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sexta-feira, 17 de abril de 2020

SOCIOLOGIA BRASILEIRA E CULTURALISMO


Não é fácil realizar um balanço da sociologia brasileira ao longo dos últimos cem anos, que coincidem com a vida republicana do país. Mais do que uma enumeração exaustiva dos autores e das suas obras, pretende-se, neste estudo, desenvolver alguns aspectos essenciais da produção sociológica no Brasil.[1]
Em primeiro lugar, identificaremos os centros pioneiros de estudos sociais que surgiram no país entre o início do século XX e a década de sessenta, quando se generalizou a ideia de desenvolvimento. Analisaremos, a seguir, a produção brasileira nas ciências sociais, do ângulo das tipologias elaboradas por Wanderley-Guilherme dos Santos (1935-2019) e Miguel Reale (1910-2006). A seguir, centraremos a atenção na abordagem sociológica de Oliveira Vianna (1883-1951), que iniciou no nosso meio a análise da culturologia do Estado, e sintetizaremos, por último, as mais importantes contribuições que projetam até os nossos dias o estudo dessa variável.
A escolha das tipologias analíticas de Wanderley-Guilherme dos Santos e de Miguel Reale justifica-se, na medida em que ambas consolidaram a superação do estreito marco cientificista, de inspiração comteana, que tem empolgado, via de regra, aos estudiosos do pensamento social brasileiro. De outro lado, a importância conferida, neste trabalho, à culturologia do Estado desenvolvida por Oliveira Vianna e por alguns estudiosos contemporâneos, prende-se ao fato de ser essa variável essencial à adequada avaliação crítica da vida republicana brasileira, que viu consolidar-se um Estado mais forte do que a sociedade.
Para realizar os nossos objetivos, desenvolveremos os seguintes itens: I – Primeiros centros de estudos sociais. II – Estudos sobre a produção brasileira na área das ciências sociais: a tipologia de Wanderley-Guilherme dos Santos. III – Miguel Reale e o paradigma culturalista aplicado à sociologia brasileira. IV - Oliveira Vianna e a culturologia do Estado. V – Hodiernos desdobramentos da culturologia do Estado.
I – Primeiros centros de estudos sociais.
Wanderley-Guilherme dos Santos, no ensaio intitulado: “Paradigma e história: a ordem burguesa na imaginação social brasileira”,[2] destaca o fato de que até 1919, quando se cria a Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas do Rio de Janeiro, os estudos sociológicos eram feitos pelas faculdades de Direito. Após a criação da Faculdade de Ciências políticas e Econômicas, outras entidades apareceram: em 1933, funda-se a Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (entidade particular); em 1934 é organizada a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São Paulo (entidade pública) e em 1935 iniciam-se os Cursos de Ciências Sociais na Universidade do Distrito Federal (entidade pública).
Sintetizando a evolução institucional do ensino e da pesquisa das ciências sociais no Brasil, Wanderley-Guilherme dos Santos [3] considera que “(...) Desde os momentos da Independência até a terceira década deste século [XX], a intelectualidade brasileira enfrentou o passado e o presente do país e do exterior, sem o auxílio de instituições especializadas na absorção, geração e difusão de conhecimentos sociais. A partir dos anos 30, neste século, passou a contar a reflexão social brasileira com os esforços das Escolas de Sociologia e Política, em permanente expansão quantitativa e geográfica (...)”.
Esforço significativo de estudo do pensamento social foi empreendido, fora do ambiente universitário, na década de cinquenta, pelo IBESP-ISEB (Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política – Instituto Superior de Estudos Brasileiros) e pela ESG (Escola Superior de Guerra), segundo Antônio Paim (1927).[4] O primeiro, com origens em 1952 e definitiva consolidação em 1955, ocupou-se preferentemente das questões políticas vinculadas ao desenvolvimento. Embora fosse dissolvido em 64 por ter-se engajado na luta política, conseguiu popularizar a ideia de um projeto nacional de desenvolvimento, retirada qualquer conotação político-partidária, tendo sido preservado o seu acervo na Escola Superior de Guerra.
A Escola Superior de Guerra estruturou-se em 1950 e desenvolveu estudos sistemáticos de política e estratégia, segurança e desenvolvimento nacionais, admitindo a possibilidade de uma ciência política que contribua para o bem comum. “O propósito essencial da Escola – salienta Paim - tornou-se a promoção da racionalidade na atuação do Estado. Semelhante objetivo é entendido como correspondendo à velha aspiração da intelectualidade e da elite militar e consiste no empenho decidido em prol da superação das deformações do Estado Liberal”.
Considerando que ao Estado moderno cabe a realização do ordenamento econômico e social, a doutrina da Escola acha necessário eliminar toda atuação improvisada, empírica e emocional, a fim de substituí-la pelo máximo de racionalidade. Embora a ESG tivesse desenvolvido, com êxito, significativa elaboração teórica, notadamente no que respeita à área de atuação do poder que não pode ser objeto de barganha, por configurar as bases do pacto político (esfera denominada de objetivos nacionais permanentes), o empenho de atribuir fundamentos morais à ideia de segurança nacional, dissociando-a de qualquer conotação ideológica, não teve resultado bem sucedido.
II – Estudos sobre a produção brasileira na área das ciências sociais: a tipologia analítica de Wanderley-Guilherme dos Santos.
Considerando os mais significativos estudos sobre a produção brasileira na área das ciências sociais, W. G. dos Santos arrola os seguintes: Fernando de Azevedo (1894-1974), A cultura brasileira – Introdução ao estudo da cultura no Brasil;[5] Djacir Menezes (1907-1996), “La Science Politique au Brésil au cours des trente dernières années”;[6] Luiz Aguiar Costa Pinto (1920-1963) e Edson Carneiro (1912-1972), As ciências sociais no Brasil;[7] Alberto Guerreiro Ramos (1915-1982), Esforços de teorização da realidade nacional politicamente orientados, de 1870 a nossos dias;[8] A. Guerreiro Ramos, “O inconsciente sociológico: estudo sobre a crise política no Brasil na década de 30”;[9] A. Guerreiro Ramos, “A ideologia da Jeunesse Dorée”;[10] Djacir Menezes, “La sociologia del Brasil”;[11] Florestan Fernandes (1920-1995), “Ciência e sociedade na evolução do Brasil”;[12] Florestan Fernandes, “O padrão de trabalho científico dos sociólogos brasileiros”;[13] Florestan Fernandes, “Desenvolvimento histórico-social da sociologia no Brasil”;[14] A. Guerreiro Ramos, “A ideologia da ordem”;[15] Nelson Werneck-Sodré (1911-1999), A ideologia do colonialismo;[16] Wanderley-Guilherme dos Santos, “A imaginação político-social brasileira”;[17] Edgar Carone (1923-2003), “Coleção Azul, crítica pequeno-burguesa à crise brasileira de 1930”;[18] Wanderley-Guilherme dos Santos, “Raízes da imaginação política brasileira”;[19] Bolívar Lamounier (1943), Ideology and authoritarian regimes: theoretical Perspectives and Study of the Brazilian Case;[20] Hélgio Trindade (1939), Integralismo - O fascismo brasileiro da década de 30.[21]
A situação geral das obras do pensamento social brasileiro é a seguinte, segundo os estudos arrolados por Wanderley-Guilherme dos Santos: “De acordo com as fontes mencionadas, a história do pensamento social brasileiro é composta pelas obras de aproximadamente cem estudiosos. Se se exclui da lista de cem os autores que começaram a produzir mais recentemente, isto é, a partir da década de 40, e também os críticos literários e panfletários listados por Fernando de Azevedo, sobram apenas meia centena de nomes, dos quais mais da metade só é reconhecida, ou mencionada explicitamente, por apenas uma das fontes (...)”.[22]
Os estudos em apreço arrolam as obras sobre o pensamento social brasileiro a partir de três critérios, identificados por Wanderley-Guilherme dos Santos como: “matriz institucional”, “matriz sociológica” e “matriz ideológica”. A primeira é entendida como “(...) a organização, classificação e avaliação do pensamento social brasileiro, segundo marcos organizacionais e institucionais”.[23] No sentir do mencionado autor, fazem parte deste grupo L. A. Costa Pinto, Edson Carneiro, Florestan Fernandes, Fernando de Azevedo e Djacir Menezes (com o seu texto La science politique au Brésil au cours des treinte dernières annés, 1950).
W. G. dos Santos considera que a avaliação do pensamento social brasileiro a partir da “matriz institucional” é insuficiente, porquanto pretende ordenar o passado em função do presente, inviabilizando, assim, a verdadeira compreensão da problemática de cada período. A respeito frisa: “As consequências da aplicação desse esquema são evidentes. Dado que o período científico das ciências sociais no Brasil se inicia com a criação de cursos superiores, a importação de professores estrangeiros e a introdução das técnicas de investigação de campo, e dado que isso só se verificou no segundo quartel deste século, segue-se que a exposição da história do pensamento político-social brasileiro é extremamente simples: até o segundo quartel deste século produziram-se ensaios sobre temas sociais; a partir de então produziu-se ciência. Considerando-se, ademais, que qualquer que tenha sido a quantidade ou qualidade da produção do primeiro período, ela é irrelevante para o progresso da ciência, torna-se desnecessário qualquer investigação sobre que autores pertencem ao passado cultural do país, ou sobre o modo pelo qual pensaram o social. O interesse histórico se resumiria a catalogar a produção do primeiro período (pré-científico) pela temática e a explicar de que modo as variações na estrutura da sociedade introduziram modificações na temática pré-científica. Ora, a historiografia que ordena o passado em função do presente, assumindo o presente como ‘o moderno’, está desarmada para entender as exatas articulações do desenvolvimento intelectual da humanidade. A rigor, está desarmada até para entender o presente, pois ‘on est toujours moderne, à toute époque, lorsque l´on pense à peu prés comme ses contemporaines et un peu autrement que ses maîtres’”.[24]
A “matriz sociológica” é identificada por W. G. dos Santos com “(...) a análise que se desenvolve tomando como parâmetro características da estrutura econômico-social, quer (...) para explicar variações ocorridas, sobretudo no conteúdo das preocupações dos investigadores sociais, como decorrência de modificações processadas na estrutura socioeconômica, quer, em casos extremos, para deduzir os atributos ou dimensões do pensamento social dos atributos e dimensões do processo social (...)”.[25]
No contexto da “matriz sociológica” situam-se Florestan Fernandes (especificamente com os seus textos: Ciência e sociedade na evolução social do Brasil, 1956, e Desenvolvimento histórico-social da sociologia no Brasil, 1957), Edgar Carone, Nelson Werneck Sodré e Hélgio Trindade. Os textos de Florestan Fernandes exemplificariam, no sentir de W. G. dos Santos, a primeira variação da “matriz sociológica”, enquanto a segunda variação poderia ser ilustrada pela fórmula cunhada, na segunda metade da década de 50, pelo ISEB, no sentido de que “tudo é colonial na colônia”. [26]
O vício que afeta aos autores inspirados na “matriz sociológica” é o de pressupor um processo de racionalidade social que é traduzido fielmente para o terreno político, sem que os cientistas pudessem cometer um erro de avaliação. É, ao nosso modo de ver, o velho arquétipo comteano da “física social”. A respeito, escreve W. G. dos Santos: “(...) Com frequência, o que se encontra são tentativas manquées [falhas] de sociologia do conhecimento, onde a simples enunciação e descrição de atributos dos processos sociais seriam evidências suficientes para demonstrar a relação de dependência funcional entre o conteúdo do que se pensa e o desdobrar empírico da história social. Toma-se por premissa exatamente o que incumbe demonstrar, isto é, que os processos sociais são de racionalidade cristalina, a qual pode ser captada imediatamente, com escassa possibilidade de engano, permitindo assim aos atores sociais descobrirem facilmente onde se encontram os seus interesses. É sintomático que em nenhuma análise desse gênero nos seja apresentado algum exemplo de pensador que simplesmente se tenha equivocado inteiramente quanto aos seus interesses de classe, diante das virtualidades do processo objetivo. No máximo obtêm-se as indicações de que este ou aquele autor falhou no seu prognóstico porque não percebeu que a defesa ou implementação dos interesses da sua classe era de todo inviável, ou pelo menos difícil nos termos pretendidos pelo autor (...).  Jamais entretanto admite-se que o autor se tenha equivocado quanto ao diagnóstico que faz da situação social”.[27]
A “matriz ideológica” é caracterizada por W. G. dos Santos como “(...) a preocupação de analisar os textos brasileiros de reflexão social com o objetivo explícito de buscar sua caracterização conceitual própria, independentemente dos azares conjunturais da empiria. Não se trata de afirmar que a empiria histórica é irrelevante para a formação do pensamento social, nem que esse mesmo pensamento não se refira em algum momento ao transcurso histórico. Apenas se reivindica a diferenciação e análise conceitual como procedimentos legítimos e necessários na apropriação adequada das determinantes estritamente conceituais do presente”.[28]
Inserem-se na mencionada perspectiva os trabalhos de Guerreiro Ramos, que “(...) certamente se constituem como os mais estimulantes até o início da década de 70”[29] e de Bolívar Lamounier, cujo trabalho, no entanto, além de partilhar com o de Hélgio Trindade “(...) a característica de dissolver as nuances e as diferenças, onde elas existem, e afirma-las onde elas são irrelevantes”,[30] parece, às vezes, concordar com a mais estrita concepção determinista, quando diz, por exemplo, que vê a ideologia do Estado, em larga medida, “como o espelho fiel da sociedade e dos conflitos através dos quais ela é transformada”.[31]
Feita a avaliação crítica acerca da forma em que os estudiosos do pensamento social utilizam a “matriz ideológica”, W. G. dos Santos explicita o modo a partir do qual pode ser abordado esse objeto, no interior do mencionado arquétipo. Nesse contexto, a questão do objetivo a ser atingido é fundamental. O autor frisa, a respeito, que “(...) o ordenamento da história da investigação social, não somente no Brasil, aliás, pode ser realizado com maior ou menor capacidade de persuasão de acordo com os alvos que se têm em mente. Assim, se o objeto consiste em descrever os diversos estilos de análise que se sucederam no tempo, estará bem realizada a história que o fizer de maneira exaustiva, pertinente e bem articulada. Se, entretanto, a meta for investigar em que medida a reflexão social acompanhou ou identificou acertadamente os fenômenos sociais que se propunha analisar, então o critério de ordenamento há de variar concomitantemente”.[32]
No entanto, W. G. dos Santos considera que há, por baixo desta questão, outra mais radical ainda: “(...) a da unicidade ou multiplicidade dos objetos do conhecer, e a do estatuto de seu modo de existir”.[33] Resumidamente, ao nosso modo de ver, trata-se da formulação, no terreno dos estudos sociológicos, da questão das perspectivas filosóficas: ou adotamos um ponto de vista último transcendente, ou aderimos a uma perspectiva transcendental.[34] O primeiro alicerçar-se-ia na pressuposição de que, por trás do objeto do conhecimento, há uma substância que lhe dá fundamento, enquanto a segunda arranca do pressuposto de que o nosso conhecimento é, apenas, representação do real, sem que tenhamos possibilidade de chegar até a coisa em si ou noumenon. Antônio Paim destacou a perspectiva transcendental como característica do pensamento moderno, nestes termos: “O pensamento moderno consiste, sobretudo, na busca de uma nova perspectiva, em oposição à transcendente. O ápice desse processo é alcançado na obra de Kant, onde se afirma que a condição humana está limitada à consideração dos fenômenos. A nova perspectiva denominou-se transcendental. Recusa toda abordagem das coisas como seriam em si mesmas, fora do horizonte da percepção e do entendimento humanos, esfera do real que Kant chamou de coisas-em-si. Ao invés da substância, aqui a categoria fundamental é a de fenômeno”.[35]
W. G. dos Santos formula, claramente, as duas perspectivas, transcendente e transcendental, em relação aos estudos sociológicos. Quanto à primeira, afirma: “Aceita-se que o significado real dos diversos fenômenos sociais – entre eles o da reflexão sobre fenômenos sociais, aqui tomado como um fenômeno social ela própria, isto é, como um objeto posto aí para ser desvendado – é concentrado e único, mais apropriadamente unívoco, e que compete à história do conhecer articular conceitualmente esse sentido unívoco e sua evolução temporal. Nesta alternativa, a história do pensamento social, ou da investigação, ou das disciplinas sociais, possui um objeto preciso, claro, que ou bem é conhecido ou bem não é, e tudo aquilo que escapar a esta intenção deixa de ser relevante, por errado, como história das ideias”.[36] Pressupõe-se aqui um substrato ontológico ao qual o conhecimento tem acesso, sendo a verdade, como diziam os escolásticos, “adequatio intellectus ad rem” (“acomodação do entendimento à coisa”). O sentido unívoco da realidade histórica depende dessa possibilidade de adequação à realidade em si. Situamo-nos, destarte, no terreno de uma objetividade absoluta, indiscutível, geradora de certezas dogmáticas, como as que engendra a famigerada “fisiologia social” saint-simoniana.
Outra é a situação epistemológica decorrente da adoção da perspectiva transcendental, que é caracterizada assim por Wanderley-Guilherme dos Santos: “Outra premissa consiste em admitir que qualquer conjunto de ideias produzidas em determinado momento – como é característico dos fenômenos sociais – produz um complexo feixe de consequências, muitas delas inesperadas. Todo ato social – e a produção de uma ideia é um ato social – fica ao mesmo tempo aquém e além das intenções de quem o realizou. Aquém porque frequentemente não se obtém com ele os objetos buscados, e além porque se produzem efeitos não antecipados pelo autor. Quando se busca conhecer um ato social, em consequência, não estamos a priori  determinados pela univocidade de um objeto, que marcaria de antemão o único conhecimento significativo sobre ele, mas, ao contrário, constrói-se conceitualmente esse objeto, que participa assim de duas ordens: a ordem de articulação dos fenômenos e a ordem da articulação dos conceitos (...)”.[37]
A primeira consequência que decorre da quebra da univocidade ensejada pela adoção da perspectiva transcendental é, no terreno das ciências sociais, o pluralismo de planos ou de enfoques que caracteriza a construção dos objetos culturais. A respeito, anota W. G. dos Santos: “(...) é possível, por exemplo, historiar a história das ideias com o objetivo de verificar de que maneira esta ou aquela doutrina contribui para a mudança de percepção sobre os problemas, ou é possível investiga-la buscando descobrir os sistemas que mais influíram na produção mais frequente do período, ou é ainda possível analisar de que maneira as ideias serviram ou não ao propósito de justificar e defender determinada organização social, ou ainda uma vez, que avanços metodológicos propiciaram. Existe uma distância razoável entre Teorias sobre a mais-valia, de Karl Marx (1818-1883), O crescimento do radicalismo filosófico, de Ely Halévy (1870-1937) e A grande transformação, de Karl Polanyi (1886-1964); não obstante, em certo sentido, estão investigando o mesmo objeto, embora, ao mesmo tempo, não o estejam. Qual deles constitui a verdadeira história da ideologia capitalista burguesa? E de que modo entender o fato de que seja possível tratar os três como dimensões equivalentes de um mesmo objeto do conhecer, não como descrições mais ou menos fiéis de uma mesma realidade, entre as quais uma será verdadeira e as demais falsas?”[38]
Demonstrada a univocidade que decorre da adoção da perspectiva transcendente e firmadas as ciências sociais na perspectiva transcendental,  W. G. dos Santos passa a ilustrar as várias formas em que se poderia aplicar a “matriz ideológica” ao estudo acerca da evolução das ciências sociais no Brasil. Tal evolução, frisa o autor, “(...) pode ser ordenada de acordo com a evidência empírica mais simples, em função do conteúdo manifesto dos trabalhos publicados. Não é difícil, exercitando este tipo de ordenação, revelar a coincidência entre o conteúdo de questões discutidas e a agenda de problemas sociais e politicamente importantes (...)”.[39]
Destarte, aproxima-se a metodologia proposta por W. G. dos Santos para o estudo da evolução das ciências sociais no Brasil da utilizada pelos estudiosos do pensamento brasileiro,[40] consistente em identificar os problemas que preocupavam ao pensador, a fim de ver a forma em que deu resposta a eles; somente a partir daí seria válido estabelecer a sua filiação a correntes.
Do ângulo da “agenda de problemas sociais e politicamente importantes”, W. G. dos Santos considera que os nossos cientistas do período republicano, até 1930, privilegiaram “(...) temas relativos à formação histórica do país, as interrelações entre a sua estrutura econômica e social e sua estrutura política, os problemas da oligarquização política, suas condicionantes e efeitos, o jogo das raças, o conflito potencial entre elas e o tipo de organização social provável em país como o Brasil, a função do Estado, os limites do privatismo e a definição da legitimidade do poder público”.[41] Os autores que abordaram esses problemas foram: Alberto Torres (1865-1917), O problema nacional brasileiro, Rio, 1914 e A organização nacional, Rio, 1914; Oliveira Vianna, O idealismo na evolução do Império e da República, Rio, 1922; O idealismo da Constituição, Rio, 1924; O ocaso do Império, Rio, 1925; Populações meridionais do Brasil, 1º volume, Rio, 1918 e Gilberto Freyre (1900-1987), Casa Grande e Senzala, Rio, 1933.
O período 1930-1939 é, no sentir de W. G. dos Santos, extremamente rico, do ângulo da variedade dos problemas debatidos. As profundas transformações sofridas pelo país nesse período e a formação variada e rica dos autores produzem um valioso conjunto de reflexões sociais, muitas das quais têm vigência até os dias atuais. Em relação à problemática discutida no período, frisa W. G. dos Santos: “Entre 1930 e 1939 produzem-se no Brasil as mais argutas análises sobre o processo político nacional, elaboram-se as principais hipóteses sobre a formação e o funcionamento do sistema social, e articula-se o conjunto de questões que, em verdade, permanecerão até hoje como o núcleo fundamental, embora não exaustivo, de problemas a serem resolvidos teórica e praticamente. Os debates se iniciam pela própria significação da revolução de 30, envolvem os militares e sua relação com as demais forças sociais, retoma-se a questão da centralização, investigam-se as origens da crise nas sociedades modernas, estuda-se o impacto das sociedades avançadas em sociedades de desenvolvimento retardado, louva-se e critica-se o papel das elites das massas no desenvolvimento social, esmiúça-se o passado nacional pensando-se a contribuição de cada agrupamento econômico e social, elaboram-se os mais variados prognósticos sobre a provável evolução do sistema nacional. A emergência de movimentos autoritários, nacionalmente organizados, oferece novo material à especulação política sobre o papel dos partidos, das massas e das elites, enquanto o imediato passado,  com as rebeldias tenentistas e os surtos comunista e integralista, com 1935 e 1938, descobrirão a temática da violência no processo político”.[42]
Os autores do período – frisa W. G. dos Santos – “(...) sem preparação sistemática, embora muitas vezes revelando surpreendente familiaridade com a produção internacional pertinente, despreocupados quanto aos cânones acadêmicos, fixaram, entretanto, solidamente o repertório de problemas que,  sob roupagens linguísticas as mais variadas, se vem transmitindo de geração em geração, até hoje”.[43] Figuram entre os mais destacados autores da década em apreço o jornalista e escritor Martins de Almeida, Brasil errado, Rio, 1932; Azevedo Amaral (1881-1942), A aventura política do Brasil, Rio, 1935; O Brasil na crise atual, Rio, 1934; O Estado autoritário e a realidade nacional, Rio, 1938; Menotti del Picchia (1892-1988), Questões nacionais, Rio, 1935; Nelson Duarte (1902-1970), A ordem privada e a organização política nacional, Rio, 1939; Agamenon Magalhães (1893-1952), O Estado e a realidade contemporânea, Rio, 1933; Virgínio Santa Rosa (1905-2001), A desordem, Rio, 1932; O sentido do tenentismo, Rio, 1933; Alcindo Sodré (1895-1952), A gênese da desordem, Rio, 1933.
O período 1939-1950 caracteriza-se, no sentir de W. G. dos Santos, pelo recesso de que foi vítima o pensamento sociológico brasileiro, em decorrência do Estado Novo (1937-1945). “O golpe de Estado de 1937 – frisa - e as sequências políticas a que deu oportunidade paralisaram, pela coação e pela propaganda, a incessante e múltipla atividade intelectual que procurava representar conceitualmente não apenas o passado, mas em especial as virtualidades do processo político e social brasileiro. De resto, que poderiam valer as preocupações e pesquisas, após 1937, se as diretivas de políticas, as interpretações oficiais, os juízos definitivos sobre a verdade dos fenômenos sociais eram decididas, burocraticamente, pelos homens no governo e seus assessores imediatos, segundo as conveniências do Poder? (...) A controvérsia de ideias cedeu lugar às doutrinas oficiais e, em realidade, até as perseguições e prisões dos intelectuais rebeldes. Extinguiu-se, desse modo, o debate, a polêmica, e, com elas, o estímulo à pesquisa e à investigação. Durante oito anos fecharam-se os canais de comunicação livre, e, após a queda da ditadura de Vargas, em 1945, foram necessários, ainda, quase dez anos para que a intelectualidade brasileira, agora alimentada pelos investigadores e cientistas sociais formados pelas faculdades de Filosofia e escolas de Sociologia, criadas nos anos 30, acordasse da letargia que a tomara entrementes”.[44]
As décadas de 50 a 70 caracterizar-se-iam, no sentir de W. G. dos Santos, pela retomada da crítica sociológica. Na década de 50 foi importante o papel desempenhado pelo Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política (IBESP), que logo se transformou no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e que contaria, nessa segunda etapa, com o apoio do Ministério de Educação e Cultura. Foi grande e variada a gama de problemas debatidos neste ciclo. Eis os mais significativos: condicionantes de uma política de autonomia nacional, o fenômeno do populismo, a industrialização como passo estratégico em uma política de autonomia econômica, a independência econômica como requisito indispensável da independência política, a insistência na nacionalização do processo econômico, a importância da inclusão das massas urbanas na coligação política. Os mais importantes autores do ciclo isebiano foram Hélio Jaguaribe (1923-2018) e Guerreiro Ramos, cujos trabalhos, publicados na revista Cadernos do nosso tempo,[45] tiveram grande divulgação entre a juventude universitária. A maior contribuição do IBESP-ISEB foi – segundo Antônio Paim[46] - a divulgação da ideia de desenvolvimento como grande desideratum nacional.
W. G. dos Santos caracteriza da seguinte forma a produção sociológica do período em apreço: “A década de 50, e depois a de 60, testemunhou uma expansão crescente e acelerada das escolas superiores, o êxodo e o retorno de considerável número de cientistas sociais que buscaram no exterior maior qualificação, a especialização dos cientistas sociais e a produção crescente de estudos e investigações. Hoje, as disciplinas sociais estão relativamente bem institucionalizadas, as orientações de trabalho, teórico ou metodológico, bem diversificadas e a produção suficientemente ampla para ser reduzida a um sumário que possa ser útil”.[47]
A análise do pensamento sociológico brasileiro, do ângulo da “agenda de problemas sociais e politicamente importantes”, não é, contudo, a única que se pode fazer, no contexto da “matriz ideológica” proposta por W. G. dos Santos. Tal matriz pode servir, também, para detectar a forma “(...) em que a realidade social aparece estruturada na percepção dos analistas sociais do passado”.[48] Como caracterizar, deste ângulo, a matriz que deu ensejo à produção sociológica do período republicano?
O autor considera que essa matriz foi a dicotômica, que consiste em atribuir a origem das crises a uma oposição arquetípica de fatores. “Foi, talvez, Euclides da Cunha, no ensaio Da Independência à República, publicado pela primeira vez em 1900, quem chamou a atenção para a existência de dois Brasis: um, urbanizado, litorâneo, desenvolvendo-se com os benefícios da atenção governamental; outro, constituído pelas populações rurais, estagnado, sobrevivendo por si mesmo, fora do âmbito da ação ou interesse governamentais (...). Embora este esquema seja apenas incidental no contexto geral do ensaio, é altamente importante, na medida em que estabelece a fórmula intelectual para a análise política que estava por vir, a saber, descobrir uma dicotomia à qual possa ser racionalmente atribuída a origem das crises; traçar a formação da dicotomia no passado histórico nacional; propor a alternativa política para a redução da dicotomia. Tal é a estrutura básica do paradigma”.[49]
Wanderley-Guilherme dos Santos considera que “este estilo dicotômico de percepção permanece indiscutível desde então”,[50] tendo-se tornado o “milieu” preferido pelos nossos cientistas sociais. A entrada das categorias marxistas na análise sociológica encaixou-se nesse esquema, que já tinha servido de marco epistemológico às abordagens de inspiração positivista. Mas, antes do advento da dicotomia marxista, autores como Alberto Torres, Oliveira Viana, Gilberto Amado, Virgínio Santa Rosa, Martins de Almeida, Azevedo Amaral e Nestor Duarte tinham sofrido a influência do paradigma dicotómico.  W. G. dos Santos considera que a sociologia brasileira do período contemporâneo continua a se pautar pela “matriz ideológica” dicotómica. Um autor hodierno como Fernando Pedreira (1926), por exemplo, afirma, alicerçado nesse paradigma: “(...) como novo Santa Rosa ou Martins de Almeida, (considero) que as recorrentes intervenções no Brasil devem-se ao descompasso que existe entre as instituições políticas e as peculiaridades nacionais (...)”.[51]
Pode-se fazer, no contexto da “matriz ideológica”, outro tipo de análise acerca do pensamento sociológico brasileiro: o que estabeleça a relação entre valores, instituições políticas e efeitos sociais. Não se trataria, evidentemente, de postular aqui a validade de uma reificação ética, que defendesse “(...) a realização imediata de qualquer conjunto de preferências políticas independentemente da mediação institucional (...)”.[52] A “matriz ideológica” proposta alicerça-se, pelo contrário, na convicção de que, como frisa W. G. dos Santos, “(...) os valores políticos só se realizam quando incorporados em instituições cuja operação efetiva é função da ordem instaurada. Toda sociedade política se constitui, segundo uma ordem específica e é esta ordem que mediatiza, não apenas as interações entre os indivíduos que (a) compõem, mas, igualmente, as instituições que a habitam (...)”.[53]
Ao longo do período republicano podem ser identificadas análises sociológicas alicerçadas nessa “matriz ideológica integradora”, como a efetivada por Sílvio Romero, que na sua História da literatura brasileira, inspirado no “naturalismo histórico”, introduziu uma “percepção historicizante dos fenômenos sociais, (...) mantendo-se fiel à matriz que busca, na formação histórica dos fenômenos, as pistas mais significativas para seu adequado entendimento”.[54] Inserem-se, igualmente, na “matriz ideológica” apontada, as críticas dos autoritários de 30 (Azevedo Amaral e Oliveira Viana, por exemplo) às divergências entre as instituições e a sociedade, bem como a sua procura “(...) de uma ordem burguesa em uma sociedade não mais escravocrata, mas oligárquico-latifundiária. Trata-se agora – frisa W. G. dos Santos – de continuar expandindo a capacidade regulatória e simbólica do poder público e de garantir sua capacidade extrativa com o objetivo de financiar a expansão do Brasil burguês moderno (...)”.[55]
A tipologia sociológica proposta por W. G. dos Santos para, a partir de “matrizes ideológicas” variadas, analisar uma realidade que é complexa e pluridimensional, constitui, sem dúvida, valiosa contribuição à pesquisa sociológica. O autor termina o seu ensaio Paradigma e história; a ordem burguesa na imaginação social brasileira, salientando o caráter eminentemente aberto da sua metodologia de análise, condizente, aliás, com a perspectiva transcendental adotada. “(...) Importante é reter – frisa nosso autor – que não existe uma única história das ideias políticas e sociais no Brasil, nem das disciplinas sociais, quando já institucionalizadas, que permita descartar as demais como falsas. Isso, entretanto, não quer dizer que não seja possível, ou útil, traçar essas diversas histórias. Tudo depende da utilidade do objeto que temos em vista. Se nos interessa num refinamento metodológico das reflexões sobre processos sociais, então é útil; se se está buscando identificar o sentido histórico das pregações sociais, a despeito da retórica manifesta que exibem, então também é útil. Se, entretanto, apenas se procuram justificativas científicas únicas para as opções que se fazem hoje, sejam opções metodológicas, teóricas ou políticas, então é inútil. Quase sempre é possível provar o oposto”.[56]
III – Miguel Reale e o paradigma culturalista aplicado à sociologia brasileira.
O pensador paulista lançou os alicerces do conceito de experiência cultural na sua obra Experiência e Cultura.[57] No que tange à aplicação desse conceito ao terreno das ciências sociais, o seu artigo intitulado: Culturalismo e natureza tropical[58] veio dar uma contribuição inestimável à sociologia brasileira. Para Reale, o conceito de cultura pode ser entendido de duas formas: uma, mais pessoal e subjetiva, como “aperfeiçoamento da sensibilidade e do intelecto pelo conhecimento dos homens e das coisas” e outra, mais social e objetiva, como “acervo de bens materiais e espirituais acumulados pela espécie humana através do tempo, mediante um processo intencional ou não de realização de valores”.[59] Na primeira acepção, o conceito de cultura estaria a indicar um processo “de enriquecimento subjetivo de valores”, enquanto na segunda significaria “um processo objetivo e transpessoal de valores, consubstanciados em formas de vida”. Das anteriores considerações Reale deduz o seu conceito de cultura nestes termos: “(...) sistema de intencionalidades humanas historicamente tornadas objetivas através da história, ou a objetivação das intencionalidades”.[60]
Os aspectos subjetivo e objetivo da cultura acham-se intimamente ligados e constituem duas faces complementares do mesmo conceito. Enquanto o filósofo se interessa pelos pressupostos ou condições de realizabilidade do fenômeno cultural (que constituem “condições transcendentais”), os sociólogos e antropólogos, sem se esquecerem daqueles pressupostos, “(...) cuidam mais dos valores enquanto tornados objetivos pelo espírito humano na história, como realidade social e existencial concreta, em ciclos distintos que, em geral, se denominam civilizações”.[61]
A cultura humana não constitui um ens a se do tipo “progressiva objetivação de uma Ideia” ou “processo do Espírito Objetivo” hegeliano; Reale aproxima-se mais da concepção de Nicolai Hartmann (1882-1950), quando afirma que a cultura existe porque existe o homem. Ela não pode deixar de se apoiar no Espírito Subjetivo. No entanto, em virtude de uma “lei histórica de inércia”, os bens culturais chegam a adquirir uma objetividade relativa, consistente em que eles tendem a permanecer na sua formulação ou na sua estruturação original, porquanto integrados em usos e costumes, chegando a constituir um patrimônio a ser preservado.  Todo bem cultural é, assim, um factum (entendido como particípio passado de facere ou de fieri, como feito ou acontecido) que condiciona o fazer subsequente da sociedade. Há, portanto, uma espécie de dialeticidade entre presente e futuro, ou entre o que os homens quiseram e o que tencionam. Na medida em que o homem vai realizando bens culturais, frisa Reale, “(...) a – de um lado, ele se vê envolvido por uma trama de fatos, ou seja, de valores incorporados em bens objetivos, sofrendo, assim, certa limitação em seu arbítrio; b – e, de outro lado, vê potenciada a sua capacidade de optar e de agir, visto ter à sua disposição uma plataforma de bens disponíveis que lhe permite proteger-se no futuro”.[62]
O pensador paulista aplica à dinâmica cultural o pensamento de Cícero (106-43 a.C.), válido no Direito, de que “legum servi sumus ut liberi esse possimus[63]: para que possamos inovar devemos reconhecer que estamos condicionados por um conjunto de bens historicamente estruturados. Mas, frisa Reale, existe outro tipo de condicionamento, além do histórico. É o natural, identificado com “tudo aquilo que a espécie humana recebeu e recebe ab extra, como conjunto de condições de ordem física (lato sensu) de suas formas de vida”.[64] O Espírito Subjetivo, no sentir do pensador paulista, “(...) é também algo de dado ou de natural, de nascido com cada um de nós, com o nosso indeformável código genético, que nos deve levar a ter sempre presente tanto os fatores biológicos quanto os fatores físicos que estão na base de todo e qualquer processo cultural”.[65] Reale concorda com Gilberto Freire quando afirma que “(...) o biológico e o ambiental condicionam o processo da cultura”, sendo que esse condicionamento não priva o homem do poder nomotético do espírito, ou seja, “(...) de sua capacidade imaginativa e sintetizadora que lhe permite inovar, instaurando algo de novo no processo histórico, visando a fins éticos, econômicos, estéticos, etc.” [66]
Aplicando os pressupostos culturalistas apontados ao terreno sociológico, para ver a forma em que o homem brasileiro tem sentido e compreendido “(...) o relacionamento das suas realizações culturais com a realidade tropical circundante”,[67] Reale considera que “(...) está ainda por fazer-se a história da nossa identidade nacional, levando-se em conta o complexo de seus fatores subjetivos e objetivos, no espaço e no tempo”.[68] A imagem paradisíaca de um Brasil com florestas imensas, rios caudalosos, luz e calor abundantes, chuvas torrenciais e planícies férteis, não se circunscreve apenas aos relatos de viajantes (como Spix e Martius) ou ao assombro dos primeiros povoadores portugueses (como Pero Vaz de Caminha): vem até o início do nosso século, como revela a História da civilização na Inglaterra de Henry Thomas Buckle (1821-1892).[69] Paradoxalmente, essa exaltação geográfica vinha acompanhada de um pessimismo cultural, que se exprimia na frase: “Tudo no Brasil é grande, exceto o homem”.
O primeiro pensador brasileiro a criticar esse falso binômio: grandeza geográfica / atraso cultural, foi Pedro Lessa (1859-1921):[70] a nossa geografia não é tão maravilhosa assim e o nosso homem não é tão atrasado quanto se pensa. As regiões tropicais e equatoriais trazem, é certo, uma aparência de exuberância: mas submetem os seus habitantes às doenças endêmicas, às incertezas climáticas, aos acidentes geográficos difíceis de transpor, etc. Levando em consideração o posicionamento de Pedro Lessa, Reale conclui: “Não se pense, pois, que o senso realista da sociedade brasileira tenha nascido ontem, graças a recentes análises sociológicas e políticas, pois estas, a rigor, dão prosseguimento a uma atitude que vem se desenvolvendo há várias décadas, desde a recepção das idéias inspiradas pelo naturalismo filosófico, que não pode, pois, ser sumariamente repudiado sem se levar em conta a sua contribuição crítica, tal como resulta, para só dar outro exemplo, da obra de Euclides da Cunha (1866-1909)”. [71]
Reale distingue três momentos na meditação social brasileira, que busca a identidade de nós mesmos: “a – o de uma intuição filosófica inicial; b – o de uma explicação científica, sobretudo sociológica, antropológica e histórica; c - e, como desdobramento natural do segundo, o de uma nova compreensão filosófica, de caráter integrante”. [72] Analisemos rapidamente esses três momentos.
O primeiro, marcado pela presença de uma intuição filosófica inicial, possui duas etapas: a primeira estende-se do período colonial até 1870. A alma desta fase foi, no século XIX, “(...) o espiritualismo vago que acalentara as primeiras gerações do Império, tendo, como seu correlato no plano literário, o movimento romântico”.[73]
A segunda fase aparece em 1870 e se estende até a década de vinte. O seu representante foi Tobias Barreto (1839-1889). Origina-se esta fase a partir dos anos decisivos da Guerra do Paraguai (1864-1870), “(...) talvez, frisa Reale, sob o impacto deste evento histórico (o qual veio revelar múltiplos aspectos de nossa fragilidade como povo, abstração feita de reconhecidos méritos militares e heroicos) foi, desde então, que passamos a olhar a sociedade brasileira com olhos diversos (...)”.[74] O cerne doutrinário desta fase consistiu em ajustar as contribuições da cultura do Ocidente às nossas circunstâncias, num trabalho que o autor chama de “aclimatação aos trópicos” ou “ao mundo brasileiro”. Não foi por acaso que a dialética natureza / cultura postulada por Tobias Barreto, surgiu no contexto da realidade nordestina, onde “a natureza não é mãe, mas madrasta”,[75] nas palavras de José Américo de Almeida (1887-1980). Embora esta fase tivesse como característica a intuição da problemática da cultura do ângulo filosófico e nessa intuição se exagerasse a contraposição natureza / cultura, não deixou de cultivar uma atitude positiva ou pragmática, “(...) na medida em que marcava também uma tomada de posição ativa visando a superar as distorções da natureza”.[76]
O segundo momento, caracterizado por uma explicação científica, sobretudo sociológica, antropológica e histórica, vai da década de vinte até os nossos dias e os seus representantes mais significativos foram Euclides da Cunha, Gilberto Freyre, Oliveira Vianna e Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982). Em relação ao primeiro, frisa Reale: “(...) O imortal ensinamento euclidiano foi ter posto frente a frente a terra e o homem, sem descair para o pessimismo de um conflito irremediável, nem para o otimismo da adoração fácil. É do grande fluminense (...) que parte a advertência mais gritante de nosso destino: Ou nos civilizamos, ou desaparecemos”.[77]
Este segundo momento científico constitui, no sentir de Reale, “uma nova forma de tomarmos consciência de nós mesmos (...). A realidade brasileira, em suma, surgia como um problema (...). Bem poucas vezes um conceito empírico terá tido tanta carga axiológica, a ponto de converter-se em valor”.[78] Numa posição de nítido sabor culturalista, embora sem se filiar à Escola do Recife, Gilberto Freire mostrou, com auxílio de rico instrumental científico, “(...) como é que a sociedade real havia sabido converter a civilização européia em civilização tropical (...)”.[79] Reale identifica nas obras do sociólogo pernambucano “uma espécie de sinfonia nacional” que goza de rara unidade. O autor de Casa grande e senzala e Sobrados e mocambos nos apresenta a “(...) experiência histórica de nossa sociedade real”.[80]
No relacionado a Oliveira Viana, Reale considera que lhe cabe o inegável mérito de ter “(...) focalizado o contraste entre Brasil real e Brasil legal, visando não retratar instituições sociais, mas sim as nossas estruturas jurídicas, postas em confronto com a realidade brasileira (...)”.[81] Nesse estudo contrastante, Oliveira Vianna deu muita importância à nossa cultura jurídico-política. O Direito e a Política foram, para o grande fluminense, “fontes primordiais na caracterização da identidade nacional”.[82] Oliveira Vianna, pensa Reale, não teve continuadores “no sentido de ver o Direito como peça de ajuste da nossa civilização (...)”.[83]
Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), no sentir de Reale, abordou três questões fundamentais: a do caráter pragmático e imediatista da colonização portuguesa, a atinente ao desbravamento do território, “menos como obra imperial” (segundo a feição hispânica) e “mais como obra individualista de bandeirantes paulistas e povoadores nordestinos” e a do “mito do paraíso”.  Ampliando este último aspecto, Reale frisa que Sérgio Buarque distingue o mito do paraíso (inspirador da ação dos conquistadores ibéricos) e o mito da selva e do deserto (que empolgou os colonizadores da América Inglesa). “Assim – escreve Sérgio Buarque de Holanda – se os primeiros colonos da América Inglesa vinham movidos pelo afã de construir, vencendo o rigor do deserto e da selva, uma comunidade abençoada, isenta das perseguições religiosas e civis por eles padecidas em sua terra de origem, e onde enfim se realizaria o puro ideal evangélico, os da América Latina se deixavam atrair pela esperança de achar nas suas conquistas um paraíso feito de riqueza mundanal e beatitude celeste, que a eles se oferecia sem reclamar labor maior, mas, sim, como um dom gratuito”.[84]
Reale considera da maior importância o contraste apontado entre os dois mitos. O pensador paulista duvida de que tenha havido, nos estudos sobre a integração cultural brasileira, uma opção em prol da reação ao meio circundante ou em prol da submissão às suas leis. Parece-lhe, no entanto, que em outros autores como Tobias Barreto e Gilberto Freyre é clara a opção pela segunda alternativa. Em relação ao primeiro, frisa: “(...) Uma coisa é, com efeito, largar o corpo e ajustar-se, como se pode, aos rigores do clima; outra, ter a capacidade de inovar culturalmente para atenuar-lhe ou reduzir-lhe os malefícios. Uma coisa é, em suma, conformar-se com as compulsões da natureza; outra, como intuiu Tobias, saber ajeitá-las em benefício da sociedade”.[85] Em relação a Gilberto Freyre, Reale escreve: “(...) apontou muitos aspectos positivos de nossa adaptação civilizadora, ao longo de suas obras, mas esta é, penso eu, uma questão que permanece sempre em aberto, sem o que, não haveria sequer motivo para se cuidar de Tropicologia”.[86]
A contribuição dada pelas ciências sociais no Brasil situa-se num contexto de abertura à cultura ocidental e de preocupação com a compreensão da própria realidade. À luz da análise feita, conclui Reale, verifica-se que “(...) a Antropologia, a Sociologia e a História entrelaçam-se para situar sobre bases científico-positivas o problema do homem perante a natureza, atuando tanto fatores espirituais como físicos. Ora, a nenhum cultor das apontadas ciências ocorreu a ideia estapafúrdia de que, para se conhecer o Brasil, fosse indispensável desconhecer ou repudiar, não digo só as ciências, mas a cultura toda do Ocidente: a grandeza da investigação científica repousa antes na capacidade que tem o pesquisador de receber ensinamentos alienígenas, enriquecendo-os com contribuições próprias, pondo todo esse cabedal de saber, alheio e próprio, a serviço da interpretação de sua terra”.[87]
O terceiro momento da meditação brasileira (que constitui um desdobramento natural do segundo e consiste numa nova compreensão filosófica, de caráter integrante), concretiza-se na filosofia culturalista. Nas interpretações antropológicas, sociológicas e históricas da sociedade brasileira analisadas por Reale, subjaz “uma compreensão culturalista de cunho filosófico”, que se manifestou primeiro no domínio da Filosofia Jurídica e que se constitui, depois, “(...) numa das mais expressivas e originais correntes de pensamento do Brasil contemporâneo”.[88]
O mérito fundamental do culturalismo consiste em permitir superar os antagonismos que opõem o mundo do ser ao mundo do não-ser, ou a Natureza ao Espírito, visando a uma solução concreta: sustentar o valor do homem enquanto tal. Essa solução significa “(...) ter ciência das coisas e consciência do homem”.[89] A solução culturalista, é claro, abarca várias manifestações que vão desde uma concepção mais próxima de Hegel (1770-1831), passando por um neokantismo enriquecido pelo existencialismo heideggeriano e chegam até um desenvolvimento autônomo inspirado na fenomenologia de Edmund Husserl (1859-1938), de forma a superar a contraposição entre idealismo e realismo. De qualquer maneira, o que há de comum a essas várias opções é a convicção de que o homem é capaz de interferir no processo da natureza para instaurar um processo humanístico. Esse fato confere ao culturalismo um caráter de inegável originalidade. Por isso, o pensador paulista não vacila em afirmar que “(...) é com o culturalismo que a inteligência brasileira oferece algo de novo e original à problemática filosófica, e, o que é mais importante, sem jactanciosa ou tola ruptura com as linhas fundamentais do pensamento ocidental”.[90]
Não se excluem da resposta culturalista, evidentemente, as influências do meio tropical que contribuíram para a feição adaptativa das soluções propostas. Este aspecto, aliás, já tinha sido salientado por Tobias Barreto na asserção de que é necessário ajeitar a natureza para lhe conferir um caráter menos agressivo ao homem. A respeito, frisa Reale: “(...) Desde a arte de morar à arte de alimenta-nos ou de divertir-nos, o nosso sucesso tem dependido do nosso sentido superior de adaptação”.[91]
Entre as várias vertentes filosóficas presentes no cenário nacional, Reale considera que é o culturalismo a filosofia que melhor traduz a alma brasileira. Esta vertente de pensamento “(...) sem se arvorar numa das tantas filosofias da salvação que têm caracterizado a nossa imaturidade filosófica, é uma corrente de pensamento que, além de seus valores universais – enquanto mantém um constante diálogo com o que se pensa alhures, em termos de Epistemologia, Ética ou Metafísica -, tem a sua atenção também voltada para a circunstancialidade brasileira, meditando sobre o nosso destino histórico, a nossa identidade nacional e os planos de ação de nosso necessário desenvolvimento, desde o nível material ao espiritual. Donde a prioridade atribuída a certos assuntos, a tônica dada a estas e não àquelas ideias universais ou gerais, em função do grande cenário envolvente de nossas peculiares circunstâncias: é como tal que o culturalismo, por seu sentido particular de vivência das ideias, se apresenta como a filosofia brasileira mais capaz de revelar-nos tais como somos nos planos da teoria e da práxis”.[92]
IV – Oliveira Vianna e a culturologia do Estado.
O sociólogo fluminense é responsável pelo arejamento que a análise da nossa formação política teve, a partir da década de vinte do século passado, ao conferir grande importância à análise dos valores que empolgaram a intelligentsia brasileira, especialmente nos séculos XIX e XX. A respeito, Antônio Paim frisa: “A inovação fundamental introduzida por Oliveira Vianna na investigação da realidade brasileira, iniciada pelos predecessores, consiste em ter procurado identificar os valores a partir dos quais os principais grupos da elite nacional norteiam seu modo de agir. Assim, estudou a valorização dos grandes proprietários, da cúpula burocrática estatal e das elites urbanas”.[93] Este fato levou-nos a realizar uma aproximação entre as sociologias de Max Weber e Oliveira Vianna.[94]
Os valores são denominados pelo sociólogo fluminense de complexo cultural, conceito que explica da seguinte forma: “(...) o complexo representa um conjunto objetivo de fatores, signos ou objetos, que, encadeados num sistema, se correlacionam a ideias, sentimentos, crenças e atos correspondentes (...). É toda uma multidão de fatos, objetos, signos, utensílios, etc., que se prendem a usos, costumes, tradições crenças, artes, técnicas, que, por sua vez, se prendem igualmente a ideias, sentimentos, condutas, tudo correlacionado com estes tópicos peculiares da atividade econômica: e cada um destes tópicos forma um complexo”.[95]
Em todo complexo cultural encontramos dois tipos de elementos: externos ou objetivos (fatos, coisas, signos, tradições) e internos ou subjetivos (sentimentos, ideias emoções, julgamentos de valor, etc.). Os primeiros constituem os chamados elementos transcendentes da cultura, ao passo que os segundos são os seus elementos imanentes. A inter-relação desses dois grupos de elementos é complexa. Oliveira Vianna a explica assim: “Estes elementos, conjugados ou associados, formam um sistema articulado, onde vemos objetos ou fatos de ordem material, associados a reflexos condicionados, com os correspondentes sentimentos e ideias. Estes elementos penetram o homem, instalam-se mesmo dentro da sua fisiologia: e fazem-se enervação, sensibilidade, emoção, memória, volição, motricidade. Os quadros mentais do indivíduo se constituem de acordo com estes complexos, que lhes dão das coisas e do mundo uma representação coletiva, como diria Durkheim. Tanto que já se lançam os fundamentos de uma nova especialização científica: a sociologia do conhecimento, de que a obra de Mannheim é, decerto, um belo exemplo”. [96]
Do ponto de vista psicológico, portanto, um complexo cultural é um sistema ideio-afetivo, do qual derivam atitudes ou comportamentos com projeção social, numa sincronia de sensibilidades, emoções, sentimentos, preconceitos, preferências, repulsões, julgamentos de valor, deliberações, atos omissivos ou comissivos de conduta. Oliveira Vianna chama a atenção para um fato importante: quando se pretende mudar um determinado complexo cultural, num nível exclusivamente objetivo ou transcendente (promulgando, por exemplo, uma nova Constituição em nome de Deus ou do povo), as possibilidades de sucesso de tal mudança são mínimas, pois a ela opor-se-á o elemento subjetivo ou imanente (sentimentos, crenças, preconceitos, praxes seculares dessa comunidade humana). Por isso, salienta o sociólogo fluminense, têm fracassado tantas reformas no nosso meio latino-americano: porque os reformadores, imbuídos de espírito legalista, acham que mudando as leis vão mudar os hábitos da população, que permanecem sempre alheios ao formalismo externo. Oliveira Vianna endossa a afirmação de Jung de que os traços culturais imanentes se transmitem pelo “inconsciente coletivo”, e “tudo é como se eles se imprimissem ou se contivessem nos genes das próprias raças formadoras”.
O sociólogo fluminense dedicou boa parte da sua obra à análise do complexo cultural que lhe pareceu mais marcante no Brasil rural: o chamado por ele de “complexo de clã”. Eis a forma em que caracterizou a presença desse complexo na vida política brasileira: “Em toda essa sociologia de vacuidade ou ausência de motivações coletivas da nossa vida pública, há um traço geral que só por si bastaria para explicar todos os outros aspectos (...). [Este]: a fraqueza da nossa consciência do bem coletivo, do nosso sentimento de solidariedade social e do interesse público. Esta tenuidade ou esta pouca densidade do nosso sentimento do interesse coletivo é que nos dá a razão científica do fato de que o interesse pessoal ou de família tenha, em nosso povo – no comportamento político dos nossos homens públicos -, mais peso, mais força, mais importância determinante do que as considerações do interesse coletivo ou nacional. Este estado de espírito tem uma causa geral (...): e a razão científica é a ausência da compreensão do poder do Estado como órgão do interesse público. Os órgãos do Estado são para estes chefes de clãs, locais ou provinciais, apenas uma força posta à sua disposição para servir aos amigos, ou para oprimir os adversários e os interesses destes”.[97]
A perspicaz observação de Oliveira Vianna, bem como o seu exigente método de análise, foram os instrumentos que lhe permitiram reconstruir, a partir de tipos sociológicos hauridos da nossa história, o intrincado pano de fundo da evolução política brasileira. Profundo conhecedor da nossa formação social, o pensador fluminense partiu da análise do “complexo de clã”, que surgiu como produto cultural do latifúndio. O nosso insolidarismo secular nos fechou, durante séculos, numa visão que não ultrapassava os limites do clã. Porque foi o latifúndio a primeira realidade organizacional realmente consolidada que o nosso país conheceu, ao emergir das sombras do descobrimento e ao se processar o primigênio surto de interiorização ocorrido com as bandeiras vicentistas. O complexo de clã nasceu ali, ao redor da Casa Grande, sob a figura protetora do senhor de engenho, única autoridade patriarcal, inapelável, indelegável, unipessoal, carismática, violenta e paternal ao mesmo tempo. Poderíamos aproximar, com sucesso, essa autoridade clânica da figura do paterfamílias tão bem estudada por Weber. Na sua análise sociológica, Oliveira Vianna partiu, inspirado no método monográfico de Sílvio Romero (1851-1914) e da escola lepleyana, para a elaboração de uma “culturologia do Estado”, na qual explicitou o complexo cultural subjacente aos diferentes momentos da nossa formação política.
A organização política da época colonial consolidar-se-ia a partir da única realidade social conhecida pelo nosso povo-massa: o clã parental. Era ele quem realmente garantia a sobrevivência do indivíduo contra a “anarquia branca” que, numa visão privatista do poder (típica, aliás, da formação política patrimonialista caracterizada pela sociologia weberiana), enquadrava dentro da órbita centrípeta dos interesses parentais as instituições formais: câmaras municipais, juízes de paz, etc.
O Estado moderno, de abrangência nacional, deveria construir-se a partir dessa realidade. As tentativas de passar da atomização clânica a uma democracia formal, levariam fatalmente ao reforço das antigas formas privatistas de exercício do poder: isso aconteceu, segundo Oliveira Vianna, em 1824, quando da instituição do regime parlamentar, e em 1891, quando da adoção puramente formal do federalismo presidencialista de inspiração norte-americana.
Dois momentos-chave identificou Oliveira Vianna na tentativa de consolidar o Estado nacional, superando o “complexo de clã” e fazendo emergir uma mística nacional: o Segundo Reinado e o Estado Getuliano. Dom Pedro II e Getúlio Vargas enfeixaram, nas suas mãos, o maior poder até então conseguido por um governante ao longo da história brasileira. A singularidade de ambos decorria do fato de terem encarnado uma autoridade de cunho patriarcal, mas pondo-a a serviço de um processo modernizador, que tinha como finalidade a definitiva consolidação do Estado nacional, que se sobrepusesse aos clãs.
Oliveira Viana teve como cenário para a sua reflexão sociológica o Brasil rural, que acordava para o primeiro surto de industrialização e de formação das grandes cidades. Mas os elementos teóricos encontrados pela sua original meditação sobre a realidade brasileira norteiam a forma em que deveríamos abordar os problemas atuais. Amante declarado da democracia (é indisfarçável, por exemplo, o entusiasmo com que descreve a secular luta do povo inglês para construir a democracia representativa, enquadrando o absolutismo monárquico em limites fixados pelo costume e pelo direito daí emergente), toda a sua reflexão foi endereçada no sentido de encontrar o verdadeiro caminho para a democracia no Brasil, que seria o coroamento do esforço modernizador empreendido pelo Estado intervencionista e centralizador. E não poupou críticas à retórica liberal, que se limitava a apregoar a volta oitocentista a um individualismo laissez-fairista.
Preocupado com a feição ética da vida política brasileira, o sociólogo fluminense não só analisou os aspectos institucionais ligados ao processo modernizador do Estado, como também se deteve no estudo do conteúdo psicológico das nossas atividades partidárias e da ausência de “motivações coletivas”. Falando em linguagem filosófica, diríamos que Oliveira Vianna se preocupou com a formação de uma moral consensual, que alicerçasse o processo de modernização institucional e a consolidação do sentimento de nação.
V– Hodiernos desdobramentos da culturologia do Estado.
Segundo Max Weber,[98] os Estados modernos são de dois tipos, de acordo com o seu processo de formação: contratualistas ou patrimoniais. Os primeiros correspondem às nações da Europa Ocidental, herdeiras da tradição feudal, fortemente contratualista e alicerçada no controle moral ao poder. Ao emergirem, nesse contexto, os Estados modernos, consolidaram-se de forma contratual entre as classes em pugna, tendo ensejado, ao longo dos últimos quatro séculos, o moderno parlamentarismo. Os segundos, os Estados patrimoniais, correspondem àqueles em que um poder centrípeto, de forte tendência patriarcal, se sobrepôs às outras forças sociais, tratando-as como instâncias domésticas, sobre as quais se estendia implacável a autoridade do rei. Esta foi a feição assumida pelos Estados surgidos na Península Ibérica, bem como na Rússia. Weber e posteriormente Karl Wittfogel (1896-1988),[99] estenderam o modelo do Estado patrimonial além das fronteiras do mundo moderno, arrolando nesse contexto os antigos Estados hidráulicos (o Egito dos Faraós, o Império Chinês, notadamente sob a dinastia Liao, os califados árabes, os impérios pré-colombianos inca e asteca, etc.).
A característica fundamental das formações políticas patrimoniais é, segundo Wittfogel, o fato de constituírem Estados mais fortes do que a sociedade. Neles, o poder político não é entendido como instância pública que busca o bonum commune, como res publica, mas como res privata. Há uma confusão radical entre público e privado. Weber e Wittfogel anotaram outras características típicas dos Estados patrimoniais: neles, surge como instância auxiliar do soberano um estamento pré-burocrático, porquanto não pautado por regras impessoais, mas alicerçado na fidelidade pessoal. De outro lado, a lei não exprime uma ordenação que valha para toda a sociedade, mas apenas constitui casuísmo a ser utilizado pela autoridade central a seu bel prazer. A sociedade, outrossim, comporta-se de forma passiva e insolidária, sendo a única autoridade atuante a do rei que governa como soberano absoluto, cuja intervenção é invocada para solucionar qualquer pendência. A religião, que no seio da Europa feudal constituiu instância de poder espiritual irredutível ao imperium, no contexto patrimonial passa a ser cooptada pelo poder do monarca.
Alicerçada nessa tipologia weberiana, uma geração de estudiosos desenvolveu, no Brasil, ao longo dos últimos quarenta anos, original análise da nossa formação política, ensejando uma versão da culturologia do Estado bem próxima da desenvolvida por Oliveira Viana. O precursor desta abordagem foi Raimundo Faoro (1925-2003), no seu clássico estudo de 1958 intitulado: Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro,[100] no qual analisou detalhadamente a forma em que se consolidou o estamento burocrático da monarquia portuguesa, alicerçado totalmente na fidelidade pessoal ao monarca, na progressiva substituição da nobreza de sangue pela de funcionários públicos, na submissão da burguesia à empresa do rei, bem como na incorporação do direito romano, a partir da ação decisiva de dom João I de Portugal (1357-1433), conhecido como Mestre de Avis.
Herdamos de Portugal a estrutura patrimonial do Estado. Esse fato tem sido estudado, além de Faoro, por Simon Schwartzman,[101] Antônio Paim,[102] Fernando Uricoechea,[103] Wanderley-Guilherme dos Santos,[104] José Osvaldo de Meira Penna[105] e Ricardo Vélez Rodríguez.[106] O ponto central dessa caracterização é este: consolidou-se, no Brasil, um Estado mais forte do que a sociedade, em que o poder centrípeto do Imperador, ao longo do século XIX, ou do Executivo, no período republicano, criaram forte aparelho burocrático alicerçado no sentimento de fidelidade pessoal, com elevada tendência improdutiva e familística, de forma a considerar a res publica como res privata a ser administrada domesticamente, ensejando, assim, as conhecidas práticas do empreguismo, do nepotismo e da corrupção sob as suas várias manifestações.
Em que pese o caráter inexorável assinalado por Raimundo Faoro para essa tendência patrimonial do Estado brasileiro, Simon Schwartzman e Antônio Paim salientam um componente modernizador que deu lugar a nova tradição, identificada por eles como “patrimonialismo modernizador” ou “neopatrimonialismo”. Consiste este, no sentir de Paim, na incorporação da ciência moderna pelo Estado centralizador, fato que se realiza em Portugal a partir das reformas pombalinas, que se projeta no Brasil na geração que fez a Independência (formada, toda ela, na nova Universidade aberta às ciências e às técnicas) e que organiza os primeiros institutos de estudos superiores, entre os quais cabe destacar a Real Academia Militar, criada em 1810 pelo Conde de Linhares, dom Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812). A tendência modernizadora, vinculada ao cientificismo em poder do Estado, ensejou ampla prática modernizadora e estatizante, já a partir do ciclo pombalino. O Ministro de D. José I (1714-1777), Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), marquês de Pombal, pôs em execução o modelo de Estado empresário, gerador da riqueza da Nação e da ordem política e moral, mediante a incorporação da ciência moderna. Longe de ensejar a participação da sociedade, o modelo pombalino fazia desta um menor de idade submetendo-a à tutela do soberano e dos seus intendentes.
Inseriram-se no contexto do Estado tutelar e moralizador as reformas empreendidas por Getúlio Vargas, ao longo das décadas de 30 e 40 do século passado, inspiradas na filosofia política castilhista que, partindo do princípio de que o regime parlamentar é um regime para lamentar, baniu o debate político e a representação, substituindo-os pelo equacionamento técnico dos problemas. [107] Em que pese a adoção do ideal democrático como um dos objetivos nacionais permanentes pela Escola Superior de Guerra na década de 50, as reformas modernizadoras deflagradas após 64 retomaram a tendência estatizante do modelo getuliano. A hipertrofia do Executivo e o crescimento acelerado do setor estatal da economia foram dois elementos fundamentais desse processo. Tornou-se necessário, como frisou o general Golbery do Couto e Silva (1911-1987), na sua memorável palestra da ESG, em 1980,[108] um processo de descentralização administrativa e de participação política, a fim de controlar o excessivo centralismo de inspiração autoritária, que ameaçava a sobrevivência do sistema. Para os teóricos do patrimonialismo modernizador, o autoritarismo não seria a sina a que irremediavelmente estaria condenado o Estado brasileiro. De forma semelhante a como países de tradição patrimonialista – Espanha e Portugal, por exemplo – se modernizaram, incluindo nesse processo o ideal democrático mediante a prática da representação política, o Brasil pode se tornar, no sentir deles, uma Nação plenamente moderna e democrática, em que o Estado cumpra apenas funções que são imprescindíveis e em que a sociedade participe ativamente do processo econômico e político, mediante o estímulo à livre iniciativa e ao jogo político partidário.
Conclusão
Foram analisadas, neste artigo, duas tipologias interpretativas dos estudos sociais no Brasil, bem como duas propostas de análise sociológica voltadas para um aspecto que foi bastante esquecido pela maior parte dos autores, ao longo das últimas décadas: o Estado patrimonial. Um aspecto salta à vista: a sociologia brasileira soube superar a tendência monocausalista que marcou, de início, as análises inspiradas no positivismo. Isso não significa, no entanto, que a estreita perspectiva do cientificismo comteano não teime ainda em sobreviver em certas análises, geralmente de cunho marxista, instaladas infelizmente no seio da Universidade e entre os intelectuais.[109]
A superação das análises positivistas veio acompanhada de outra característica, de índole interdisciplinar, que pauta hoje os mais criativos estudos sobre a realidade brasileira, a partir de Gilberto Freyre e Oliveira Vianna, chegando até os nossos dias com as contribuições de sociólogos da talha de José Arthur Rios (1921-2017), de jusfilósofos como Miguel Reale, de juristas-sociólogos como Paulo Mercadante (1923-2013) e Djacir Menezes (1907-1996), de juristas como Raimundo Faoro (1925-2003), de historiadores das ideias como Antônio Paim (1927) e Vicente Barretto (1939), ou de cientistas políticos como Wanderley-Guilherme dos Santos (1935-2019), Simon Schwartzman (1939), José Osvaldo de Meira Penna (1917-2017), Ubiratan Macedo (1937-2007), etc.
Nesse esforço interdisciplinar em prol do resgate da imagem polimórfica da nossa realidade, ocupa lugar de importância o Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro em Salvador-Bahia, que constitui, hoje, sem favor, o mais importante acervo do país no gênero. Graças ao empenho dos fundadores do Centro, notadamente do professor Antônio Paim, os estudiosos de hoje e das futuras gerações contam com preciosa fonte de informação que incentiva e enriquece, cada vez mais, a compreensão da realidade brasileira.

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[1] Texto inicialmente publicado na Revista do Pensamento Brasileiro, órgão do Centro de Documentação do Pensamento Brasileiro, Salvador, Bahia, Ano 1, número 1, Dezembro 1989, pgs. 26-43. Esta publicação foi feita em comemoração pelos cem anos da Proclamação da República no Brasil. Foram atualizados, neste capítulo, alguns dados bibliográficos e datas que constam do texto original.
[2] O ensaio em apreço constitui o primeiro capítulo da obra intitulada: Ordem burguesa e liberalismo político, São Paulo: Duas Cidades, 1978, pg. 16-57.
[3] Cf. SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história: a ordem burguesa na imaginação social brasileira”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 22-23.
[4] Cf. PAIM, Antônio. A querela do estatismo. 1ª edição. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978, p. 117 seg.
[5] AZEVEDO, Fernando de. A cultura brasileira – Introdução ao estudo da cultura no Brasil. Volume I da Série Geral de Recenseamento Geral do Brasil, Rio de Janeiro: IBGE, 1943. As referências bibliográficas constantes nas notas 5 a 21, algumas delas incompletas, foram tiradas do ensaio já mencionado de Wanderley-Guilherme dos Santos, pgs. 24 e 25.
[6] MENEZES, Djacir. “La Science Politique au Brésil au cours des trente dernières années”, in: UNESCO, La Science Politique, Paris: UNESCO, 1950.
[7] COSTA PINTO, L. A. e CARNEIRO, Edson. As ciências sociais no Brasil. Rio de Janeiro: CAPES, 1955, Série Estudos e Ensaios nº 6.
[8] Guerreiro Ramos, A. Esforços de teorização da realidade nacional politicamente orientados, de 1870 a nossos dias. Conferência no I Congresso Brasileiro de Sociologia. São Paulo, 1955.
[9] Guerreiro Ramos, A. “O inconsciente sociológico: estudo sobre a crise política no Brasil na década de 30”; In: Cadernos do nosso tempo, Rio de Janeiro, nº 4, 1955.
[10] Guerreiro Ramos, A. “A ideologia da Jeunesse Dorée”, in: Cadernos do nosso tempo, Rio de Janeiro, nº 4, 1955.
[11] MENEZES, Djacir. “La sociologia del Brasil”. In:  GURVITCH, Georges e MOORE, E. (editors). Sociología del siglo XX. (Edición argentina con estudios sobre la sociología en los países latinoamericanos, bajo la dirección de Oreste Popescu), Volume II. Buenos Aires: El Ateneo, 1956.
[12] FERNANDES, Florestan. “Ciência e sociedade na evolução do Brasil”, in: Revista Brasiliense, nº 6, 1956.
[13] FERNANDES, Florestan. “O padrão de trabalho científico dos sociólogos brasileiros”. In: Estudos sociais e políticos, Belo Horizonte, Universidade de Minas Gerais, nº 3, 1958.
[14] FERNANDES, Florestan. “Desenvolvimento histórico-social da sociologia no Brasil”, in: Anhembi, São Paulo, nº 75-76, 1957.
[15] GUERREIRO RAMOS, A. “A ideologia da ordem”. In: A crise do poder no Brasil, Rio de Janeiro, 1961.
[16] WERNECK-SODRÉ, Nelson. A ideologia do colonialismo. Rio de Janeiro: ISEB, 1961.
[17] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “A imaginação político-social brasileira”. In: Revista Dados, Rio de Janeiro, nº 2-3, 1967.
[18] CARONE, Edgar. “Coleção Azul, crítica pequeno-burguesa à crise brasileira de 1930”. In: Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, nº 25-26, 1969.
[19] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos, “Raízes da imaginação política brasileira”. In: Revista Dados, Rio de Janeiro, nº 7, 1970.
[20] LAMOUNIER, Bolívar. Ideology and authoritarian regimes: theoretical Perspectives and Study of the Brazilian Case. (Ph. D. Dissertation). University of California at Los Angeles, 1974, cap. 9.
[21] TRINDADE, Hélgio.  Integralismo - (O fascismo brasileiro da década de 30). São Paulo: DIFEL, 1974, 2ª parte.
[22] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos.  “Paradigma e história: a ordem burguesa na imaginação social brasileira”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 25.
[23] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história: a ordem burguesa na imaginação social brasileira”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 25.
[24] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 26-27. A citação em francês é tirada pelo autor de KOYRÉ, Alexandre. Études d´histoire de la pensée scientifique, Paris: PUF, 1966, p. 6. (“Alguém é sempre moderno, em qualquer época, enquanto pensar mais ou menos como os seus contemporâneos e um pouco também, de forma diferente, como os seus mestres”).
[25] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 27.
[26] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 27.
[27] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 28-29.
[28] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 31.
[29] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 31.
[30] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 32.
[31] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 33.
[32] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., ibid.
[33] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., ibid.
[34] Cf. PAIM, Antônio. História das ideias filosóficas no Brasil. 3ª edição revista e aumentada. São Paulo: Convívio; Brasília: Instituto Nacional do Livro / Fundação Nacional Pró-Memória, 1984, pgs. 3 seg.
[35] PAIM, Antônio. História das ideias filosóficas no Brasil. Edição citada, pg. 5.
[36] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político, ob. cit., p. 34.
[37] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 34.
[38] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 34-35.
[39] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 35.
[40] Cf. PAIM, Antônio. O estudo do pensamento filosófico brasileiro. 1ª edição. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1979, p. 98.
[41] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 37.
[42] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 38.
[43] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 39.
[44] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., ibid.

[45] Acerca desta publicação isebiana, cf. SCHWARTZMAN, Simon (seleção e introdução). O pensamento nacionalista e os “Cadernos do nosso tempo”.  Brasília: Câmara dos Deputados / Editora da Universidade de Brasília, 1981, Biblioteca do Pensamento Político Republicano, 6.
[46] Cf. PAIM, Antônio. A querela do estatismo, ob. cit., p. 117.
[47] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 41.
[48] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., ibid.
[49] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 44-45.
[50] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 48-49.
[51] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 49.
[52] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., ibid.
[53] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., ibid.
[54] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 52.
[55] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 53.
[56] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. “Paradigma e história...”. In: Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit., p. 57.
[57] Cf. REALE, Miguel. Experiência e Cultura. São Paulo: Grijalbo / Edusp, 1978.
[58] Cf. REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, Brasília, I (2): pg. 69-79, janeiro / março 1983.
[59] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. p. 69.
[60] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[61] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[62] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, p. 70.
[63] Cit. por REALE, Miguel, in: “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. Ibid.
[64] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[65] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[66] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[67] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[68] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., ibid.
[69] BUCKLE, Henry Thomas. História da civilização na Inglaterra. (Tradução de A. Melchert; introdução de Pedro Lessa, nota bibliográfica de J. C. Gomes Pinheiro). São Paulo: Casa Eclética, 1900. Cit. por REALE, Miguel, in: “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., p. 72.
[70] Cf. A introdução de Pedro Lessa à obra citada de Henry Thomas Buckle. In: REALE, Miguel, “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., p. 72.
[71]  REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., p. 72.
[72]  REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. p. 73.
[73]  REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit., p. 73.
[74]  REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[75]  REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. P. 74.
[76] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. p. 74.
[77] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[78] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[79] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[80] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. p. 75.
[81] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[82] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[83] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. ibid.
[84] HOLANDA, Sérgio Buarque de. A visão do paraíso. 2ª edição, p. XVIII. Cit. por REALE, Miguel, in: “Culturalismo e natureza tropical”, in: Humanidades, art. cit. p. 75.
[85] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., p. 75-76.
[86] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., p. 76.
[87] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., ibid.
[88] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., ibid.
[89] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., ibid.
[90] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., ibid.
91 REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., ibid.

[92] REALE, Miguel. “Culturalismo e natureza tropical”, art. cit., p. 79.
[93] PAIM, Antônio. “Apresentação”. In: VIANA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras. 4ª edição. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo; Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 1987, volume I, contracapa.
[94] Cf. VÉLEZ Rodríguez, Ricardo. Oliveira Vianna e o papel modernizador do Estado brasileiro. (Apresentação de Antônio Paim). Londrina: Editora da Universidade Estadual de Londrina, 1997.
[95] VIANA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras. 3ª edição. Rio de Janeiro: Record, 1974, vol. I, p. 74. A tipologia sociológica de Oliveira Viana acerca da formação política brasileira encontra-se fundamentalmente nas suas obras: Populações meridionais do Brasil e Instituições políticas brasileiras, que foram editadas num único volume (“Apresentação de Antônio Paim”. Brasília: Câmara dos Deputados, 1983, Coleção Pensamento Político Brasileiro). Cf. VÉLEZ Rodríguez, Ricardo. “Vargas e Oliveira Vianna: o estatismo e seus dois intérpretes”, in: Suplemento Cultura – O Estado de São Paulo, 4/12/1983, ano III, número 182, p. 10.
[96] VIANNA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras. 3ª edição. Rio de Janeiro: Record, 1974, vol. I, p. 74.
[97] VIANNA, Francisco José de Oliveira. Instituições políticas brasileiras, ob. cit., volume I, p. 297.
[98] WEBER, Max. Economía y sociedad. (Tradução ao espanhol de J. Medina Echavarría et alii). 1ª edição em espanhol. México: Fondo de Cultura Económica, 1944. A temática relacionada à forma em que surgiram os Estados modernos, ao ensejo das tradições feudal e patrimonialista, encontra-se notadamente nos volumes I e IV.
[99] Cf. WITTFOGEL , Karl. Le despotisme oriental: Étude comparative du pouvoir total. Tradução do inglês de Micheline Pouteau. Paris: Minuit, 1977.
[100] FAORO, Raimundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 1ª edição. Porto Alegre: Globo, 1958, 2 vol.
[101] Cf. SCHWARTZMAN, Simon. Bases do autoritarismo brasileiro. 1ª edição. Rio de Janeiro: Campus, 1982.
[102] Cf. PAIM, Antônio. A querela do estatismo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1978. Do mesmo autor (em colaboração com Francisco Martins de SOUZA, Reinaldo de BARROS e Ricardo VÉLEZ-RODRÍGUEZ), Evolução do pensamento político brasileiro. São Paulo: EDUSP; Belo Horizonte: Itatiaia, 1989.
[103] Cf. URICOECHEA, Fernando. O Minotauro imperial. São Paulo: DIFEL, 1978.
[104] SANTOS, Wanderley-Guilherme dos. Ordem burguesa e liberalismo político. Ob. cit.
[105] Cf. PENNA, José Osvaldo de Meira. O dinossauro: uma pesquisa sobre o Estado, o patrimonialismo selvagem e a nova classe de intelectuais e burocratas. 1ª edição. São Paulo: Queiroz, 1978.
[106] Cf. VELEZ Rodríguez, Ricardo. “Tradición patrimonial y administración señorial en la América Latina”. In: Estado, cultura y sociedad en la América Latina. Bogotá: Universidad Central, 2000.
[107] Cf. VÉLEZ Rodríguez, Ricardo. “Tradição centralista e Aliança Liberal”. In: BRASIL, Congresso, Câmara dos Deputados. Aliança liberal – Documentos da campanha presidencial. 2ª edição. Brasília: Câmara dos Deputados, 1982, p. 9-43.
[108] Cf. SILVA, Golbery do Couto e, general. Conjuntura política nacional: o Poder Executivo e Geopolítica do Brasil. 2ª edição. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981.
[109] Cf. PAIM, Antônio. Marxismo e descendência. 1ª edição, Campinas: Vide Editorial, 2009. Nesta obra, o eminente historiador das idéias faz uma detalhada análise acerca de como o cientificismo pombalino pervive ainda hoje, no seio da cultura estatizante que anima aos docentes de ciências sociais no seio da Universidade brasileira. O processo seguido pela versão ideológica das ciências sociais que terminou vingando no seio da cultura francesa, como programa para instauração de um vaporoso socialismo, encontrou terreno abonado no cientificismo positivista brasileiro, o que conduziu ao deserto de ideias em que se converteu a produção acadêmica de ciências sociais no Brasil hodierno.

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