisórias” (ou
legislação por decreto presidencial), com as que Lula e Dilma praticamente
paralisaram os trabalhos do Legislativo, gerando, de outro lado, constantes
atritos com o Poder Judiciário, mediante iniciativas destinadas a diminuir o
poder deste. [22]
Os regimes populistas latino-americanos concordaram no
esforço em prol de conferir primazia ao Executivo. Isso também acontece na
Argentina, na Venezuela, no Equador, no México, na Nicarágua, etc. Do ponto de
vista da filosofia política, esse fenômeno se explica, em boa medida, pela
presença daninha de dois princípios negativos: a filosofia rousseauniana, de um
lado, com o conceito de “soberania popular ilimitada” e, de outro lado, a ideia
positivista de que, para manter o progresso, é necessário atacar a liberdade,
mediante a implantação de uma ordem republicana autoritária. Esse é o drama
latino-americano, assim como, na França de Tocqueville, o absolutismo foi
potencializado pela adoção de uma ideia despótica de República, deformada pelo
pensamento de Rousseau e dos Jacobinos. [23]
6 – Formulação da
política externa brasileira contra os interesses da Nação e de acordo aos
interesses ideológicos do Partido dos Trabalhadores.
A partir dos governos de Lula e continuando nas gestões de
Dilma Roussef, a política exterior do Brasil passou a seguir os ditames do Foro
de São Paulo. [24] O
Brasil converteu-se, assim, em repetidor das consignas socialistas do chavismo
e do castrismo. No seio dessa política externa alinhada com o Foro de São
Paulo, o Brasil mostrou-se favorável às FARC, atacando as políticas antiterroristas
do governo colombiano e se revelando seguidor incondicional da revolução
chavista, nas decisões tomadas no seio da UNASUR, inclusive legitimando, de
forma atabalhoada, a discutível vitória eleitoral de Nicolás Maduro na sucessão
de Chávez, na Venezuela, no início de 2013.
Essas decisões foram em geral contrárias de forma sistemática
aos Estados Unidos e favoráveis, em geral, a governos de duvidosa índole como o
Irã e a Coréia do Norte, dando continuidade à diplomacia terceiro-mundista que
os “barbudinhos” do Itamaraty tentaram impor em décadas anteriores. A
resultante disso foi a criação do clima de insegurança jurídica que prejudicou
a entrada de investidores no Brasil. O MERCOSUL terminou engessando a
possibilidade de o Brasil fazer pactos comerciais bilaterais, ao ser imposta a
regra de que estes somente poderiam ser aprovados mediante aprovação das Nações
membros do mencionado organismo. Em face da dinâmica do Pacto do Pacífico que
foi posto em marcha pelo México, o Chile, o Perú e a Colômbia, o MERCOSUL se
apresenta hoje como uma organização que perdeu o seu sentido original de pacto
comercial, para virar aliança política a favor dos populismos
latino-americanos.
De outro lado, o Brasil relegou a segundo plano os interesses
da indústria e do comércio, ao se alinhar, por motivos ideológicos, com países
que atacam aos produtores brasileiros. Isso aconteceu, por exemplo, com a
política de estatizações de empresas produtoras de petróleo e gás na Bolívia e
com as alianças com Chávez. Os venezuelanos simplesmente ignoraram a
contribuição a que Chávez tinha se comprometido na construção da refinaria
Abreu e Lima em Pernambuco. Nem um só tostão foi pago pelos “amigos chavistas”.
Essa política internacional, mais ideológica do que fundada em princípios,
derrubou, de forma definitiva, a tradição de seriedade que tinha sido
conquistada pela diplomacia brasileira, ao longo dos últimos dois séculos.
7 – Empobrecimento dos
brasileiros, regresso da inflação e aumento descontrolado da violência.
O sonho populista dos povos tem um alto custo. O líder
messiânico é parecido com aqueles aracnídeos que paralisam as suas vítimas para
lhes sugar a vida. Os países latino-americanos pagam o seu preço hoje ao
messianismo populista. Os argentinos pagam-no ao peronismo. Os brasileiros ao
lulopetismo.
O populismo de Lula levou-o a subir no palanque eleitoreiro
do presidente boliviano Evo Morales; com ele apareceu ostentando vistoso colar
de folhas de coca. O sinal tinha sido dado: Evo simplesmente duplicou a área de
cultivo de coca para o refinamento da cocaína que é distribuída nas cidades
brasileiras. O crack as invadiu, ao longo da última década. Hoje o Brasil
possui um perverso índice de narcodependência: o crack é consumido em 97 por
cento dos municípios do país. São aproximadamente um milhão e meio de viciados
que perambulam pelas cidades cometendo assaltos e assassinatos. Os índices de
violência fugiram ao controle.
O país, empobrecido, vê regressar a inflação e cair os
índices de crescimento. O desemprego aumenta e já, numa perspectiva
estatisticamente válida e não maquiada pela propaganda oficial, chega aos
índices ibéricos. [25]
Não foram feitas todas as obras de infraestrutura de que o país precisava para os
a Copa do Mundo de Futebol de 2014 e estão muito atrasadas as correspondentes
às Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro, As exportações de produtos agrícolas
sofrem com essa falta de infraestrutura. O Brasil perde compradores importantes
da soja, por exemplo, devido ao não cumprimento de prazos. Países vizinhos que
cuidaram da infraestrutura, como o Paraguai com as suas hidrovias, vão
avançando sobre esses mercados.
O Brasil reduziu a sua margem de segurança em matéria
monetária e de comércio exterior. Em 2013 havia um buraco de 67 bilhões de
dólares nas contas externas. As inversões do governo e do setor privado caíram
de 19,5% (em relação ao PIB de 2010) para 18,1% (em 2012). A propaganda oficial
não consegue esconder a perda da capacidade de compra do cidadão médio,
atribulado pela carga tributária mais pesada do Planeta, que o leva a trabalhar
uma média de cinco meses ao ano para pagar os impostos cobrados pelo fisco nas
instâncias municipal, estadual e federal.
Conclusão.
Está a sociedade brasileira paralisada? Certamente não. Aqui
e ali aparecem manifestações de descontentamento diante da crise republicana em que o PT mergulhou o Brasil. As críticas se multiplicam em
todos os quadrantes sociais, desde os intelectuais, passando por políticos da
oposição, os militares, os magistrados e as pessoas da classe média e de estratos
populares. As manifestações de inconformidade apareciam na imprensa, nas redes
sociais e ganharam as ruas. Manifestações de protesto e repúdio contra os
abusos do PT e aliados aconteceram em Junho de 2013, tendo-se repetido em 2014, antes da Copa Mundial de Futebol. Na primeira série de manifestações, em 2013, milhares
de jovens tomaram as ruas de cidades grandes, médias e pequenas do norte ao sul
do Brasil, tendo deixado perplexos os petralhas e os Partidos aliados. Era só a
presidente Dilma aparecer em público, que manifestantes irados contra os abusos
do governo apareciam para protestar. A
eleição presidencial não garantiu a ela o desempenho tranquilo do poder. Foi
ganha no tapetão das bolsas e das benesses distribuídas a torto e à direito. A
contagem dos votos, de outro lado, foi suspeita.
Importante no Brasil tem sido a
reação da magistratura contra os abusos do partido do governo, que passa por
cima da legislação e demais instituições republicanas. Ao ensejo do julgamento
do Mensalão foram bem claras as palavras dos juízes que condenaram os larápios
e os políticos corruptos. Críticas semelhantes estão sendo feitas pelo corajoso
juiz Sérgio Moro, diante das tentativas do partido do governo para esvaziar as
investigações por ele comandadas no caso do Petrolão. O juiz Sérgio Moro se pronunciou a respeito dos
encontros que o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo teve com os advogados
dos réus da Operação Lava-Jato deflagrada pela Justiça Federal do Paraná. O
magistrado escreveu: “Existe o campo próprio da Justiça e o campo próprio da
política. Devem ser como óleo e água e jamais se misturarem. A prisão cautelar
dos dirigentes das empreiteiras deve ser discutida, nos autos, perante as
Cortes de Justiça. Intolerável, porém, que emissários dos dirigentes presos e das
empreiteiras pretendam discutir o processo judicial e as decisões judiciais com
autoridades políticas, em total desvirtuamento do devido processo legal e com
risco à integridade da Justiça e à aplicação da lei penal”.
Mas a propaganda oficial é intensa e intensas são, também, as
tentativas de calar a oposição e a imprensa livre. Conseguirá a sociedade
brasileira fazer frente ao fantasma da ditadura civil, como a que terminou por
prevalecer na Venezuela e a que está a caminho na Argentina?
[1]
Devido ao perfil radical apresentado por Lula nas campanhas presidenciais de
1988, 1993 e 1997, o candidato petista foi fragorosamente derrotado por
Fernando Collor de Melo (em 1998) e por Fernando Henrique Cardoso (em 1993 e
1997). O programa de governo de Lula afinou-se, nessas oportunidades, com o
modelo comunista cubano, constituindo uma prova clara do atraso do pensamento
petista, que não foi capaz de evoluir de acordo aos novos tempos, depois da
derrubada do comunismo no leste europeu, no final do século XX.
[2]
Este modelo é arcaico e remonta-se ao ciclo pombalino que teve o seu auge na
segunda metade do século XVIII, com as reformas da monarquia portuguesa
efetivadas pelo Marquês de Pombal. Segundo a “aritmética política” que
constituiu a versão de despotismo ilustrado colocada em marcha em Portugal,
competia ao Estado empresário garantir a riqueza da Nação e assegurar a ordem
política e moral da sociedade. Cf. PAIM, Antônio (organizador), Pombal
na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro / Fundação
Cultural Brasil-Portugal, 1982. Os marxistas adotaram essa tese, que constitui
peça chave do clima de cientificismo que passou a prevalecer, ao longo do
século XX, entre os intelectuais de esquerda no Brasil. Cf. PAIM, Antônio. Marxismo
e descendência. Campinas: Vide Editorial, 2009.
[3]
Antônio PAIM, na sua obra intitulada: A querela do estatismo (1ª edição,
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978) ilustrou de forma clara a figura do
Estado empresário segundo o marquês de Pombal e como este modelo foi copiado
pela cultura política brasileira.
[4]
É conhecido como o PT, antes da eleição de Lula, tinha desenvolvido, em algumas
cidades em que o Partido dos Trabalhadores tinha eleito prefeitos, uma
agressiva política de cooptação de empresas municipais, a fim de desviar
dinheiros para irrigar a caixa do Partido. Esses dinheiros terminaram indo para
os bolsos de políticos corruptos do PT, o que gerou sangrenta luta interna que
terminou eliminando prefeitos que somente queriam o desvio de dinheiro para o
Partido, não para os particulares. Nesse contexto, foram exemplarmente
assassinados os prefeitos de dois importantes municípios do interior paulista:
Celso Daniel, de São Bernardo do Campo, que ocupava na oportunidade o
importante cargo de diretor da campanha presidencial de Lula e “Toninho do PT”,
de Campinas. Até agora esses crimes ficaram sem solução penal, devido às
enormes pressões políticas da cúpula do PT sobre os organismos policiais e a
magistratura.
[5]
Este mal parece ser comum aos marxistas latino-americanos quando decidem chegar
ao poder. Encontramo-lo, por exemplo, também entre os dirigentes das FARC na
Colômbia. Desde finais do século XX eles lutavam pela conquista do Estado
através de dois mecanismos: luta armada e processo eleitoral. Para eleger os seus
candidatos, as FARC criaram o movimento político denominado “União Patriótica”,
que aparentemente se acolhia aos marcos legais, enquanto que os guerrilheiros
“corriam por fora”, praticando o terrorismo para tornar refém a população
civil.
[6]
A respeito da lamentável situação em que treze anos de desmandos petistas
deixaram a economia brasileira, escrevia recentemente o economista Alexandre
Schwartzman: “(...) O governo Dilma registrou simplesmente o maior avanço do
gasto federal no Brasil desde que esses dados passaram a ser compilados (mais
de R$ 200 bilhões a preços de hoje, ou 2,7 do PIB). Nesse mesmo período o
superávit primário veio em queda registrando valores menores a cada ano desde
2011, culminando com o registro de um déficit primário em 2014, mesmo pelos
números oficiais, que, como se sabe, têm sistematicamente puxado a brasa para a
sardinha do Tesouro. Apenas um habitante da Dimensão Z, alheio a tudo o que
acontece neste quadrante da galáxia, poderia sugerir que o Brasil passou por qualquer
processo que se assemelhasse a um aperto fiscal. (...) Foi a falta, não o
excesso de rigor fiscal, que jogou nossa dívida pública a 63,4% do PIB em 2014,
exatos dez pontos percentuais do PIB a mais do que o registrado em 2010” . (SCHWARTZMAN, Alexandre,
“Á espera de um milagre”, Folha de S. Paulo, 25/02/2015 , p.
B6).
[7]
Cf. PAIM, Antônio. Para entender o PT. Londrina: Instituto Humanidades, 2002.
[8]
Cf. NUNES, Augusto. “Rosemary Noronha”. Direto ao ponto, Revista Veja,
27-11-2014. Para este jornalista, o presidente, no caso, “confundiu interesses
públicos com prazeres privados”, bem dentro da mentalidade patrimonialista. Cf.
também: “Relação com Lula explica influência de ex-assessora”. Folha
de São Paulo, 01-12-2012. BONIN, Robson. “Rosemary Noronha, amante de
Lula, fez chantagem contra o governo Dilma”. Revista Veja, 17-05-2014.
ESCOSTEGUY, Diego e BOMBIG, Alberto. “Rose e a sedução do poder”. Revista Época,
01-12-2012.
[9]
Essa
diferenciação conduziu a uma sociedade com múltiplas ordens de interesses em
choque, na qual a política era a “luta de classes”, como definiu Guizot em 1827,
no curso de História da França ministrado na Sorbonne. Vê-se, por aqui, como
muito bem anotou Plekhanov, que Marx inspirou-se na sociologia francesa
liberal-conservadora de Guizot.
[10] Cf. WEBER Weber, Max. Economía y sociedad. 1ª edição
em espanhol. (Tradução do alemão de José Medina Echavarría, et alii). México: Fondo de Cultura Económica,
1944, vol. IV, p. 188-189.
[11]
“Dilma gasta mais do que Lula em propaganda” – Editorial. O Estado de São Paulo,
12/08/2013. O valor desembolsado por ano no primeiro mandato de Dilma Roussef
chegou a 1,7 bilhão de reais, contra 1,44 bilhão de reais gastos nos seus dois
mandatos por Lula. Cf. RODRIGUES, Fernando. “Lula gastou mais que Fernando
Henrique Cardoso com publicidade em fim de mandato”, Folha de São Paulo,
19/04/2011. Efetivamente, segundo informava este jornalista, “Lula gastou em
propaganda em 2010 70% a mais do que Fernando Henrique em 2002”.
[12]
TUMA JÚNIOR, Romeu. Assassinato de reputações, um crime de Estado (depoimento a
Claudio Tognolli). 2ª edição, Rio de Janeiro: Topbooks, 2014.
[13]
No mencionado discurso, Lula disse: “Quero paz e
democracia, mas também sabemos brigar. Sobretudo quando o Stedile colocar o
exército dele nas ruas”. A propósito destas palavras tresloucadas do
ex-presidente da República, o presidente do Clube Militar do Rio de Janeiro,
general Gilberto Rodrigues Pimentel escreveu: “O Brasil só tem um exército: o de
Caxias”.
[14]
Cf. QUADROS, Vasconcelo. “PT cria comissão para investigar
envolvimento de deputado com PCC”. http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2014-05-26/pt-cria-comissao-para-investigar-envolvimento-de-deputado-com-pcc.htmldo
[15]
Cf. VASCONCELLOS, Jarbas. “O PMDB é corrupto”. Entrevista concedida a Otávio
Cabral. Veja, São Paulo, edição 2100, 18 de Fevereiro de 2009. Muito
diferente foi a forma em que em alguns países, como a Colômbia, foi adotada a
ideia de “bolsa escola” (que tinha sido posta em prática no Brasil por Fernando
Henrique Cardoso). O governo de Álvaro Uribe Vélez adotou essa iniciativa, de
uma forma eficaz para tirar da pobreza os beneficiários desse programa. Em
visita realizada à Colômbia por empresários da Confederação Nacional de Bens,
Serviços e Turismo, em Julho de 2007, tive oportunidade de conhecer de cerca a
forma em que operava o sistema de benefícios sociais, com um rígido mecanismo
de controle sobre os beneficiados por parte da Secretaria de Ação Social da Presidência.
Cf. a minha obra: Da guerra à pacificação: a escolha colombiana, Campinas: Vide
Editorial, 2010.
[16] A respeito dos altíssimos valores desviados no caso do
Petrolão, a jornalista Rosane de Oliveira (“Mensalão é troco perto da
Petrobrás, Zero Hora, Porto Alegre, 18/11/2014) escreveu: “Por alto, a Polícia Federal calcula que os desvios passam de
R$ 10 bilhões. Para se ter uma ideia do que significa essa montanha de
dinheiro, basta compará-la com o orçamento do Rio Grande do Sul: toda a receita
prevista para este ano é de R$ 51 bilhões. Primeiro
a fazer o acordo de delação premiada Paulo Roberto Costa se comprometeu a
devolver R$ 70 milhões. E o resto? Como será devolvido o dinheiro que não está
bloqueado na Suíça? Como se cobrará o que foi usado pelos partidos que estão no
governo para financiar campanhas? O
presidente do Tribunal de Contas da União, João Augusto Nardes, sugere que as
empreiteiras envolvidas em
falcatruas não sejam declaradas inidôneas, para não parar o país, mas que se
renegociem os contratos. A pergunta é: como fazer essa lipoaspiração nos
negócios superfaturados?
[17]
SALOMÃO, Lucas. “Fernando Henrique Cardoso sugere exame de consciência a Dilma
e diz que ela foi descuidada”. O Globo, Rio de Janeiro, 20/02/2015.
Não se tratou, no caso do Petrolão, de ação criminosa planejada por
empreiteiros que teriam cooptado funcionários da Petrobrás. Foi exatamente o
contrário: uma ação planejada por funcionários públicos para cooptar empresários.
Concordo com a afirmação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso: foram os
funcionários da estatal e os seus dirigentes políticos os responsáveis. Difere
esta versão da apresentada pelo Ministério Público no seu Portal, que parece
tentar deixar de fora os políticos envolvidos. Cf. a respeito: http://www.lavajato.mpf.mp.br/
[18]
Segundo
levantamento realizado pelo Jornal Valor, a área de Abastecimento da
empresa investiu R$ 112,39 bilhões entre maio de 2004 e abril de 2012. Desse
montante, 3% teriam sido desviados. Os desvios do “Petrolão” seriam equivalentes,
portanto, a 33 “mensalões”. Cf. a respeito desses dados: http://www.folhapolitica.org/2014/08/ex-diretor-da-petrobras-decide-contar-o.html
22 de agosto de 2014.
[19]
“O TCU e as centrais sindicais” –
Editorial. O Estado de São Paulo, 05/04/2008, p. A3. O texto do mencionado editorial frisava: “No
mesmo dia e na mesma hora em que mais de 50 sindicalistas comemoravam no
Palácio do Planalto o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à decisão do
Congresso de obrigar entidades sindicais a prestar contas da utilização do
imposto sindical ao Tribunal de Contas da União (TCU), ministros da corte
informavam à imprensa que o veto carece de fundamento legal, por ferir a
Constituição, e que continuarão fiscalizando o destino dado, anualmente, a
cerca de R$ 1,2 bilhão vindo da contribuição sindical paga pelos trabalhadores.
No festivo encontro entre os representantes de seis centrais sindicais e o
chefe do governo, o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), que foi um dos
principais defensores do veto, classificou como ato de coragem a iniciativa de Lula. Não podemos aceitar a interferência de um órgão público dentro do
movimento sindical, disse o parlamentar, que também é dirigente da Força
Sindical. Em discurso que pronunciou na ocasião, o ministro do Trabalho, Carlos
Lupi, disse que o governo está
incomodando segmentos da elite, e completou, dirigindo-se a Lula: Plagiando Zagallo, presidente, eles vão ter
de nos aturar por longo tempo. Ao agradecer a bajulação, o presidente da
República discursou no mesmo tom, justificando o veto sob a alegação de que os
recursos da contribuição não são públicos e que a obrigatoriedade de prestar
contas ao TCU colide com o princípio da autonomia sindical. Esses argumentos,
no entanto, deixam de lado dois aspectos técnico-jurídicos fundamentais, como
lembra o ministro do TCU Humberto Souto (...)”.
[20] REVEL,
Jean-François. L' Absolutisme inefficace, ou Contre le présidentialisme à la française. Paris: Plon, 1992.
[21]
REVEL, Jean-François. L' Absolutisme inefficace, ou Contre le présidentialisme à la française. Ob. cit., p. 13.
[22]
En editorial intitulado: “A vez dos bombeiros”, o jornal O
Estado de São Paulo (edição de 27 de Abril de 2013) afirmava,
destacando a gravidade do conflito atual entre o Legislativo y a Magistratura,
para obedecer aos interesses eleitorais do Executivo: “O ministro Dias Toffoli,
por exemplo, numa ida à Câmara dos Deputados para participar de um grupo de
trabalho, disse que quem quiser ver crise
quer criar, porque crise não há. O que há, segundo as suas palavras
emolientes, são os Poderes funcionando, a
normalidade democrática e a democracia efervescente. Ele há de saber que os
Poderes não estão imunes a praticar atos disfuncionais e que a efervescência
democrática corre o risco de transbordar dos padrões da normalidade. Foi o que
ocorreu, para dizer o mínimo, quando a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)
da Câmara, numa sessão de que participaram apenas 21 dos seus 68 membros,
acolheu, em votação simbólica, um retaliatório projeto de emenda
constitucional, de autoria petista, destinado a subordinar as decisões mais
importantes do STF à aprovação do Congresso (...)”.
[23]
No Brasil, o alerta contra essa empresa autoritária que ameaça a liberdade foi
dado especialmente por autores liberais da talha de Roque Spencer Maciel de
Barros, Miguel Reale, Antônio Paim, José Osvaldo de Meira Penna, José Guilherme
Merquior, Ubiratan Macedo, Og Leme, Donald Stewart e Roberto Campos. Em anos
recentes, o Instituto Liberal, notadamente nas suas representações do Rio de
Janeiro e Porto Alegre, colocou de manifesto tal risco, em várias publicações
periódicas que são distribuídas nos meios empresarial e universitário.
Na França de Tocqueville,
este pensador desenvolveu a sua análise crítica contra o atentado absolutista à
liberdade, na sua clássica obra: O Antigo Regime e a Revolução.
(Tradução de Y. Jean; apresentação de Z. Barbu; introdução de J. P. Mayer). 3ª
edição, Brasília: Universidade de Brasília, 1989. A respeito das desgraças
trazidas pelo conceito absolutista de República que vingou na França, escrevia
assim Tocqueville no prefácio à obra mencionada: “Ao acompanhar rapidamente o
desenrolar desta mesma revolução, tentarei também mostrar quais os
acontecimentos, os erros, as falsas esperanças que levaram esses mesmos
franceses a abandonar seus primeiros intentos e, esquecendo a liberdade, a só
pensar em tornar-se servidores do dono do mundo; como um governo mais forte
e muito mais absoluto do que aquele que
a Revolução derrubou, retoma e concentra todos os poderes, suprime todas estas
liberdades que tanto custaram e coloca em seu lugar suas vãs imagens, chamando
de soberania do povo os sufrágios de eleitores que não podem nem indagar, nem
discutir, nem decidir, nem escolher dependendo da anuência de assembleias mudas
ou avassaladas, um governo que ao tirar da nação a faculdade de governar-se, as
principais garantias do direito, a liberdade de pensar, falar e escrever, quer
dizer, do que houve de mais precioso e mais nobre nas conquistas de 89, ainda
se enfeita com este grande nome. (...). As sociedades democráticas que não são
livres podem ser ricas, refinadas,
adornadas e até magníficas e poderosas graças ao peso da sua massa
homogênea; nelas podemos encontrar qualidades privadas, bons pais de família,
comerciantes honestos e proprietários dignos de estima; nelas veremos até mesmo
bons cristãos, pois a pátria daqueles não é deste mundo e a glória de sua
religião é produzi-los no meio da maior corrupção dos costumes e debaixo dos
piores governos: o império romano na sua extrema decadência estava repleto
deles. Mas o que nunca se verá em sociedades semelhantes, ouso dizê-lo, são
grandes cidadãos e principalmente um grande povo, e não tenho medo de afirmar
que o nível comum dos corações e dos espíritos não cessará nunca de baixar
enquanto houver união da igualdade e do despotismo” (pg. 45; 47).
[25]
O economista César Maia, membro da Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro e
ex-prefeito da cidade do Rio, considera que o Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) maquia os dados do desemprego, estabelecendo uma confusão
deliberada entre empregados precariamente e trabalhadores formais. No informe
publicado no seu Exblog do César Maia (30 de abril de 2013) escreve o seguinte:
“Ou seja, os Desempregados e os Empregados precariamente, que constituem a
efetiva Taxa de Desemprego, representam 5,7% + 20,1% da PEA (População
Economicamente Ativa). Essa é a Taxa de Desemprego Efetiva Ibérica!”. Cf. a
respeito:
http://emkt.frontcrm.com.br/display.php?M=4455858&C=afadd0a3868cb5a6975f1a60a6ec08e8&S=6609&L=514&N=2519 [consultado em 30-04-2013].