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sábado, 11 de março de 2017

O CICLO DAS REVOLUÇÕES BURGUESAS

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As chamadas "Revoluções Burguesas" ocorreram ao longo dos séculos XVII e XVIII. Paradigmas delas são as Revoluções Inglesa e Francesa. A primeira, relativamente pacífica, sem a carnificina que se tornou marca registrada na guilhotina, com a qual a Revolução Francesa tornou os seus inimigos iguais, ou seja, sem cabeça.

Estudiosos clássicos desses eventos foram o escocês David Hume e o francês François Guizot, em relação à Revolução Gloriosa de 1688 na Inglaterra. Estudiosos igualmente clássicos da Revolução Francesa foram Edmund Burke, do lado inglês, e Alexis de Tocqueville, no contexto da cultura francesa.

A Revolução Inglesa não foi sanguinolenta como a Francesa, em decorrência de um fato apontado por Guizot: ela ocorreu como consequência natural de um processo que já tinha sido iniciado no século XIII, quando o Magnum Concilium, formado por artesãos e burgueses, passou a pressionar o Monarca para que esse colegiado fosse consultado em matéria de fixação de tributos (essa exigência estava contida no conhecido documento que levou o nome de Magna Carta). Assim, a essência da Revolução de 1688 já estava presente nas reivindicações pelas que lutavam burgueses e artesãos séculos atrás. Os fatos marcantes daquela consistiram em que o Parlamento passou a ser considerado o poder supremo e o Monarca simples mandatário daquele, no modelo que passou a se denominar de "monarquia constitucional".

Os fatos históricos que conduziram a essa reforma foram dois: de um lado, o combate da sociedade inglesa contra as pretensões dos Monarcas de tradição católica (os pertencentes à dinastia Stuart: Carlos I, Carlos II e Jaime II); de outro, a tentativa do último monarca, Jaime II, de colocar no trono como herdeiro o seu filho menor, sendo que havia uma soberana herdeira legítima do trono, a princesa Maria, casada com Guilherme, príncipe holandês da casa de Orange. Quem atuou dentro do Parlamento para que o poder fosse entregue ao casal Guilherme e Maria foi o líder do partido whig (liberal), lorde Shaftesbury, cujo secretário era o filósofo John Locke. Este, a pedido do seu mentor, tinha escrito os elementos básicos do que seria o novo modelo, na obra que foi publicada em 1690 com o título de Segundo Tratado sobre o Governo Civil. Assim, a Revolução Gloriosa coincidiu com a coroação de Guilherme III e Maria II, em 1688.

As principais consequências que decorreram da mencionada Revolução foram as seguintes: conquista da liberdade de empreendimento por parte da burguesia (que faria com que se tornasse possível no século seguinte a Revolução Industrial), a Declaração dos Direitos (Bill of Rights) que eliminava a censura política e reafirmava os poderes do Parlamento, o Tesouro e todos os gastos públicos passaram a ser controlados pelo Parlamento, foi instaurada a fiscalização dos altos funcionários pelo Parlamento, foi adotado o controle dos gastos da família real pelo Parlamento, foi promulgado o "Ato de Tolerância" (Toleration Act) que estabelecia a liberdade religiosa de todos os cristãos exceto os católicos, deu-se continuidade à organização democrática do Exército com participação nas deliberações dos próprios oficiais, foi adotada a segurança jurídica nas transações comerciais ao ser impedido o Monarca de intervir na economia, foi garantida a progressiva participação da sociedade nos assuntos públicos graças à representação parlamentar, foi implantado um ambiente pacífico nas relações internacionais pelo fato de o Rei não poder armar exércitos, sendo esta prerrogativa exclusiva dos representantes do povo (no Parlamento), foi promulgada a liberdade de expressão que possibilitou uma renovação da circulação das ideias, foram disseminados os ideais da educação liberal ao redor do estímulo à formação da liberdade com ênfase no estudo das Humanidades e a abertura de novos horizontes para as artes e as letras, foi dado decidido estímulo às ciências e à pesquisa dos recursos naturais do Reino da Inglaterra (que passou a receber recursos da iniciativa privada).

A Revolução Francesa, diferentemente da Inglesa, foi extremadamente violenta. Por uma razão simples: as mudanças pressionadas pelas novas classes (notadamente a burguesia) foi frustrada pela corrupta burocracia real que, desde Versalhes - essa Brasília do século XVIII - impedia a qualquer preço que os seus interesses e privilégios fossem sequer discutidos. As classes populares e a burguesia reivindicavam a participação na gestão do Estado, como tinha ocorrido na Inglaterra. O livrinho do abade Sieyès intitulado: O que é o terceiro estado? foi o estopim do movimento revolucionário que começou com a tomada, pelos revoltosos, da prisão da Bastilha, em julho de 1789. 

Sieyès traçava um quadro estatístico das classes. A nobreza improdutiva, que se apropriava dos cargos públicos, não passava das 200 mil pessoas, ao passo que os pagadores de impostos (industriais, profissionais liberais e em geral as pessoas que trabalhavam) chegavam aos 25 milhões. Perguntava Sieyès: o que é o primeiro estado (nobreza) diante do terceiro estado (pagadores de impostos)? Respondia: Nada, porque a grande maioria dos cidadãos franceses pertencia a este último.

Como consequência da oposição da burocracia corrupta para que não houvesse mudanças, a luta foi violenta entre os burgueses e a nobreza. O Rei Luís XVI foi guilhotinado, bem como numerosos nobres. A servidão dos camponeses aos antigos nobres foi abolida. A burguesia passou a controlar o poder. Mas a onda de violência desatada pelos burgueses radicais no período posterior à Revolução (denominado de Terror) terminou fazendo com que o Diretório (órgão colegiado máximo do governo integrado por burgueses) perdesse o controle da situação, tendo sido o poder depositado nas mãos de um general que assumiu o cargo de Primeiro Cônsul, Napoleão Bonaparte. Ele tinha imposto a paz pelas armas na cidade de Paris. A consequência de toda essa crise foi a volta do absolutismo monárquico, quando Napoleão se coroou Imperador dos Franceses em 1804.

As principais consequências da Revolução Francesa foram a abolição da antiga servidão dos camponeses, a promulgação  da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão ao redor do lema republicano: Liberdade, Igualdade, Fraternidade, a valorização das atividades burguesas (liberdade de empreendimentos industriais e do comércio), a decretação de mudanças radicais que pretendiam romper definitivamente com o passado como a implantação de um novo calendário e a adoção de um novo sistema de pesos e medidas (abandonando o antigo sistema de origem medieval), a liberdade de pensamento e manifestação do espírito anti-religioso como reação contra a vinculação que existia entre Igreja e Monarquia, a renovação artística e cultural valorizando sobremaneira as novas criações ensejadas pela Revolução (como as marchas e os cantos populares, sendo a Marselhesa, um deles, adotado como hino oficial da República), as mudanças radicais do urbanismo de Paris tendo a Praça do Povo como centro, a reforma universitária mediante a incorporação da Faculdade Politécnica (dedicada à pesquisa das ciências para a engenharia) ao lado das tradicionais Faculdades, a promulgação, por Napoleão, do novo Código Civil que abria espaço para as atividades industriais e comerciais, lhes garantindo a segurança jurídica, a definitiva modernização do Exército (Grande Armée) dando continuidade ao processo iniciado um século atrás com Luís XIV mediante a adoção sistemática da artilharia de campanha, etc. O Museu Carnavalet, no tradicional bairro parisiense do Marais, passou a abrigar posteriormente as várias manifestações artísticas desse período conturbado (constituindo, ainda hoje, um dos grandes museus de Paris).


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